Depois que o ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, afirmou, num simpósio jurídico em Lisboa, que o STF era o poder moderador da República (cuja existência, entre nós, só ocorreu no Império), o tema virou motivo de discussão no mundo politico. A ideia criadora desse poder é do filósofo francês Benjamin Constant, autor dos Princípios Políticos, publicados em 1814. Segundo ele, a estabilidade do poder só se daria com a aceitação de uma limitação da soberania popular, capaz de impedir o desrespeito aos direitos fundamentais.
Nenhum outro país, com exceção de Portugal e Brasil, adotou esse poder. Lá durou bastante tempo; aqui, 67 anos (1822-1889). Tratava-se de um dos poderes que constituíam as instituições do Império, construído como forma de harmonizar as tradições politicas conservadoras e liberais. Coexistindo com os poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, o poder moderador formava um quarto poder, concedido ao imperador para “vigiar a Constituição” e “harmonizar” os demais poderes. A Carta do Império, de 1824, assim dispunha em seu artigo 98: “O Poder Moderador é a chave de toda a organização política e é delegado privativamente ao imperador, como chefe supremo da nação e seu primeiro representante, para que incessantemente vele sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos”.
Na Revolução de 1930 ele foi lembrado pelo caudilho Borges de Medeiros, cujo anteprojeto constitucional de 1933, de sua autoria, pretendia ressuscitá-lo. Foi lembrado também no governo Bolsonaro, como pertencente às Forças Armadas, conforme interpretação dada por alguns juristas ao artigo 142 de nossa Magna Carta, a exemplo de Ives Gandra Martins.
Embora o objetivo das Forças Armadas seja militar e não político, esses juristas defendem que elas detêm esse poder “como garantia dos poderes constitucionais”, e não apenas o de garantir a segurança da pátria, do livre exercicio dos poderes públicos (Executivo, Legislativo e Judiciário) e, por ordem de qualquer deles, o cumprimento da lei e da ordem.
Agora, o ministro Dias Toffoli, do STF, num simpósio jurídico em Lisboa, mostrou às claras que o Supremo Tribunal Federal é o poder moderador da República. Essa tese não é dele, mas do ministro Gilmar Mendes. Mesmo assim, deu margens a algumas críticas. O deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança tuitou que o Imperador Pedro I não fazia ativismo político, não alterava a Constituição, não inventava leis nem mandava prender ninguém.
Para completar, Toffoli acrescentou que o sistema de governo no Brasil é semipresidencialismo, utilizando o adjetivo semipresidencial para expor seu pensamento. Muito embora a Constituinte tenha criado uma base parlamentar com uma emenda presidencial, a prática vem demonstrando que a atual Constituição mais dificulta o governo do que ajuda. O presidente Sarney, que foi o primeiro semipresidente do Brasil, afirmou, no dia da sua promulgação, que “Com esta Constituição, o Brasil fica ingovernável”.
Segundo o ex-ministro – e também ex-parlamentar constituinte- Nélson Jobim, os “constituintes estavam sob a síndrome do autoritarismo, e enfraqueceram o chefe do Poder Executivo”. Realmente, o poder está com o Congresso. Ao vetar tudo o que o presidente faz ou decide contrariando os interesses dos congressistas, o Congresso demonstra que detém o poder em quase sua totalidade. Assim, se realmente existir esse poder moderador como quer o ministro Toffoli, ele não está no STF, mas no Congresso, que é quem governa o país. E mais: em Lisboa, no simpósio de Gilmar Mendes, o presidente da Câmara, Arthur Lira, e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, deram a entender que nosso sistema de governo é semipresidencialista. Daí o Congresso como poder moderador.
*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.
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