Numa das minhas rotineiras viagens para o trabalho, em um amistoso bate-papo com o motorista do transporte alternativo, este me foi categórico: “Se você está me pagando, o meu direito é lhe conduzir até a sua residência”. Com certeza, assim como em diversos outros casos analogamente corriqueiros, o bem intencionado proprietário do carro de praça, no contexto da expressão acima, usou a palavra “direito” no lugar do vocábulo “dever”.
Preconceitos lingüísticos à parte, muitos são os aspectos e fatores que orbitam a dualidade dos direitos e deveres, e que padecem de reflexão, eis que, conquanto se pareçam evidentes, displicentemente nos fogem à percepção.
Imaginemos só como seria a nossa realidade, a nível de cidadania, se, assim como a Bíblia Sagrada, toda família brasileira (para não dizer todo indivíduo) trouxesse consigo a Constituição Federal. Sim, porque é a Carta Magna a lei suprema que rege o nosso ordenamento jurídico, na qual estão esculpidas as garantias que dão sustentação a muitos direitos dos cidadãos e que são por eles próprios desconhecidas.
Poucos não são os indivíduos que se dizem politizados e conhecedores dos seus direitos e deveres, mas no entanto, não dispõem em suas casas e ou no ambiente de trabalho, nem mesmo de um exemplar da carta política do seu Estado, do seu Município (Lei Orgânica), e porque não dizer, do Código Civil ou da Declaração dos Direitos Humanos.
Muitos devem ser os cidadãos que ignoram a conduta de determinadas ações que se afiguram como tipicamente culturais, mas que podem vir a ser tipificadas como crime, como por exemplo: A alienação parental (Quando um dos pais tenta destruir a imagem do outro na cabeça da criança) e o Assédio moral no trabalho (Exposição dos trabalhadores e trabalhadoras a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções).
Não raros são os indivíduos que desconhecem algumas das regras básicas para o condigno convívio social em face do Estado, como por exemplo: Na Administração Pública não pode haver liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “pode fazer assim”; para o administrador público significa “deve fazer assim” (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, 21ª edição, Malheiros Editores, pg. 82).]
Certamente, se a cidadania fosse “religiosamente” exercida no nosso Estado Democrático e de Direito, a grande maioria dos brasileiros teria, por exemplo, plena consciência de que o direito do cidadão termina onde começa o direito do outro, até porque, “a ninguém é dado o direito de desconhecer a lei, para furtar-se do seu cumprimento (Art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil).
É razoável, pois, concluir que a maioria dos brasileiros pode sim ser considerada cidadã, não pelo pleno conhecimento dos seus direitos e deveres, mas elementarmente pelo princípio da dignidade humana que lhe é fundamentalmente assegurado, bem como pelos valores e padrões de conduta éticos e morais que lhes são culturalmente inerentes, a bem da coexistência em sociedade.
Ainda a título de reflexão, não sabe a maioria dos indivíduos que não é preciso ser, necessariamente, advogado para instruir, por exemplo, o procedimento de habeas corpus, tampouco para escrever um artigo como este; simplesmente, basta tão somente ser cidadão(ã).
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