Em Feira de Santana, na Bahia, um possível grave caso de crime ambiental envolvendo a construtora Atrium Construções e Empreendimentos e a Caixa Econômica Federal trouxe à tona falhas nos mecanismos de fiscalização e cumprimento de normas ambientais. A construção do Residencial Parque das Cores, parte do programa habitacional Minha Casa Minha Vida (PMCMV), violou leis ao ser edificada sobre a Lagoa Salgada, área de preservação permanente. O caso também levanta questões sobre a conivência da prefeitura local e os impactos sociais para os compradores das unidades habitacionais.
Construção sobre a Lagoa Salgada
O Residencial Parque das Cores, composto por 213 unidades habitacionais, foi planejado para atender a famílias de baixa renda por meio do PMCMV, um programa do governo federal voltado à redução do déficit habitacional no país. No entanto, o projeto da construtora Atrium foi além das diretrizes estabelecidas pelo programa ao avançar sobre a Lagoa Salgada, um ecossistema protegido pela legislação ambiental. Imagens aéreas registradas ao longo de uma década pelo jornalista Carlos Augusto demonstram a clara expansão do empreendimento sobre a área de preservação, evidenciando a destruição de parte significativa do bioma local.
A empresa, cujo diretor é Bruno Cosmo, não tomou as devidas precauções para evitar danos ao meio ambiente, uma vez que parte do projeto foi implementada dentro dos limites da lagoa. Especialistas em urbanismo e meio ambiente destacam que a ocupação de áreas de preservação permanente não apenas afeta a biodiversidade, mas também compromete o equilíbrio hidrológico da região, aumentando o risco de enchentes e outros desastres naturais.
Falhas nos mecanismos de fiscalização e ação do poder público
A resposta das autoridades locais também foi tardia. Apenas em 2013, quando a maior parte das unidades habitacionais já havia sido construída, o secretário de Meio Ambiente de Feira de Santana, Roberto Tourinho, determinou a suspensão do licenciamento ambiental do Residencial Parque das Cores. Tourinho destacou que o empreendimento violava normas ambientais ao ser erguido em uma área de preservação sem a devida análise de impacto ambiental. Sua decisão foi vista como uma tentativa de mitigar os danos já causados, mas a construção das unidades residenciais sobre a lagoa já havia avançado significativamente.
A postura das autoridades municipais gerou controvérsias. Em sua defesa, a prefeitura alegou que o licenciamento foi concedido com base em documentos apresentados pela Atrium, incluindo uma Licença Ambiental Simplificada emitida em 2009. Contudo, críticos apontam que, ao longo dos anos, a prefeitura de Feira de Santana tem demonstrado falhas sistemáticas na fiscalização de empreendimentos e no cumprimento das diretrizes ambientais. Casos semelhantes de degradação ambiental e urbanística foram registrados na região, sugerindo que a permissividade para com a violação de áreas protegidas não é um evento isolado.
Prejuízos para os compradores
O impacto social e econômico desse crime ambiental não se restringe ao meio ambiente. As famílias que adquiriram imóveis no Residencial Parque das Cores também enfrentam graves prejuízos. Com a suspensão das obras e o atraso na entrega das unidades, muitos compradores já se mudaram para o local, mas continuam a pagar apenas os juros do financiamento, sem que a Caixa Econômica possa cobrar as parcelas principais, uma vez que o empreendimento ainda não foi oficialmente entregue.
Por força de lei, o banco não pode cobrar o saldo devedor antes da entrega formal dos imóveis. No entanto, os juros cobrados acumulam-se, elevando o saldo total devido pelas famílias. Esse quadro gera uma situação de grande injustiça, pois, enquanto a construtora Atrium não arca com as consequências do atraso nas obras, os compradores são penalizados com o aumento de suas dívidas.
A situação se agrava ainda mais com a correção do saldo devedor enquanto o empreendimento permanece inacabado. Isso significa que, mesmo sem terem recebido suas casas oficialmente, as famílias enfrentam a ampliação de suas dívidas, sem perspectiva de uma solução imediata.
Caixa Econômica tenta se eximir de responsabilidade
O papel da Caixa Econômica Federal no financiamento do empreendimento também é alvo de críticas. Em contato com o Jornal Grande Bahia, a Caixa informou que a concessão do financiamento foi realizada com base na documentação aprovada pela Prefeitura de Feira de Santana, que incluía uma licença ambiental válida à época da contratação. A Caixa tentou transferir a responsabilidade para as autoridades locais, destacando que o projeto tinha sido devidamente aprovado nos âmbitos municipal, estadual e federal.
Porém, essa explicação é insuficiente para muitos críticos. A Caixa, como agente financiador de projetos habitacionais, tem equipes técnicas que devem avaliar tanto a documentação quanto as condições reais dos terrenos onde os empreendimentos são construídos. Especialistas em meio ambiente e urbanismo afirmam que essa falha de avaliação por parte do banco expõe a fragilidade dos mecanismos de controle socioambiental de empreendimentos financiados com recursos públicos.
Tentativa de mitigação dos danos
Para tentar minimizar as críticas, a Caixa Econômica ressaltou que o módulo 01 do Residencial Parque das Cores já foi concluído e entregue, enquanto o módulo 02 permanece em atraso devido à falta de renovação da licença ambiental. A instituição informou que a liberação de recursos para a construtora Atrium foi suspensa até que a situação seja regularizada junto à prefeitura.
No entanto, essa divisão entre módulos do empreendimento não alivia as responsabilidades legais. O financiamento foi concedido para o projeto como um todo, e as questões ambientais afetam o empreendimento em sua totalidade. O pedido de licença, assim como o financiamento, foi único, e a Caixa, enquanto agente financiador, deveria ter verificado as irregularidades antes da concessão dos recursos.
Silêncio da construtora e omissão de esclarecimentos
A construtora Atrium, por sua vez, não tem se manifestado sobre as acusações. Tentativas de contato realizadas pela equipe do Jornal Grande Bahia foram ignoradas, e a empresa não tem fornecido qualquer esclarecimento público sobre os danos ambientais e o atraso nas obras. O silêncio da Atrium agrava a situação, uma vez que o contrato com a Caixa Econômica Federal exige transparência e comunicação por parte da empresa. Esse comportamento reforça a percepção de desrespeito aos compradores e à comunidade de Feira de Santana.
Confira imagens
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