Alegria de Sobreviver | Por Esperidião Amin

Senador Esperidião Amin (PP-SC), Joaci Góes, Carlos Augusto, Baltazar Miranda Saraiva e o artigo original ‘Alegria de Sobreviver’. O encontro e a história sobre a republicação do texto de autoria do ex-governador sulista.
Senador Esperidião Amin (PP-SC), Joaci Góes, Carlos Augusto, Baltazar Miranda Saraiva e o artigo original ‘Alegria de Sobreviver’. O encontro e a história sobre a republicação do texto de autoria do ex-governador sulista. Em pronunciamento, à bancada, senador Esperidião Amin (PP-SC). Foto: Pedro França/Agência Senado

Sim, já os conhecia. Acima da razão, o olhar de Cristo, sem cobiça, e pronto a recolher o menor gesto de fraternidade e amizade.

Em 1974, tive a oportunidade de conhecê-los de perto durante uma inundação que atingiu bairros da Capital do Piauí, alagando vastas porções dos respectivos vales. Por ironia, em Parnaíba, fui “agraciado” com uma hepatite.

Mas, desta vez, com a visão mais voltada para tal ângulo, pude observar melhor. Euclides da Cunha tinha razão: “O sertanejo é, antes de tudo, um forte”. É preciso que todo nordestino seja um forte. Resistir, enfim, sobreviver em meio a tantas dificuldades não é fácil.

Disto poderia resultar predisposição para o desalento, para tristeza. Mas, que impressionante lição nos dá aquela gente, especialmente as crianças. Tenho gravada a visão da velhinha em Morpará (interior da Bahia), dedos impressionantemente ágeis trabalhando os bilros:

“- O que a senhora está fazendo? – perguntamos. – A minha mortalha. Quem não morre de moça, de velha não escapa. E eu vou ser enterrada bonita, mortalha puxando para azul claro.”

A criançada ao redor, de olhos prestos, alegres. Uma das freiras complementava:

“- Já cadastramos mais de 800 crianças. Não se sabe de onde vêm tantas. Aqui, criança não fica abandonada. Os vizinhos, parentes ou não, não deixam. E o padrinho tem noção da grande responsabilidade assumida.”

Pensei logo na afilhada que o acaso e a sugestão do padre Besen me presentearam em Oliveira dos Brejinhos.

No olhar de todos, mas principalmente no olhar das crianças, a alegria de sobreviver. Pensarão os príncipes da objetividade que aquilo não é alegria; é ignorância, conformismo, desnutrição, submissão à dominação virtualmente feudal. É claro que têm um pouco de razão (e sobre a questão social do Nordeste, todos devemos refletir). Mas, acima da razão, o olhar de Cristo. Olhar despojado de cobiça, simples, alegre, pronto a recolher do menor gesto de respeito ou de fraternidade o motivo para reconhecer um amigo.

Que bom seria se um pouco da simplicidade, algo do despojamento que vi naqueles olhos pudessem se instalar nas cabeças dos que podem fazer, dos que podem dar. Por ironia, a disposição para partilhar, a propensão à fraternidade é mais fácil para os pequenos.

Lá no Nordeste, sem a produção dramática que a televisão promove, existe uma grande lição para quem queira ou possa recolher:

— Antes da sofisticação na busca de uma melhor qualidade de vida, antes do sofrimento por ter (que escraviza o dono à sua propriedade), existe a alegria simples, pura, quase como a dos lírios do campo – a alegria de sobreviver.

*Esperidião Amin Helou Filho, ex-governador de Santa Catarina e senador da República.

*O artigo foi publicado originalmente no Diário Catarinense, em 3 de abril de 1987, uma sexta-feira.

O encontro em Guarajuba 

O que motivou a republicação do artigo quase quatro décadas após a veiculação original?

No domingo (04/02/2024), uma reunião marcante aconteceu em Guarajuba, Camaçari, na residência de Joaci Góes. O encontro contou com a presença de notáveis como Baltazar Miranda Saraiva, desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) e presidente da Sociedade dos Amigos da Marinha de Salvador (SOAMAR Salvador), além de Carlos Augusto, diretor e editor do Jornal Grande Bahia. O destaque da reunião foi o agradável diálogo telefônico com o senador Esperidião Amin (PP), que compartilhou suas experiências ao visitar a Bahia, especialmente as ocorridas nos municípios de Oliveira dos Brejinhos e Morpará. Segundo Amin, a repercussão da visita causou ciúmes em Antônio Carlos Peixoto de Magalhães (ACM †1927 — ★2007), à época, principal liderança de direita da Bahia.

O município de Oliveira dos Brejinho

Oliveira dos Brejinhos, município situado nas alturas da Bahia, ergue-se como testemunha de uma rica história que remonta ao século XVII. Inicialmente formado como arraial de Brejos por colonos portugueses, conhecidos como “brejeiros”, o local superou epidemias e estagnação, florescendo no século XIX com a chegada de novas famílias luso-brasileiras. A prosperidade econômica veio com o comércio e, em 1865, o capitão José Manuel Teixeira Leite conduziu a mudança para Brejo Grande de Oliveira, culminando, em 1891, na elevação a vila e criação do município de Oliveira dos Brejinhos. Além de sua rica história, destaca-se na economia local a produção minerária de quartzo e mármore imperial, exportados para a Europa.

O município de Morpará

Morpará, município que hoje se destaca à margem do Rio São Francisco, tem raízes entrelaçadas com a diversidade cultural dos povos indígenas Acroás, Mocoazes, Tupiniquins, Xacriabás, Caiapós, Cariris e Aricobés. Sua história contemporânea, marcada pela ocupação em 1812 por um vaqueiro da Fazenda Picada, revela o surgimento de um povoado que se tornaria ponto vital de ancoragem de navios a vapor, denominado Porto do Vapor. Originando-se nas fazendas Poço de Gado, Ema e Picadas, Morpará teve seus primeiros passos como Rancho Velho, um aglomerado de pescadores que utilizavam palhas de carnaúba para cobrir seus ranchos. Em 1891, o fazendeiro Antônio Bitencourt Mariani deu início à venda de glebas, atraindo comerciantes e moldando o caminho para a emancipação municipal em 1962, consolidando Morpará como um ponto de convergência histórica na região.


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