Foro privilegiado: 30 mil autoridades devem perder direito a julgamento especial

Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária. Senadores discutem projeto que define os crimes de abuso de autoridade (PLS 85/2017).
Plenário do Senado Federal durante sessão deliberativa ordinária. Senadores discutem projeto que define os crimes de abuso de autoridade (PLS 85/2017).

O Senado deu início a um processo que pode acabar com o direito de mais de 30 mil autoridades do Legislativo, Executivo e Judiciário de serem investigadas e julgadas por tribunais diferentes daqueles que analisam os casos dos demais cidadãos.

Isso ocorreu nesta quarta-feira (26/04/2017), com a aprovação por unanimidade, em primeiro turno, do fim do foro privilegiado para crimes comuns.

Contemplado na Constituição, o chamado foro especial por prerrogativa de função, o foro privilegiado, é um mecanismo que estabelece um procedimento jurídico especial em virtude do cargo ocupado nos três Poderes nas esferas federal, estadual e municipal.

Atualmente, quanto mais alto o cargo da pessoa pública, mais alta é a hierarquia do tribunal que a julgará.

O texto aprovado pelos senadores mantém tratamento especial apenas para presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado e do Supremo Tribunal Federal (STF). Casos criminais envolvendo essas quatro autoridades continuam sob alçada do STF, a corte mais alta do país.

A proposta de emenda à Constituição (PEC) aprovada mantém o foro para todas as autoridades no caso de crimes de responsabilidade, ou seja, violações cometidas no desempenho da função pública.

A extinção do foro aprovada em primeiro turno pelo Senado atinge 34 mil autoridades, desde que acusadas de infrações penais comuns.

Se o texto virar regra, acabará o foro nesses casos para ministros de Estado, governadores, prefeitos, presidentes de Câmaras Municipais e de Assembleias Legislativas, presidentes de tribunais superiores e de Justiça dos Estados, ministros dos tribunais superiores e do Tribunal de Contas da União, procurador-geral da República, embaixadores, membros de Tribunais de Contas estaduais e municipais, integrantes de tribunais regionais, juízes federais e integrantes do Ministério Público.

A PEC ainda precisa ser aprovada mais uma vez pelos senadores para, em seguida, ser apreciada pela Câmara dos Deputados. Se os deputados federais mudarem o texto, ela volta ao Senado antes de eventualmente virar regra.

“Não há razões para a manutenção de qualquer foro por prerrogativa de função: é um imperativo republicano que todos, sem exceção, sejam iguais perante a lei”, escreveu o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que relatou o texto aprovado.

“Hoje o foro especial é visto pela população como verdadeiro privilégio odioso, utilizado apenas para proteção da classe política – que já não goza de boa reputação -, devido aos sucessivos escândalos de corrupção. Oportuno e conveniente, portanto, modificar as regras vigentes”, completou o senador ao justificar as mudanças.

Disputa com STF

Mas a decisão do Senado de votar o fim do foro na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e no plenário no mesmo dia pode se tornar mais um capítulo da queda de braço entre o Congresso e o STF.

Em fevereiro, o ministro do STF Luís Roberto Barroso decidiu levar ao plenário do Supremo uma proposta para restringir o foro que atinge, em princípio, somente autoridades eleitas nas urnas.

A presidente do STF, Cármen Lúcia, agendou a discussão do caso para maio.

O movimento do Senado foi, portanto, uma antecipação a eventuais mudanças que o STF poderia fazer nesse mecanismo, e estendeu o fim do foro em infrações penais também ao Judiciário e ao Ministério Público.

A estratégia tem sido interpretada como tentativa de desestimular o Supremo a se posicionar em relação ao tema.

O STF, contudo, ainda pode alterar o entendimento da lei atual, ainda que de forma mais branda que as alterações propostas pelo Senado.

A discussão no STF deve se dar a partir de uma ação penal contra o ex-prefeito de Cabo Frio Marquinhos Mendes (PMDB-RJ), acusado de compra de votos na campanha à prefeitura em 2008 e que depois assumiu cargo de deputado federal. Por ocupar um assento no Congresso, o caso dele foi para o STF, tribunal onde deputados e senadores têm foro.

Pelo entendimento do ministro Barroso, casos como o do ex-prefeito não deveriam mudar de tribunal quando o investigado ou réu ocupa novo cargo público. Ele defende que o STF julgue apenas crimes cometidos no exercício da função por autoridades que desfrutam de foro na corte.

O foro de cada um

Enquanto o STF nem o Congresso mudam o entendimento da lei e a Constituição, 34 mil pessoas permanecem desfrutando de foro privilegiado.

A depender da pessoa e do cargo que ela ocupa, pode ser julgada criminalmente numa das quatro instâncias do Judiciário brasileiro.

Isso significa, por exemplo, que o presidente da República, o vice-presidente, todos os 594 membros do Congresso Nacional, os ministros de Estado e o Procurador-Geral da República, além dos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas da União, só podem ser investigados e processados pela mais alta corte do país, ou seja, o STF.

O Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, analisa casos envolvendo desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Tribunais de Contas dos Estados e dos Municípios e os do Ministério Público da União.

*Com informação da BBC Brasil.


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