A crise iminente na indústria do chocolate torna-se cada vez mais evidente com a queda persistente na produção de cacau. Este fenômeno, agora em seu terceiro ano consecutivo, está gerando um desequilíbrio significativo entre oferta e demanda, levando os preços a alcançarem níveis não vistos em décadas. Sob o olhar de Jabier Blas, colunista da Bloomberg, são avaliadas as raízes desse problema e implicações abrangentes para produtores, consumidores e a economia global.
O mercado global do cacau
Diferentemente de outras commodities agrícolas, o cacau não evoluiu para grandes plantações devido à sua inviabilidade econômica nas décadas passadas. O dinheiro estava na negociação e processamento dos grãos, não na sua produção primária. Contudo, a crescente demanda por chocolate aliada à subinvestimento crônico resultou em um desequilíbrio sem precedentes entre oferta e consumo.
A indústria do chocolate, outrora marcada por preços estáveis, agora enfrenta uma tempestade iminente. O custo do cacau em Nova York ultrapassou US$ 5.500 por tonelada, quebrando um recorde de 46 anos. Especulações fervem na indústria, prevendo um aumento ainda mais drástico para US$ 10.000 por tonelada, embora incerto.
A crise, entretanto, tem raízes profundas na África Ocidental, lar de quatro países responsáveis por quase 75% da produção mundial de cacau. Principalmente, a Costa do Marfim, sob a liderança de Félix Houphouët-Boigny, transformou-se em um gigante produtor sob uma economia orientada para o cacau. No entanto, os preços baixos resultaram em décadas de subinvestimento, com árvores envelhecidas e produtividade em declínio.
O desafio atual é complexo: a demanda excede a produção, e os estoques diminuem. Governos como o da Costa do Marfim controlam rigidamente os mercados, estabelecendo preços oficiais que desfavorecem os agricultores. Esta temporada, os agricultores enfrentam preços 70% abaixo do atacado, refletindo a desconexão entre oferta e demanda.
As soluções são elusivas. A necessidade de preços mais altos para incentivar o replantio e cuidar das árvores atuais é evidente. Porém, isso pode impactar as margens do setor e desacelerar o crescimento da demanda por chocolate.
À medida que a indústria do chocolate se ajusta a essa nova realidade, espera-se um reequilíbrio nos próximos anos, mas não sem custos. Todos os envolvidos – produtores, consumidores e empresas – devem se preparar para um período de preços mais altos e incertezas.
Confira dados apresentados por Jabier Blas no artigo ‘Por que a indústria de chocolate está prestes a enfrentar uma crise inevitável’
-
Produção de Cacau
- Queda da produção pelo terceiro ano consecutivo.
- Consumo global em 2023-24 excedeu a produção pela terceira safra consecutiva.
- Demanda global dobrada nos últimos 30 anos.
- Quatro países na África Ocidental produzem quase 75% do cacau mundial (Costa do Marfim, Gana, Camarões e Nigéria).
-
Preços do Cacau
- Custo do cacau em Nova York ultrapassou US$ 5.500 por tonelada.
- Preço do cacau atingiu o maior nível desde os anos 1970.
- Especulações sobre preços dobrarem para US$ 10.000 por tonelada.
- Preços eram de US$ 2.500 há um ano e US$ 650 em 2000.
-
Situação na África Ocidental
- Agricultores marfinenses recebendo 70% menos do preço de atacado atual.
- Déficit projetado de 300.000 a 500.000 toneladas para a safra 2023-24, o maior em pelo menos 65 anos.
- Última onda de plantio de árvores ocorreu nos anos 2000, resultando em árvores antigas e menor rendimento.
- Mercados locais controlados rigorosamente por governos, estabelecendo preços oficiais.
-
Estoques de Cacau
- Estoques caindo pelo terceiro ano consecutivo.
- Estoques de cacau, medidos pela relação estoque-consumo, poderiam cair para tão pouco quanto 25%, comparável aos mínimos recordes dos anos 1970.
- Atrasos no transporte marítimo levando a uma indústria operando praticamente sem estoque.
-
Impacto na Indústria do Chocolate
- CEO da Hershey, Michele Buck, alertou sobre a necessidade de usar todas as ferramentas disponíveis para gerenciar o negócio diante dos preços recordes do cacau.
- Possibilidade de aumento de preços e inflação na ponta final da cadeia de abastecimento.
- Consumidores podem enfrentar preços mais altos.
- Dificuldade em repassar todos os custos mais altos para os consumidores pode resultar em margens mais baixas.
-
Perspectivas Futuras e Desafios
- Necessidade de preços mais altos para incentivar o replantio de árvores velhas.
