Quando a educação transforma-se em mercadoria e perde o seu valor | Por Reginaldo Souza

No dia do lançamento do Pacto Pela Educação na Bahia, véspera do Dia do Trabalhador e Dia das Mães, recebemos de V. sa., intempestivamente, o corte de nossos salários, mesmo tendo cumprido todas as exigências legais. Com menos de 22 dias em greve em luta por melhores condições de trabalho, permanência estudantil e garantia da autonomia universitária, recebemos um “presente de grego” pelo também Dia Mundial da Educação. A democracia e o diálogo, outrora bandeira de luta do Partido dos Trabalhadores, foram substituídos pela ameaça explícita à aqueles que resolveram protestar publicamente contra os desmandos de Vossa administração.

Gostaríamos de lembrar a V.sa, que há muito tempo não comparece a uma escola ou a uma universidade pública, que nós professores temos como missão educar. Isso significa permitir às novas gerações o acesso a diversos aspectos da vida humana às quais elas não “veriam” se não estivessem nessas instituições de ensino. Portanto, educar é ensinar a “ver”, é desenvolver habilidades, é, principalmente, despertar sensibilidades, pois, segundo Rubens Alves, sem elas “[…] todas as habilidades são tolas e sem sentido, pois os conhecimentos nos dão os meios para viver e a sabedoria nos dá razões para viver.” E esse tem sido o nosso papel.

Entrando em greve não paramos de cumprir com a nossa missão, pois estamos, assim, despertando em nossos alunos, e em toda a população baiana e brasileira, a sensibilidade para “ver” e não mais se conformar com o caos político implantado na Bahia.

Para tanto, a palavra tem sido o nosso mais significativo instrumento. Diuturnamente nós, professoras e professores deste imenso Estado da Bahia, estaremos, pela palavra, lembrando a todos que o Estado com o maior número de pessoas em extrema pobreza é a Bahia com 2,4 milhões; que sua taxa de homicídios é de 36 por 100 mil habitantes (enquanto a ONU estabelece como suportável para grandes cidades 12 por 100 mil); que mais de 12% do total de analfabetos do Brasil (14,1 milhões) está na Bahia: que 1,8 milhão de baianos com 15 anos ou mais (16,7% desta população) não sabem ler e escrever. Estaremos também, caro Governador, alardeando as ações tomadas por V.sa, através de suas diversas secretarias, que têm contribuído para continuar o sucateamento da educação.

Não bastassem esses problemas, lembraremos a todos os índices vergonhosos do IDEB, o número de evasão e de reprovação, os números ainda baixos de matriculados na educação básica (médio) e superior e a falta de ações e condições para permanência e sucesso dos estudantes; os baixos salários e o desrespeito aos servidores públicos, inclusive os da educação; o abandono e as ingerências nas áreas de Segurança e de Saúde e o desrespeito ao principio constitucional federal e estadual de Autonomia das Universidades Estaduais.

Senhor Jaques Wagner, informar de forma mentirosa um aumento de 87,6% no orçamento das universidades estaduais (Uneb, Uefs, Uesc e Uesb), de R$ 386,8 milhões em 2006, para R$ 725,6 milhões em 2011, quando deveria ser utilizado o ano de 2007 para comparação, omitindo a precariedade relacionada ao número de alunos, cursos, docentes, estrutura física, interiorização etc. das universidades estaduais da Bahia, não nos calará e não enganará a uma população que pode enxergar.

Nós, professores, não nos silenciaremos porque nos tirou os salários. E, em nossas salas de aulas, pela palavra, continuaremos a nossa missão de sensibilizar, pois, professores, alunos e funcionários, não podem e não devem ser tratados como mercadoria, a qual se compra a mais barata ou de menor qualidade; não somos moedas de troca, muito menos franquias e não podemos ser adquiridos em “lotes”.

Senhor governador, “Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não morre jamais…” (Rubem Alves). Mas os governos passam… e a educação, que não é mercadoria, ultrapassa o tempo de mandato dos gestores públicos.

*Por Reginaldo Souza.


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