
Com o título acima, o acadêmico Dival Pitombo publicou no jornal “A Tarde” de julho de 1975, há mais de quatro décadas, artigo sobre a “elite intelectual da cidade”. Vale a pena ler de novo.
– A mais importante e influente das rodinhas literárias funcionava no escritório de Gastão Guimarães sob a égide do seu patriarca. Localizava-se na Praça da Bandeira, mais ou menos onde situa-se hoje a Galeria Carmac.
De consultório médico tinha apenas o nome, pois mestre Gastão absorvido pelo magistério, que honrou sobremodo, dedicava-se exclusivamente a ele e aos labores intelectuais com o entusiasmo que o acompanhou até a morte.
Ali reunia-se todas as tardes o grupo que representava a elite intelectual da cidade: Clóvis Amorim, Humberto Alencar, Honorato Bonfim, Pedro Américo de Brito e eventualmente alguns subliteratos que forçavam a barra para participarem da roda.
Eram reuniões informais, onde as conversas giravam em torno de assuntos de cultura e, às vezes, de políticas. Gastão Guimarães com a sua autoridade, sua simpatia dominadora era o Pontifez Maximus. Em torno dele gravitavam satélites.
Cedo estabeleceu-se uma emulação discreta, mas atuante entre dois dos mais jovens. Clovis Amorim e Humberto Alencar. Ambos muito inteligentes. Oradores brilhantes, disputavam nas tribunas, com justa pretensão o aplauso público. Embora a cordialidade não fosse sacrificada abertamente, a rivalidade desenvolvia-se velada, por vezes aflorando em sátira contundente.
Referindo-se a Humberto dizia Clóvis: “É um gigolô da inteligência alheia”. Por sua vez Humberto oportunamente, como quem faz um comentário natural largava esta: “Hoje surpreendi o Clovis decorando o “improviso” que vai fazer, amanhã no comício da UDN”.
Em Humberto Alencar a palavra era mais espontânea. Jorrava como impetuosa corrente diante do povo, mesmo quando o auditório era de nível inferior. Em Clovis a expressão mais trabalhada pressupunha uma preparação. Seu talento evidencia-se sobretudo na sátira.
Fez epigramas que poderiam figurar ao lado dos de Gregório de Matos. Pena que alguns dos melhores sejam impublicáveis no momento. Há uma série deles, fustigando todos os membros da Academia Bahiana de Letras.
Isto não impediu que nos últimos tempos visse, com simpatia o seu nome lembrado para figurar na instituição, patrocinado por Wilson Lins. Como se disse de Wilde, dele poderia dizer-se que esbanjou talento nas conversas.
Era um prazer conversar com Clovis. Certa vez, encontrei-o conversando com um poeta que se queixava de lhe terem roubado uns versos recentemente inscrito. Imediatamente passou-me um papelzinho onde li o seguinte:
“Foste em teus versos roubados.
A razão eu vou dizer:
É que o ladrão apressado
Não teve tempo de os ler”.
Com esse poeta, conversava numa esquina, quando me aproximando perguntei-lhe:
– Que está fazendo?
Resposta – “monologando”.
Apesar do talento específico para a sátira, escreveu versos líricos de uma beleza terna e profunda, como o seu “Noturno da Ilha”, que lia para os amigos, mas não publicava, com medo de aflorar um sentimentalismo que amava ocultar atrás de uma máscara de mordacidade.
*Adilson Simas é jornalista.
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