Brasil, História da República (I) | Por Luiz Holanda  

Afonso Celso de Assis Figueiredo, visconde de Ouro Preto (1836 — 1912).
Afonso Celso de Assis Figueiredo, visconde de Ouro Preto (1836 — 1912).

O ano era 1889. Após seis dias de debates, a Câmara do Império foi dissolvida pelo imperador no final de junho. O visconde de Ouro Preto apresentara algumas medidas para a aprovação da Câmara, mas esta, que já se encaminhava para a derrubada da monarquia, não aprovou nenhuma. Nova sessão foi marcada para novembro. Na época, alguns adeptos da República como Quintino Bocaiúva, Francisco Glicério, Benjamim Constant e outros trabalhavam pela implantação do novo regime.

Entre as propostas de Ouro Preto estavam a ampliação do direito de voto, aumento do número de deputados, liberdade de culto, de ensino e de reunião. Essas ideias já vinham sendo defendidas pelos republicanos. Em maio, Quintino Bocaiúva, líder da oposição, pregara que “a nação brasileira (…) tem demonstrado sua firme intenção de repelir energicamente a hipótese de um terceiro reinado”.

Nossa monarquia surgiu com a fuga da família real para o Brasil. Primeiro na Bahia, depois no Rio de Janeiro. Nesta última, o príncipe regente, D. João, estabeleceu as bases do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, o que resultou, com a proclamação da independência, a permanência de D. Pedro I como imperador do Brasil.

Sem a monarquia não teríamos a integridade do nosso território: o Brasil seria dividido em diversas repúblicas, como aconteceu em toda a América Latina. Mas que a República era uma fatalidade histórica, disso ninguém tinha dúvida. Todas as nações do continente se tornaram repúblicas depois da independência. O Brasil não seria diferente. Três grandes questões contribuíram para agilizá-la: a Abolição, a Questão Religiosa e a Questão Militar.

A Abolição aboliu a escravidão, gerando protesto entre os produtores rurais, pois a mão-de-obra escrava impulsionava a economia. A Questão Religiosa envolvia a punição de vários bispos, abalando as relações da Igreja com a monarquia. Já a Questão Militar, foi decisiva para a mudança de regime, nascendo de um assunto de economia interna do Exército referente a soldos e pensões.

Sem os militares, a República não teria sido proclamada. Na madrugada de 15 de novembro, vários grupos de militares da oposição se concentraram em frente ao Ministério do Exército, no Rio de Janeiro, onde estava reunido o gabinete do governo imperial. Foi nesse local que o Marechal Deodoro da Fonseca proclamou a República. A monarquia, que durou, precisamente, sessenta e sete anos, se extinguiu. Deodoro, doente, fora retirado da cama no meio da noite por amigos para comandar o cerco ao ministério.

A fraca resistência de Ouro Preto não impediu o golpe. Sua última tentativa foi junto ao general Floriano Peixoto, pedindo para resistir. Este, que apoiava a mudança, simplesmente respondeu: “Os galões que possuo, Exa., foram ganhos nos campos de batalha e não por serviços prestados aos ministros”. Neste momento, Deodoro adentrou no recinto onde o gabinete imperial estava reunido e foi logo dizendo: “Os demais estão livres, mas os senhores dois (Ouro Preto e Cândido de Oliveira, ministro da Justiça) estão presos e serão deportados para a Europa. V. Exa., sr. Ministro, é homem teimosíssimo, mas não tanto quanto eu”.

A última noite da monarquia foi de completa calma nas ruas do Rio de Janeiro. Antes, os acontecimentos mais comentados eram o milagre do Padre Cicero, em Juazeiro do Norte, quando, em março, ao distribuir a comunhão aos fiéis, uma hóstia recebida pela beata Maria de Araújo tingiu-se de vermelho: “É o sangue de Cristo”. O outro foi a morte do empresário Irineu Evangelista da Silva, Visconde de Mauá, em outubro, autor da primeira ferrovia do Brasil, do estaleiro da Ponta da Areia, em Niterói, da Cia. de Iluminação a Gás do Rio de Janeiro e de outros empreendimentos.

Mas o que fervilhava mesmo era a agitação dos militares nos quartéis. Veterano servidor do Império, Deodoro, ao aceitar o comando do golpe, afirmou que “queria acompanhar o caixão do imperador, que está idoso e a quem respeito muito, mas ele já não governa, não há mais o que esperar da monarquia”. Nesse mesmo dia, 15 de novembro, foi formado o governo provisório. O primeiro decreto proclamado sob o novo regime assim determinava: “Fica proclamada provisoriamente e decretada, como forma de governo da nação brasileira, a República Federativa”. E foi assim que essa infeliz nasceu.

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.


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