- Crescimento da demanda por chocolate pode diminuir ou até reverter.
- Soluções para o desequilíbrio entre oferta e demanda são elusivas.
- Mudanças climáticas podem representar uma desvantagem adicional para o setor de cacau nos próximos anos.
Relação dos 10 países que mais produzem cacau no mundo
-
Costa do Marfim
- Produção: 2.200.000 toneladas/ano
- Participação na produção global: 38%
- Localização: Litoral ocidental do continente africano
-
Gana
- Produção: 800.000 toneladas/ano
- Participação nas exportações: 1/3 das exportações do país
- Localização: Vizinho da Costa do Marfim, na África Ocidental
-
Indonésia:
- Produção: 739.483 toneladas/ano
- Localização: Sudeste asiático
-
Nigéria
- Produção: 340.163 toneladas/ano
- Importância: Principal produto de exportação agrícola do país
- Localização: África Ocidental, próxima a Gana e Costa do Marfim
-
Equador
- Produção: 327.903 toneladas/ano
- Participação na produção global: 4%
- Característica: Responsável por 70% do cacau fino aromático
-
Camarões
- Produção: 290.000 toneladas/ano
- Impacto: Suporte a mais de 600.000 produtores de cacau
- Localização: África, faz fronteira com Nigéria
-
Brasil
- Produção: 269.732 toneladas/ano
- Desafios: Queda na produção devido a razões econômicas e à vassoura-de-bruxa
- Característica: Berço do cacau, lar da maior parte da floresta amazônica
-
Serra Leoa
- Produção: 193.156 toneladas/ano
- Tendência: Crescimento da importância na produção de cacau
- Localização: África
-
Peru
- Produção: 160.289 toneladas/ano
- Destaque: Segundo maior produtor de cacau orgânico do mundo
- Característica: Possui trechos de floresta amazônica
-
República Dominicana
- Produção: 77.681 toneladas/ano
- Destaque: Produção de cacau orgânico e de grãos finos
- Localização: Caribe
Entre os principais produtores de cacau no mundo o destaque a predominância dos países africanos, especialmente Costa do Marfim e Gana, seguidos por nações asiáticas e sul-americanas, como Indonésia, Equador e Brasil.
Bahia e Pará lideram produção nacional
Nesta segunda-feira (19/02/2024), a arroba do cacau, equivalente a um saco das amêndoas com 15 quilos, está precificada em R$ 415,00 na Bahia, com custo de R$ 27,70 por quilo. A estado é o segundo maior produtor de cacau do Brasil.
No universo do cacau, os cerca de 90 mil produtores agrícolas do Brasil assumem papel de destaque global, colocando o país como sexto maior produtor mundial. Essa posição é impulsionada principalmente pelos estados do Pará e Bahia, que juntos respondem por impressionantes 95% da produção nacional.
Em 2020, o Pará liderou com 128,9 mil toneladas, seguido pela Bahia com 113 mil toneladas. A grandiosidade se reflete em uma extensa área de cultivo de 700 mil hectares, com a região Norte se destacando ao contribuir com mais da metade da produção nacional.
A Bahia, única representante do Nordeste, reforça o protagonismo do Brasil no mercado global de cacau.
Principais estados produtores e participação percentual na produção nacional de cacau no Brasil
De acordo com os dados de 2023, os principais estados produtores de no Brasil, a produção e o percentual na produção nacional são:
| Estado | Produção (toneladas) | Percentual (%) |
|---|---|---|
| Pará | 149.000 | 53,2 |
| Bahia | 111.400 | 39,8 |
| Rondônia | 3.000 | 1,1 |
| Espírito Santo | 2.000 | 0,7 |
| Amazonas | 1.500 | 0,5 |
| Mato Grosso | 1.000 | 0,4 |
| Outros | 2.100 | 0,8 |
| Total | 280.000 toneladas (dados de 2023) | 100 |
*Jabier Blas é colunista da Bloomberg Opinion e cobre energia e commodities. Ele É coautor de “The World for Sale: Money, Power and the Traders Who Barter the Earth’s Resources”.
Share this:
- Click to print (Opens in new window) Print
- Click to email a link to a friend (Opens in new window) Email
- Click to share on X (Opens in new window) X
- Click to share on LinkedIn (Opens in new window) LinkedIn
- Click to share on Facebook (Opens in new window) Facebook
- Click to share on WhatsApp (Opens in new window) WhatsApp
- Click to share on Telegram (Opens in new window) Telegram
Relacionado
Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)
Subscribe to get the latest posts sent to your email.




