Voluntários fazem mutirão de limpeza e distribuem doações no litoral de São Paulo

No bairro da Topolândia, em São Sebastião, voluntários trabalhavam com o apoio de escavadeiras e caminhões para tirar a lama e o entulho das ruas.
No bairro da Topolândia, em São Sebastião, voluntários trabalhavam com o apoio de escavadeiras e caminhões para tirar a lama e o entulho das ruas.

Durante esta segunda-feira (20/02/2023), parte dos moradores atingidos pelos estragos das chuvas em São Sebastião, no litoral norte de São Paulo, tentavam acessar as casas em meio a lama. O município contabiliza 39 das 40 mortes causadas pelos deslizamentos e enxurradas no litoral norte. São 1,7 mil pessoas desalojadas e 766 desabrigadas na região.

No bairro da Topolândia, em São Sebastião, voluntários trabalhavam com o apoio de escavadeiras e caminhões para tirar a lama e o entulho das ruas. “Hoje, passei o dia todo tirando lama da viela”, contou Carlos José de Santana, que mora com a mulher e o filho adolescente em uma das casas atingidas.

Na madrugada de domingo, a família deixou a residência com água acima do joelho. Segundo Carlos, que vive de vender queijo nas praias, eles já desconfiavam que o temporal muito acima do normal poderia trazer problemas. “Nós não dormimos nessa noite. Ficamos preocupados. Era muita água. Muita água mesmo”, lembra. Os 682 milímetros de chuvas registrados na região são o maior acumulado da história do país.

Mas, nem todos os moradores perceberam de antemão o perigo. A estudante Geovana Mandinga, de 19 anos, disse que, mesmo com os sinais iniciais, a família não previu que um deslizamento ia destruir a casa onde viviam.

“Lá em cima, tem uma barreira de terra que, com a chuva, desceu. Quando eu percebi, eram 3h. Só estava descendo terra. Parecia tranquilo. Só que eu dormi e às 6h eu vi uma casa sendo levada para baixo, a casa da frente”, relata.

Quando o desastre se mostrou iminente, a mãe, o padrasto, os quatro irmãos e os dois sobrinhos ainda bebês da jovem deixaram a casa levando o pouco que conseguiram carregar. “A gente pegou umas peças de roupa e documentos. A gente teve que pular o muro dos vizinhos para conseguir [sair]. A gente ficou ilhado algumas horas antes de descer todo mundo”, conta.

Solidariedade

Apesar de fortemente afetados pela catástrofe, a família ainda encontrou espaço para ser solidária com quem está em uma situação pior. Geovana levou o excedente das doações que recebeu a uma escola que está abrigando pessoas que também perderam as casas. “Tudo o que sobrou, que a gente não tem onde colocar, estamos levando para o fundo social. Porque tem muitas famílias que a gente conhece que perderam [tudo] também”, diz a jovem, que está temporariamente na residência de parentes.

Durante os trabalhos de limpeza nas ruas do bairro, não param de chegar fardos com água mineral e alimentos que são organizados em casas que não foram atingidas ou em tendas improvisadas, algumas por igrejas. “Estamos tentando ajudar mais os voluntários e os moradores que estão lá em cima. Eles não conseguem fazer comida, estão sem água”, diz Raíssa Morais, moradora há 20 anos da região que faz parte de um dos grupos que organiza as doações.

Raíssa, que trabalha como assessora de um vereador do município, disse que também participou da mobilização para que empresários e moradores da cidade oferecessem o apoio as pessoas atingidas pelas chuvas. “Começamos a movimentar, ligando para um, pedindo para outro. Foi quando começou a chegar as doações para a gente”, diz.

A empregada doméstica Tatiana Pereira da Silva foi uma das beneficiadas pelas doações da escola, que virou abrigo. Ela percorria as ruas enlameadas do bairro descalça. Ela, o marido e o filho escaparam por pouco da tragédia.

“Quando eu abri a porta, a lama já estava entrando na minha casa. Eu fiquei desesperada. Tranquei tudo e sai correndo. A lama já estava no meio da canela quando a gente desceu”, conta.

Alertas

Assim como todas as pessoas ouvidas pela Agência Brasil, ela afirma não ter recebido nenhum alerta da prefeitura ou da Defesa Civil.

