A violência associada às torcidas organizadas tem sido um fenômeno recorrente nos estádios brasileiros. O confronto entre torcedores do Sport e do Santa Cruz, ocorrido no Recife, reacendeu o debate sobre os fatores que contribuem para esses episódios. Especialistas consultados afirmam que tais situações representam apenas uma manifestação de um problema mais amplo, relacionado à forma como a violência se insere na sociedade.
O pesquisador Edergênio Vieira, do Núcleo de Estudos Sobre Violência e Segurança da Universidade de Brasília (NEVIS/UnB), destaca que o futebol transcende o caráter esportivo e assume um papel na construção da identidade nacional. Segundo ele, o esporte reflete a maneira como os brasileiros lidam com suas emoções e relações sociais. Vieira ressalta que a intensidade com que o torcedor vivencia as partidas pode resultar tanto em celebração quanto em hostilidade, dependendo do contexto e das interações dentro da torcida.
O pesquisador observa que, historicamente, o futebol foi um esporte restrito à elite, mas com o tempo se tornou acessível a camadas populares. O crescimento das torcidas organizadas proporcionou um espaço de pertencimento para muitos jovens, especialmente aqueles oriundos de regiões com vulnerabilidade social. A dinâmica desses grupos, marcada por rituais coletivos e forte identidade, contribui para a criação de vínculos afetivos e de compromisso com o clube e os demais torcedores.
O psicólogo Pedro Henrique Borges, ex-diretor da torcida organizada Rubra, do Anapolina, explica que torcidas organizadas são estruturas de massa que seguem padrões de comportamento semelhantes aos descritos por Sigmund Freud em seus estudos sobre psicologia coletiva. Ele aponta que, dentro do grupo, o torcedor busca aceitação e, muitas vezes, adere a comportamentos extremos como forma de reafirmação. Segundo Borges, a necessidade de pertencimento pode levar indivíduos a atitudes que não tomariam isoladamente.
O fenômeno da violência no futebol também está ligado a questões socioculturais, incluindo a reprodução de valores como o machismo. Borges argumenta que, para muitos homens, a torcida é um dos poucos espaços onde expressar afeto é socialmente aceito. Ele destaca que, durante os jogos, abraços, lágrimas e gestos de emoção são legitimados, algo que em outros contextos poderia ser reprimido.
Vieira complementa que a violência estrutural presente na sociedade se reflete nos estádios. A dificuldade de reconhecer méritos no adversário e o culto à rivalidade extrema são elementos que reforçam conflitos entre torcidas. Ele observa que, em alguns casos, há um padrão de comportamento que se assemelha a movimentos extremistas, no qual o adversário é desumanizado e tratado como inimigo.
Borges acrescenta que certos indivíduos com perfil violento se aproveitam das torcidas organizadas para manifestar impulsos agressivos. Estudos indicam que uma parcela dos participantes dessas torcidas apresenta características associadas à psicopatia, o que pode potencializar atos de brutalidade dentro do grupo.
A sensação de proteção conferida pelo coletivo também é um fator relevante. Vieira explica que, dentro da multidão, o indivíduo tende a se sentir mais seguro para agir sem considerar as consequências de suas ações. Esse fenômeno, conhecido como “efeito manada”, reforça a impunidade percebida por torcedores que participam de atos violentos.
Especialistas afirmam que medidas de controle e políticas de conscientização são essenciais para reduzir a violência nos estádios. A implementação de estratégias que promovam o respeito entre torcedores e a valorização do futebol como espaço de lazer e cultura pode contribuir para a diminuição dos confrontos. A educação e a adoção de programas voltados à inclusão de jovens em atividades esportivas são apontadas como caminhos para mitigar o problema.
*Com informações da Agência Brasil.
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