Governo Bolsonaro participa da COP26 com meta “vexatória” e sem convencer sobre plano ambiental em curso no Brasil

No fim de 2020, o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, aumentou a base de cálculo que permite ao país emitir ainda mais gases de efeito estufa do que o estabelecido no Acordo de Paris sobre o Clima, em 2015.

A manobra foi apelida de “pedalada ambiental”. O governo modificou a Contribuição Nacionalmente Determinada do Brasil (NDC, na sigla em inglês), que previa a redução de 37% das emissões até 2025 e 43% até 2030, em comparação às de 2005. Esses índices permaneceram idênticos – embora especialistas apontem que o país teria condições de diminuir bem mais.

O pior, porém, é que a base de cálculo foi alterada para cima (de 2,1 para  2,8 bilhões de toneladas de CO2), o que dá ao país uma margem extra para despejar na atmosfera 400 milhões de toneladas de carbono a mais do que estava previsto há seis anos.

O maior objetivo da COP26 é justamente o contrário: que os países aumentem as suas promessas de corte de emissões, já que na trajetória atual, o planeta se encaminha para uma elevação de 2,7ºC da temperatura global até o fim do século, na comparação com a era pré-industrial.

“Nós temos um procedimento na Justiça pedindo para o governo brasileiro reapresentar a sua promessa porque as que foram colocadas são totalmente vexatórias. Esse é um tipo de movimento que vem crescendo pelo mundo, de pressão da sociedade pelas vias judiciais”, afirma o secretário-executivo do Observatório do Clima (OC), Márcio Astrini.

Nesta terça-feira (26), a entidade protocolou uma ação civil pública na Justiça Federal do Amazonas contra a União e o Ministério do Meio Ambiente, para pedir a atualização do Plano Nacional sobre Mudança do Clima. “Lançado em 2008, o plano é a espinha dorsal das políticas públicas de redução de gases-estufa no Brasil, mas nunca foi atualizado”, argumenta o OC.

Fim do desmatamento

Para a COP26, o único avanço concreto até agora é que o Brasil antecipou em 10 anos a sua promessa de atingir a neutralidade de carbono, até 2050. A expectativa é de que, durante a conferência, o governo também adiante a meta de acabar com desmatamento ilegal até o fim desta década – analistas garantem que esse objetivo seria possível já em 2025, com ações efetivas de fiscalização e combate.

Nesta semana, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, e o da Economia, Paulo Guedes, apresentaram o Programa Nacional de Crescimento Verde, ao lado da cúpula do governo federal, incluindo o presidente Jair Bolsonaro. O plano, num total de US$ 400 bilhões, integra a estratégia para apresentar o Brasil como “a maior economia verde do mundo”.

A iniciativa, no entanto, não deve bastar para que o país desembarque na COP com mais credibilidade. Na principal lição de casa do Brasil, a queda do desmatamento, o governo tem resultados catastróficos a apresentar: desde 2018, a devastação da Amazônia aumentou 46%, ressalta Astrini.

“É um governo que induz ao desmatamento, ao crime ambiental, e isso vai danificando a imagem do país mundo afora e diminui capacidade do Brasil de ter assento e voz nesses fóruns internacionais”, avalia. “O Brasil acaba ficando mais para o final da fila, falando por menos tempo e sendo menos considerado, afinal está andando na contramão do que o mundo precisa”, constata.

Importância da Amazônia para o mundo

A maior parte das emissões brasileiras tem origem no desmatamento, que responde por 44% do total, segundo o SEEG, o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima. Conforme a metodologia, o país se situa entre a quarta e a sexta posição entre os que mais emitiram gases de efeito estufa, que provocam o aquecimento do planeta.

O que acontece no Brasil impacta, portanto, diretamente nos objetivos globais para enfrentar o problema: sozinha, a Amazônia tem a capacidade de estocar o equivalente a cinco anos das emissões do mundo inteiro, como explica Marcelo Furtado, facilitador da Coalizão Brasil Clima Florestas e Agricultura. A entidade reúne mais de 300 empresas, organizações da sociedade civil e pesquisadores sobre as mudanças climáticas.

“O fato de a gente ter 60% da Amazônia no nosso território é uma bênção e é uma tremenda responsabilidade. O mundo sem a floresta amazônica em pé não vai chegar no objetivo de só 1,5ºC de aumento da temperatura até 2100. É por isso que as pessoas olham tanto para o Brasil e estão tão preocupadas com o que a gente está fazendo aqui”, frisa Furtado. “Eles sabem que sem essa floresta em pé, a gente não vai conseguir chegar lá. Então, tem uma expectativa de que nós façamos a nossa parte: é manter a floresta amazônica em pé, recuperar tudo que foi degradado, construir uma economia sustentável e pegar toda a nossa agricultura e mudá-la para uma agricultura sustentável”, destaca o especialista.

*Com informações de Lúcia Müzell, da RFI.


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