Bope é tiro na cabeça e comemoração! | Por Luiz Flávio Gomes

Luiz Flávio Gomes, jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.
Luiz Flávio Gomes, jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.
Luiz Flávio Gomes é jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.
Luiz Flávio Gomes é jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.

Em um treinamento num parque da zona sul do Rio de Janeiro, captado recentemente pela TV Bandeirantes, os soldados do Bope cantavam alegre e antidarwinianamente o seguinte: “É o bope preparando a incursão. E na incursão não tem negociação. O tiro é na cabeça. E o agressor no chão. E volta pro quartel pra comemoração!”

Por mais que o senso comum do rebanho bovino concorde com isso, é estarrecedor! Consoante Nietzsche, a humanidade ainda se encontra no “grande meio-dia”, ou seja, saiu do amanhecer (dos primatas), mas ainda está longe do anoitecer (do super-humano). Temos muito ainda que evoluir. E, enquanto não evoluímos, continua o “caos dentro de nós”.

Faz parte desse caos o prazer que emana da crueldade, que é incomensurável. Vingança é prazer, é festa (diz Nietzsche). O cérebro humano está preparado para a sobrevivência e procriação. E adora a diversão. Dentro da diversão está o prazer da vingança e da crueldade.

O mesmo prazer experimentado pelo criminoso psicopata com o horror da sua crueldade contra a vítima, esse mesmo prazer o vivencia o vingador (particular ou pago pelo poder público). A vingança é ancestral e pré-histórica. E geradora de mais violência, que muitas vezes se volta contra o próprio policial (no ano de 2012, somente em São Paulo, mais de 100 policiais foram vítimas desse “tiro na cabeça”).

Há duas razões, dentre outras, para nos inteirarmos da Ética: 1ª) somos humanos e contamos (dentro de certas circunstâncias) com liberdade para decidir os atos da nossa vida; 2ª) nós, humanos, somos extremamente vulneráveis. Nos rompemos e morremos com uma facilidade incrível. Somos muito vulneráveis a danos físicos, morais e sentimentais. Não podemos fazer o que vem à cabeça com as demais pessoas, ao contrário, temos que ter cuidados com elas. Em outras palavras, somos mortais (Savater).

Só podemos sair do “grande meio-dia” e começar a passar para o anoitecer quando nos convencermos de que a vida humana não é reversível. Não somos imortais, como os deuses da mitologia grega. Nossa vida é irrepetível e extremamente frágil do ponto de vista físico.

Como ensina Savater (Ética de urgência): “Ainda que o acessório mude muito [advento da internet, da telefonia móvel, das telecomunicações etc.], as coisas básicas da vida, os sentimentos elementares, as ambições, os medos, se mantêm inalterados. Quando vemos que mudam muitas coisas acidentais, aprendemos a distinguir as que são essenciais e que permanecem: o respeito, a cortesia, a ideia de que os seres humanos podemos alegrar a vida uns dos outros”. São animais pouco domesticados (Nietzsche) os que confundem o acessório da vida com o principal, deixando de ver o outro (qualquer outro) também como ser humano, dotado de liberdade e fragilidade (física, moral, sentimental etc.). Dois mil anos depois estamos esquecendo as lições básicas atribuídas a Cristo.

*Luiz Flávio Gomes é jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. | luizflaviogomes.atualidadesdodireito.com.br


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