O Brasil vive uma longa madrugada | Por Luiz Holanda

Presidente Jair Bolsonaro no município de Anguillara Vêneta, na Itália.
Presidente Jair Bolsonaro no município de Anguillara Vêneta, na Itália.

Depois de um jejum de quase 30 anos, a democracia retornou ao Brasil. O fato ocorreu no dia 15 de novembro de 1989, quando os brasileiros puderam, outra vez, ir às urnas para escolher, entre 22 candidatos e de forma direta, o seu presidente da República.  Na época éramos 82 milhões de eleitores, e a eleição seria para suceder o presidente da transição, José Sarney. Antes, em março de 1985, o último presidente da República eleito de forma indireta, Tancredo Neves, precisou ser internado às pressas para uma cirurgia.

O momento era crítico. Tancredo (PMDB-MG) representava o fim do regime militar, que desde 1964 governava o país. Escolhido pelo Colégio Eleitoral em 15 de janeiro de 1985, em eleição indireta na qual derrotou o candidato do PDS, Paulo Maluf (SP), Tancredo foi internado em estado grave no Hospital de Base de Brasília, tendo Sarney assumido em seu lugar.

Antes da internação o Brasil, eufórico, comemorava a chegada da chamada Nova República. Em maio daquele ano Sarney apresentou algumas reformas que ficaram conhecidas como o “Emendão”, fazendo concessões democráticas, restabelecendo as eleições diretas para presidente da República e concedendo direito ao voto aos analfabetos. Em junho convocou eleição para formar uma Assembleia Nacional Constituinte.

Pela primeira vez o país iria escolher seu presidente em dois turnos de votação, uma novidade da Constituição de 1988. O vitorioso herdaria um país afundado em problemas, com uma inflação na casa dos 50%, um PIB que não crescia há mais de dez anos e uma dívida externa de 140 bilhões de dólares, que custava, só em juros anuais, 12 bilhões de dólares.

Na época estávamos como hoje: salários baixos, dez milhões de desempregados, saúde e educação em frangalhos e uma descrença total no governo. Segundo a imprensa, o sucessor iria herdar uma Belíndia, ou seja, uma pequena Bélgica afluente e uma enorme Índia miserável. Os 22 candidatos eram todos de oposição, pois ninguém queria ser governo. Collor, Lula, Maluf, o comunista Roberto Freire  Brizola e Mário Covas eram os principais postulantes, baseando suas campanhas em críticas ao governo.

Por seis meses, entre junho e novembro, o Brasil viveu a madrugada da democracia. A politica se tornou paixão nacional. Collor, com sua política de “caça aos marajás”, se tornou herói nacional. Subindo rapidamente nas pesquisas, alcançou mais de 40% das preferências nacionais. Igual a Bolsonaro com sua propaganda contra a corrupção.

O problema é que nenhum dos dois resolveram os problemas do país. Collor sofreu impeachment, e Bolsonaro, vez por outra, é ameaçado com a mesma medida. Isolado aqui e lá fora, foi um dos únicos líderes do G20 que não teve reuniões previstas com outros mandatários, à exceção do presidente italiano Sergio Matarella, anfitrião do evento, que é obrigado, pelo protocolo, a se encontrar com todos os líderes presentes em Roma.

Infelizmente nossa diplomacia se limita a apenas um órgão que congrega pessoas a se movimentarem na área internacional sem ser um instrumento criativo destinado a abrir horizontes para o país, apesar de nossas inevitáveis vicissitudes e contradições internas. Daí o nosso isolamento.

Segundo o pesquisador da Universidade de São Paulo-USP, Kai Enno Lehman, de São Paulo, o Brasil está isolado mundialmente, todos esperando as eleições presidenciais do próximo ano. Até lá, as mudanças começarão pela Europa, com as eleições alemãs e francesas. Com a saída de Angela Merkel, o novo governo alemão chega com muito menos experiência, com a França tentando ocupar esse espaço para tomar uma postura mais forte dentro da União Europeia.

Até lá, vamos seguindo sem rumo. Veja-se, por exemplo, o que disse o ministro Paulo Guedes há poucas semanas atrás. Segundo ele, o dólar só chegaria à casa dos 5 reais “se o governo fizesse muita besteira”. Hoje, o dólar ultrapassou esse valor e já chegou a bater 6 reais. Isso significa que ele fez besteira. Nossa longa madrugada ainda vai nos causar grandes surpresas, desesperança e a grande dificuldade de ver o sol brilhar novamente.

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.


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