Mercado de alimentos para muçulmanos expande-se com forte participação brasileira

Uma empresa da Vestfália leva salsichas halal aos supermercados alemães. Abate e o talho da carne segundo preceitos islâmicos exigem linha de produção específica. Brasil é importante exportador.

A economia parece capaz de tirar proveito de tudo, até mesmo de um tabu alimentar. Segundo estimativa da Halal World Expo, o atual mercado global para alimentos preparados segundo os preceitos de pureza da lei islâmica excede os 2 trilhões de dólares.

A palavra árabe halal significa “permitido”, seu contrário é haram. E o que está no meio, não chegando a ser proibido, mas apenas desaconselhável, é denominado makruh.

Ainda de acordo com os organizadores da maior feira de produtos halal do Oriente Médio, cerca de um terço da população do planeta consome alimentos desse tipo. Trata-se, portanto, de um mercado promissor, do qual numerosos empresários ocidentais já tomaram conhecimento, independentemente de qualquer consideração religiosa.

De “Schürtürk” a “Sultana”

Este é caso do alemão Claus Schürmann, diretor-geral da fábrica de embutidos Eggelbusch, próxima a Gütersloh, na Vestfália. Como revelou ao jornal Die Zeit, o negócio de sua família com a salsicha halal começou há 14 anos, quando Claus ainda era o filho do chefe.

Um atacadista turco mostrara-se interessado em adquirir uma grande partida de embutidos de peru, com a condição de que o rótulo fosse em idioma turco e trouxesse o selo halal. Dois anos mais tarde a Eggelbusch lançou sua própria marca halal.

Sem muito sucesso, pois ninguém lhes dissera – nem eles haviam perguntado – que, para um turco, “Schürtürk” parece tudo, menos turco. (Algo assim como uma cachaça engarrafada na Alemanha, para consumidores brasileiros, e que se chamasse “Kanafest”…) Por isso, o nome da marca foi alterado para “Sultana”.

Salsichas islâmicas em mercados alemães

A líder do mercado de especialidades turcas na Alemanha é a Baktat. Sediada na Turquia, ela fornece também para as nações escandinavas, a França e o Reino Unido, assim como para os Estados Unidos e a Ásia.

O perfil de seus consumidores é o mesmo em todos esses países: imigrantes de segunda e terceira geração à procura de produtos que se coadunem tanto com sua identidade cultural quanto com o estilo de vida ocidental.

Apesar da concorrência, os produtos halal chegam a perfazer 23% do faturamento total da Eggelbusch: a cada semana 120 toneladas de salsichas Sultana deixam seus galpões em direção aos negócios turcos do país.

Mas a empresa familiar quer ampliar seu raio de ação, reagindo à tendência crescente da demanda. Desde início de julho de 2009, ela passou a fornecer embutidos halal também para os supermercados alemães da rede Edeka, do segmento médio. E provavelmente terá em breve a onipresente cadeia popular Aldi entre seus clientes.

Como está no Alcorão

O halal está para o islamismo assim como o cashrut para o judaísmo. No versículo 3º da 5ª surata, o Alcorão prescreve: Estão-vos vedados: a carniça, o sangue, a carne de suíno e tudo o que tenha sido sacrificado com a invocação de outro nome que não seja o de Alá.

Embutidos certificados como halal não podem conter, portanto, carne de porco ou sangue, além, é claro, de álcool (usado, por exemplo, na limpeza das máquinas ou ferramentas). E o abate dos animais – quer frango, peru, vaca ou cordeiro – tem que obedecer a certas prescrições, que variam de acordo com o grau de rigor religioso.

Na versão mais ortodoxa, no momento do abate, o animal tem que estar 100% consciente e não ter sede. O “sangrador” – um muçulmano mentalmente sadio que tenha atingido a puberdade – corta sua veia jugular com uma lâmina bem afiada, num único movimento de meia-lua, provocando morte rápida por sangramento.

Conflito com proteção de animais alemã

O objetivo desse método é reduzir ao mínimo a dor e/ou aflição do animal. Porém ele entra em choque com as leis alemãs concernentes à proteção dos animais, que proíbem o abate sem narcose.

Há sete anos o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha se ocupou do tema, e em consequência o abate halal é permitido no país em casos de exceção e obedecendo a prescrições severas.

Por outro lado, para os muçulmanos mais liberais, a carne não deixa de ser halal se os animais forem antes insensibilizados com óxido nitroso (gás hilariante) ou um disparo de pistola pneumática. E, quanto à invocação do nome de Alá, bastaria a esteira de abate estar voltada para Meca e um imã entoar uma oração no momento de pressionar o botão de partida.

Brasil como exportador halal importante

Ainda assim, o procedimento permanece bastante específico. Sobretudo, são necessários equipamentos e instalações separadas para todo o processo de produção. Pois, do ponto de vista islâmico, seria fatal um único pedaço de toucinho de porco, destinado à linha tradicional de embutidos da Eggelbusch, ir parar por acidente num de seus produtos Sultana.

Por isso, toda a carne halal elaborada pela fábrica alemã é abatida no Sul do Brasil, pela Sadia. A empresa fundada em Santa Catarina abastece há mais de 30 anos o mercado islâmico em quase todo o mundo. Suas linhas de abate e produção halal são constantemente inspecionadas pelo Conselho Islâmico Latino-Americano.

Além disso, a produtora de alimentos recebe com frequência missões religiosas de países como Arábia Saudita, Irã e Kuweit. Altas autoridades islâmicas aprovam seus processos e recomendam seus produtos para os fiéis. Segundo dados da Sadia, o segmento dos alimentos halal experimenta uma expansão de 10% ao ano.

Ali Saifi, diretor do Grupo de Abate Halal, confirma que “os países islâmicos gostam do produto brasileiro”. Ele estima que, dos 12 milhões de aves abatidas por dia no país, 4 milhões se destinam aos muçulmanos espalhados em 112 países, e 2 milhões são exportados diretamente para a região árabe.

*Com informação de Deutsche Welle.


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