A indústria da guerra e seus impactos econômicos: Conflitos como motores de crescimento para potências globais

Especialistas analisam como o aumento de tensões internacionais movimenta setores estratégicos, mesmo em países fora de zonas de guerra.
Especialistas analisam como o aumento de tensões internacionais movimenta setores estratégicos, mesmo em países fora de zonas de guerra.

O crescimento dos investimentos militares em diversas partes do mundo tem sido impulsionado por tensões geopolíticas crescentes, conflitos armados em diferentes continentes e reestruturações no sistema internacional. A recente aprovação pela Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) de um gasto mínimo de 5% do PIB com defesa por parte de seus membros reflete esse movimento.

Segundo especialistas, esse cenário repete dinâmicas observadas antes da Primeira Guerra Mundial, nas quais a militarização se consolidava como um dos pilares da economia global. De acordo com o professor Bernardo Rodrigues, do Instituto de Relações Internacionais e Defesa (IRID) da UFRJ, a guerra, embora destrutiva, gera lucros significativos para setores estratégicos, como a indústria de armamentos, tecnologia e petróleo.

Os Estados Unidos concentram cerca de 40% dos gastos militares mundiais, segundo Rodrigues. As cinco maiores empresas norte-americanas atuam na produção de armas e serviços de defesa, e o país abriga ainda instituições de pesquisa como a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada de Defesa (DARPA), responsável por inovações tecnológicas como a Internet e o GPS.

O especialista aponta que mesmo com os impactos sociais e econômicos negativos das guerras, elas seguem como elementos estruturantes para a manutenção do poder econômico e político de várias potências.

“O conflito é parte do modelo de acumulação de capital da maior potência do mundo, os Estados Unidos”, afirma.

O contexto atual inclui impasses diplomáticos sobre a guerra na Ucrânia, tensões no Oriente Médio, disputas entre Índia e Paquistão e conflitos internos no Sudão. Frente a esse panorama, diversos países ampliam investimentos em defesa. Um exemplo citado por Rodrigues é a Alemanha, que passou a adotar um programa de rearmamento histórico diante da percepção de ameaças externas e ausência de proteção internacional.

Além disso, medidas econômicas aplicadas por países ocidentais, como sanções comerciais contra Rússia e Irã, estão contribuindo para uma mudança na arquitetura financeira internacional, incluindo fugas do dólar e do sistema SWIFT. Tais transformações são interpretadas como sinais de enfraquecimento da ordem liberal internacional pós-Guerra Fria.

Embora evite afirmar que o mundo esteja próximo de uma nova guerra mundial, Rodrigues destaca que os movimentos atuais do setor de defesa apresentam semelhanças com o período pré-1914, como o aumento da militarização e a redefinição de alianças geopolíticas.

A lucratividade do setor militar também se manifesta em contextos sem guerra declarada, conforme aponta a doutora em relações internacionais Mariana Kalil, da Universidade de Brasília (UnB). Em pesquisa realizada em Acapulco, no México, Kalil observou que a militarização do combate ao narcotráfico aumenta a demanda por armamentos, inclusive em regiões de segurança pública fragilizada.

No Brasil, levantamento da Polícia Militar do Rio de Janeiro mostrou que 95% dos fuzis apreendidos com criminosos foram fabricados no exterior, majoritariamente nos Estados Unidos. Em maio, o governo fluminense anunciou a compra de um helicóptero Black Hawk, reforçando a dependência de tecnologia bélica estrangeira mesmo em situações de segurança pública interna.

Kalil conclui que, em contextos de instabilidade, tanto a guerra quanto a paz podem gerar oportunidades econômicas relevantes para a indústria bélica.

“A guerra é muito lucrativa, mas a paz também pode ser”, resume.


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