O mapa e a paisagem | Por R. C. Amorim Neto

Ontem retornei de uma longa viagem por cinco estados dos EUA. Visitei pequenas e grandes cidades em Nevada, Utah, Wyoming, South Dakota e Idaho. Sem mencionar alguns lugares interessantes na Califórnia, de onde parti. Foram sete dias na estrada, centenas de milhas percorridas e incontáveis fotos. Fiz esta viagem com um amigo que já havia feito o trajeto alguns anos atrás e que tem certa facilidade em organizar este tipo de atividade.

Apesar de ter levado meu computador e também um livro, estava com total disposição para viver uma aventura e explorar cada lugar por onde passasse, tentando conhecer o máximo possível dos costumes e da história local. A cada nova cidade, muitas perguntas e uma incansável atitude de turista. Até mesmo a vestimenta era apropriada: bermuda, mochila com garrafas de águas, câmera e boné.

Durante os quatro primeiros dias, dei pouca importância aos sentimentos que experimentava e também às possíveis reflexões. Minha atenção estava completamente voltada para aquilo que estava fora de mim. Entretanto, ao iniciar a viagem de volta, o nível de excitação diminuiu e os tempos em silêncio aumentaram.

Quando atravessávamos o estado do Wyoming em direção ao Idaho – o último estado a ser visitado – passamos pelo parque “Grand Teton” e meus olhos sedentos alcançaram o pico das montanhas cobertas por gelo glacial. Meu colega, que neste momento era o motorista, sugeriu que eu pegasse o mapa para ter informações mais precisas sobre o local e ver o quão grande era o parque. Permaneci em silêncio, tentando devorar cada detalhe da imensidão diante de mim.

“No mapa tem alguns detalhes sobre a extensão desta montanha”. Meu colega insistiu.

“Obrigado, mas prefiro olhar a paisagem agora e conferir o mapa depois.” Respondi.

Alguns minutos depois paramos para almoçar ali mesmo no parque, e enquanto tirava fotos e observava o ambiente ao meu redor, meu colega estava sentado à mesa do restaurante estudando o mapa. Olhei para ele, olhei para a montanha no horizonte e resolvi caminhar um pouco. Enquanto me aproximava de um pequeno rio que passava logo à minha frente comecei a pensar sobre o fato de que algumas vezes já desperdicei momentos especiais da minha vida, deixando de contemplar a paisagem para analisar o mapa.

Considerar o mapa atentamente é importante não apenas pelo prazer de obter informações sobre o local, mas também para evitar dores de cabeça e situações complicadas, ainda mais em uma viagem longa. Entretanto, é importante distinguir a hora de atentar para o mapa e o momento de se entregar à paisagem, que deixará de existir diante de seus olhos à medida que você avança.

Se considero a viagem como uma metáfora da vida, poderia dizer que algumas pessoas passam mais tempo planejando o trajeto, tentando escolher o melhor caminho, do que contemplando a beleza do lugar visitado. Nem todas as paisagens da vida são longas e imensas como o “Grand Teton” e permitem um segundo olhar, a maioria delas são curtas. Em um momento estão à sua frente, no outro já desapareceram, por isto é importante ter os olhos e o coração bem abertos para sentir o pulsar vida e as belezas da estrada.

A vida talvez só ganhe sentido através dos momentos reflexivos pelos quais necessariamente precisamos passar. Todavia, ela adquire sabor quando vivemos o momento presente, discernindo entre a hora certa de estudar o mapa e o tempo para se deixar abraçar pela paisagem que está a sua disposição apenas uma única vez em todo o trajeto a ser feito.


Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe to get the latest posts sent to your email.

Facebook
Threads
WhatsApp
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading

Privacidade e Cookies: O Jornal Grande Bahia usa cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com o uso deles. Para saber mais, inclusive sobre como controlar os cookies, consulte: Política de Cookies.