Há poucos dias, numa reunião com prefeitos, ouvi o governador Jaques Wagner conclamar todos a colocarem a política no posto de comando. Parece coisa do senso comum, mas não é. Prefeitos não devem olhar apenas para a gestão quando se trata de enfrentar a crise econômica. Esta é uma visão meramente administrativa, gerencial. É fundamental colocar o dedo na ferida e evidenciar que caiu o Muro de Wall Street, coisa de 20 anos depois da queda do Muro de Berlim.
Quando o socialismo real ruiu, os ideólogos do neoliberalismo cantaram em prosa e verso não só o fim de uma alternativa ao capitalismo como o fim, também, do papel do Estado. Até falaram em fim da história – lembremo-nos de Fukuyama. E nós, da esquerda, quando desaba a ciranda financeira do cassino global do centro do capitalismo, não ousamos o debate políticoideológico, não confrontamos visões de mundo com o pensamento de direita. Passamos ao largo da luta política, ao menos nesse aspecto.
Política aqui significa lembrar quem foram os responsáveis por essa crise monumental, que afeta toda a humanidade. Ela nasce, é preciso dizer, no coração do capitalismo, e como decorrência de um capitalismo desregulado, sob a hegemonia quase absoluta das sagradas leis do mercado. Quando Wall Street vem abaixo, está ruindo todo um modelo.
Ninguém, em sã consciência, há de dizer que neste momento estejamos às portas da derrocada do capitalismo. Mas, sem dúvida, está em causa o chamado neoliberalismo e seus dogmas sagrados, de modo particular o papel que o Estado pode e deve ocupar. No mínimo, há de se recuperar Keynes, para não ir muito adiante. Os ideólogos do capitalismo foram obrigados, não sem uma boa dose de constrangimento, a rever conceitos, mais na prática que na teoria.
Poucos acreditariam que o Estado capitalista – nos EUA ou na Europa – seria capaz de agir como agiu, abjurar dogmas sagrados. O mercado não era mais a mão invisível que a tudo podia responder. Claro, poderão dizer alguns, houve, nessa intervenção, a tradicional socialização dos prejuízos – aquilo que alguns denominaram socialismo dos tolos. Mas não há dúvida de que, nessa brecha, nessa virada teórica e prática, a esquerda deve e pode defender suas alternativas, lutando para que a crise não afete principalmente os pobres do mundo.
A esquerda deve, portanto, fazer luta política. Evidenciar o fracasso do neoliberalismo, lutar para que o Estado se coloque na perspectiva da classe trabalhadora, dos pobres, excluídos. Aí sim, cabe dizer, o Estado não pode ser apenas o agente socializador dos prejuízos dos grandes grupos econômicos, mas ser aquele que procura, no meio da crise, desenvolver políticas que garantam e distribuam renda, que incentivem o desenvolvimento econômico sustentável e socialmente justo. É preciso impor uma derrota definitiva ao pensamento e prática neoliberais.
*Por Emiliano José é professor aposentado da Faculdade de Comunicação (FACOM) da Universidade Federal da Bahia (UFBA. Em 1999, defendeu a tese “A Constituição de 1988, as reformas e o jornalismo de campanha”, tornando-se doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas. Começou a carreira jornalística na Tribuna da Bahia, passou pelo Jornal da Bahia, O Estado de S. Paulo, O Globo, e pelas revistas Afinal e Visão. Foi um ativo integrante da imprensa alternativa nos tempos da ditadura.
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