Em entrevista coletiva hoje, o prefeito de São Sebastião, Felipe Augusto, disse que a administração municipal emitiu alertas a partir das 21h de sábado, quando começaram as chuvas na cidade. Segundo ele, apesar de ter conhecimento prévio de que o município receberia fortes chuvas, o volume surpreendeu.

“O que não se esperava era a densidade dessas chuvas, que ultrapassaram 600 milímetros num curto espaço de tempo. Às 3h [de domingo], o Centro de Coordenação de Emergência e de Contingência foi ativado. Nós nos reunimos no centro operacional da prefeitura, com a presença do Corpo de Bombeiros, coordenando todas as ações e já recebendo os primeiros chamados de escorregamentos e alagamentos”, disse.

O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) informou que as defesas civis locais já tinham conhecimento dos riscos de um evento extremo no litoral norte desde a última quinta-feira (16).

Bairros ilhados

Alguns bairros do município permanecem ilhados devido aos deslizamentos que atingiram estradas fundamentais para o deslocamento na região. A área que vai da Barra do Sahy até Boiçucanga só pode ser acessada por helicóptero ou pelo mar. É dessa forma que estão sendo feitos os resgates e o envio de mantimentos para as pessoas que estão isoladas nessa parte do município. Os estragos ainda estão sendo avaliados, mas, há indícios que trechos das rodovias Rio-Santos e da Mogi-Bertioga foram completamente destruídos.

Moradores dizem que não receberam alerta de deslizamento

Moradores da Barra do Sahy, um dos bairros de São Sebastião mais afetado pelos temporais no litoral norte paulista, relataram à Agência Brasil que não receberam qualquer tipo de alerta para o risco de deslizamento por causa das fortes chuvas na região no último fim de semana.

O Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) informou que previu com três dias de antecedência os temporais e avisou a Defesa Civil Nacional e as defesas civis locais.

“Alerta mesmo fomos, nós, da comunidade: ‘corre que o morro está descendo’”, conta Wagner de Oliveira, morador do bairro e que ajudou no resgate de vítimas.

Em entrevista coletiva na última segunda-feira (20), o prefeito de São Sebastião, Felipe Augusto, disse que a administração municipal emitiu alertas a partir das 21 horas de sábado (18), quando começaram as chuvas na cidade.

No entanto, a prefeitura não divulgou alerta prévio sobre as chuvas na madrugada de domingo. O primeiro alerta foi publicado na conta da prefeitura no Twitter às 7 horas de domingo, após temporal.

Remoção

Desde a manhã de hoje (22), moradores da vila estão deixando suas casas para se abrigar na casa de parentes e em escolas. Uma decisão da Justiça, atendendo a pedido do governo do estado e da prefeitura, autorizou a remoção de todas as pessoas que vivem em áreas de risco no município.

A faxineira Valdineia Gonçalves aceitou deixar a casa onde vive e se abrigar em uma escola. Moradora do bairro há dois anos, ela pensa em retornar a Bahia, sua terra natal, depois dos momentos de terror vividos nos últimos dias.  “Acordei com o barulho. Os vizinhos batendo na minha porta. Aí, peguei as crianças, que estavam dormindo. Fomos para pista, tentar pedir socorro com a lama aqui [faz o gesto na altura do peito]”, lembra. Ela conta que, mesmo com todo o momento de desespero, manteve a família unida. “Passou quase todo mundo nadando. Eu segurando minha filha de um lado e o meu filho do outro”,

Agenilson de Jesus, que é conterrâneo de Valdineia, diz que também pensa em voltar ao Nordeste depois de ter perdido a casa e os documentos na tragédia. “Estava dormindo e acordei com aquele monte de gente gritando, desesperada. Aí, eu peguei o celular, porque já estava sem energia em casa, para acender a lanterna. Quando eu abri o portão, já veio aquele monte de lama, carro descendo”.

Para se salvar, ele subiu na laje do imóvel e pulou quando sentiu que tudo vinha abaixo. “Eu tive que pular, a casa começou a desmoronar”.

Apesar do risco de permanecer no local, Wagner de Oliveira diz que não vai deixar a casa onde vive com a mãe, o pai e sete irmãos. “A casa, foram muitos anos para conquistar. Não foi de um dia para o outro. Você não pode simplesmente sair por sair”.

*Com informações da Agência Brasil.


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