Todo autor precisa de um editor | Por Alberto Dines

Jornalista Alberto Dines.
Jornalista Alberto Dines.
Jornalista Alberto Dines.
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Mario Sergio Conti admitiu o disparate, a burrada ou que nome tenha. Não ensaiou qualquer justificativa: percebeu o tamanho do desastre desculpou-se prontamente, reconheceu de forma inequívoca que não tinha qualquer argumento em seu favor. Nem poderia admitir que errou traído pela sedução virtuosística de escrever uma matéria e, no fim, invalidá-la com a revelação da fonte falsa.

Jornalista de alto quilate, preparadíssimo, um dos melhores do país, ele sabe que com notícia não se brinca. No entanto tentou brincar: está pagando por isso. Na Veja, em 1983, uma brincadeira (ou ingenuidade) semelhante produziu o episódio do “boimate”, memorável barriga científica corrigida somente meses depois e com enorme má vontade.

Nossa imprensa não é treinada para pedir desculpas. Assume-se infalível, inquestionável, usa a mitra pontifícia mesmo não a merecendo. Culpa talvez do seu longo convívio com os dogmas do universo eclesiástico. E agora, neste transe pós-modernista, quando nossos jornais imaginam-se greco-romanos espetando colunas em cada canto e esquina, pulveriza-se uma das cláusulas pétreas do contrato informativo: reconhecer a desinformação.

A periodização absurda do rodízio de colaboradores (quinzenais ou mensais) somada à falta de editores traquejados e cultos, capazes de detectar e chamar a atenção para eventuais impropriedades, torna nossos jornais uma vasta terra de ninguém em matéria de responsabilização.

Exemplar o caso da bobeada da senadora Kátia Abreu ao confundir Aristóteles com Arquimedes, registrada numa errata publicada em outra página, de outro caderno, a quilômetros de distância. O porteiro da página deixou passar o erro, da autora não se exigiu o indispensável reparo e o caso foi encerrado (ver “1933 está de volta. Em novo endereço”).

Crítica requintada

Quando este observador usou pela primeira vez a sentença que serve de título a estas mal traçadas pensava no escritor e autor de livros porque livros são permanentes. A colossal expansão do bloguismo obriga o jornalismo a se tornar cada vez mais autoral, cada vez mais responsável e comprometido com o teor e a qualidade do que imprime, difunde e pereniza.

Diante da página em branco, mesmo o melhor editor do mundo jamais dispensará o olhar de um colega. Ao menos para elogiar. O trabalho jornalístico é intrinsecamente plural. Ou dual. Um profissional experiente, ao receber o texto de Mario Sergio Conti deveria tê-lo alertado para o perigo de um mal-entendido por parte de leitores que não perceberam a pretendida sutileza. Está na cara que ao começar a escrever o fatídico texto o colunista sabia que o entrevistado era um sósia do técnico da seleção. Fez uma opção audaciosa, deixou a informação crucial para o pé – pisou na bola.

Numa revista mensal com a qualidade da piauí (que Conti ajudou a criar e dirigiu), faria sentido um texto intitulado “O dia em que entrevistei Scolari sem perceber que era um sósia”. O jornalismo admite e até necessita deste tipo de crítica requintada, maneirista. E Mario Sergio tem os atributos para fazê-lo como aconteceu na segunda edição do seu best-seller Notícias do Planalto. Desde que em ambientes adequados.

Em meio ao frenesi de uma Copa, num texto publicado nos dois maiores diários do país e respectivos portais, esta maestria teria enorme chance de resultar em catástrofe.

Não deu outra.

Outro caminho

Injustificável o linchamento a que está sendo submetido Mario Sergio Conti. Os ressentimentos com a grande imprensa levam muitos a descontar nele suas frustrações. Converteu-se em bode-expiatório de culpas que não tem. Na Botucúndia pratica-se a crítica da mídia com os tacapes do preconceito e do rancor. Não é esse o caminho.

*Escrito por: Alberto Dines | Fonte: Observatório da Imprensa.


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