
No último dia 3 de novembro de 2023, São Paulo foi atingida por fortes chuvas e ventos, deixando 2,1 milhões de pessoas sem luz, conforme relato da concessionária Enel. Apesar de eventos climáticos atípicos, moradores da maior cidade do Brasil reclamaram das frequentes quedas de energia, atribuídas a curtos-circuitos causados pela queda de árvores durante chuvas intensas. Especialistas apontam a instalação subterrânea da fiação como uma solução para esse problema, tema que está em discussão entre as autoridades.
Em 2017, o então prefeito João Doria prometeu enterrar 52 km de fios em 117 vias do centro de São Paulo. Na gestão atual de Ricardo Nunes, a meta subiu para 65 km, mas até o momento nenhum dos objetivos foi alcançado. Estimativas indicam que menos de 1% da rede elétrica brasileira está subterrânea, sendo que São Paulo possui cerca de 60 km aterrados, com a intenção de chegar a mais de 80 km até o próximo ano.
Enquanto cidades europeias enfrentam, em média, 12,2 minutos de falta de luz por ano, São Paulo registra casos de famílias passando mais de quatro dias sem energia. Diante dessa disparidade, foram observados exemplos de cidades ao redor do mundo que investiram na instalação subterrânea de redes elétricas e de telecomunicações. Londres, Paris, Nova York, Pequim e Buenos Aires são algumas delas.
Londres, por exemplo, iniciou um projeto de 1 bilhão de libras em 2020 para tornar subterrânea a rede elétrica que abastece a porção sul da cidade. Em Paris, a instalação subterrânea começou em 1910, e Nova York possui 86% do seu sistema de cabeamento subterrâneo. Washington DC, nos Estados Unidos, investiu US$ 1 bilhão em 2012 para ampliar sua rede elétrica subterrânea.
Buenos Aires, capital argentina, também avançou na substituição de cabos aéreos por subterrâneos, proibindo, desde 2005, a instalação de novas fiações sobre o solo. Esses exemplos destacam os benefícios da rede subterrânea, como a proteção contra eventos climáticos extremos e a melhoria estética das cidades.
No entanto, o Brasil enfrenta desafios consideráveis para seguir o mesmo caminho. O custo é apontado como a principal barreira, somado a obras demoradas que podem paralisar o tráfego e a falta de diálogo para elaborar políticas públicas nessa direção. O presidente da Enel SP, Max Xavier Lins, afirmou que ainda existem 11.000 imóveis na Grande São Paulo sem energia desde o temporal, ressaltando as dificuldades enfrentadas.
Engenheiros elétricos foram consultados para entender os benefícios e obstáculos da rede subterrânea. A proteção contra eventos climáticos extremos, a redução de riscos de queda de raios e os benefícios estéticos são apontados como vantagens. No entanto, o alto custo, a complexidade na manutenção e operação do sistema subterrâneo, e a possível lentidão na identificação de problemas em casos de falhas elétricas são desafios consideráveis.
Os engenheiros também destacam que, mesmo nos casos em que os fios foram aterrados, não impediu o roubo dos cabos e materiais. Apesar dos obstáculos, especialistas concordam que a instalação de redes subterrâneas é um investimento que vale a pena a longo prazo, considerando os prejuízos elevados para consumidores e sociedade em casos de quedas de energia prolongadas.
Quanto à realidade brasileira, a advogada Ana Karina Souza, sócia da área de Infraestrutura e Energia, explica que a responsabilidade pela instalação e melhoria na rede de fios elétricos muitas vezes fica diluída, com falta de comunicação entre setores. Ela destaca a importância de uma determinação de política pública para iniciar as mudanças, envolvendo diálogo entre governo e concessionárias. O financiamento é apontado como um ponto crítico, podendo ser repassado ao consumidor e impactar nas tarifas.
O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, estabeleceu uma meta de enterrar 65 km da rede elétrica, com 43 km já concluídos. Ele propõe que moradores interessados em enterrar os fios possam contribuir voluntariamente. Contudo, há dúvidas sobre como financiar o projeto, considerando que o enterramento custa de 8 a 10 vezes mais do que uma rede aérea. A discussão sobre normas para o compartilhamento de postes entre setores de energia elétrica e telecomunicações pode ser uma oportunidade para avançar nos projetos de aterramento, sugerindo parcerias entre os setores.
Apesar das adversidades, especialistas ressaltam a importância de uma transição gradual, priorizando regiões sensíveis, como áreas próximas a hospitais, escolas e órgãos públicos. Michele Rodrigues, da Fundação Educacional Inaciana, sugere a possibilidade de reaproveitar valas de esgoto ou túneis do metrô para instalar os cabos, considerando a logística das cidades e os custos envolvidos.
Em conclusão, a instalação subterrânea de redes elétricas emerge como um desafio complexo para o Brasil, envolvendo custos, obras demoradas e a necessidade de um diálogo consistente entre autoridades e concessionárias para viabilizar essa transformação necessária.
Necessidade de enterrar cabos elétricos
Após o apagão em São Paulo, especialistas destacam a necessidade de enterrar cabos elétricos na cidade. De acordo com a Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (TelComp), apenas 0,3% da rede elétrica de São Paulo é subterrânea. José Roberto Cardoso, professor da Escola Politécnica da USP, explicou que há uma diferença entre enterrar e aterrar a rede elétrica, sendo o último um processo que envolve transferir a parte metálica externa para a terra, proporcionando proteção em casos de acidentes.
O enterramento de cabos elétricos enfrenta desafios práticos, incluindo grandes obras que demandam o deslocamento de cabos, postes e transformadores. Além disso, obstáculos imprevistos no subsolo, como redes de gás e tubulações desconhecidas, representam um desafio adicional. O professor Cardoso destaca a importância de um planejamento cuidadoso nesse processo.
O custo do enterramento da rede elétrica é aproximadamente 20 vezes maior do que o das redes aéreas. Se o financiamento não for realizado pelo Estado, os custos podem ser repassados aos consumidores, impactando as contas de luz. Ricardo Nunes, prefeito de São Paulo, estabeleceu uma meta de enterrar 65 km da rede elétrica, com 43 km já concluídos. No entanto, especialistas alertam que o aumento nas contas de luz pode inviabilizar o projeto para os menos favorecidos economicamente.
Em relação à escolha de regiões para os projetos, José Roberto Cardoso acredita que a priorização de locais críticos, como áreas hospitalares, é conveniente para minimizar problemas de falta de energia. A advogada Milene Coscione sugere que as discussões sobre o compartilhamento de postes entre setores de energia elétrica e telecomunicações podem impulsionar os projetos de aterramento, possibilitando parcerias entre os setores.
*Com informações da BBC Brasil, Jornal da USP e Estadão.
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