Os motivos que elevaram o preço da arroba do cacau para patamar dos anos de 1970

A queda na produção de cacau pelo terceiro ano consecutivo pressiona os estoques e impulsiona os preços a níveis não vistos desde os anos 1970.
A queda contínua observada nos últimos três de produção do cacau coloca a indústria do chocolate à beira de uma crise iminente, elevando os preços da arroba a níveis não vistos desde os anos 1970. A situação é positiva para os produtores agrícolas que foram afetados nas últimas décadas pelos preços baixos do commodity. Eles podem recompor a capacidade financeira nos próximos três anos e retomar investimentos.

A crise iminente na indústria do chocolate torna-se cada vez mais evidente com a queda persistente na produção de cacau. Este fenômeno, agora em seu terceiro ano consecutivo, está gerando um desequilíbrio significativo entre oferta e demanda, levando os preços a alcançarem níveis não vistos em décadas. Sob o olhar de Jabier Blas, colunista da Bloomberg, são avaliadas as raízes desse problema e implicações abrangentes para produtores, consumidores e a economia global.

O mercado global do cacau

Diferentemente de outras commodities agrícolas, o cacau não evoluiu para grandes plantações devido à sua inviabilidade econômica nas décadas passadas. O dinheiro estava na negociação e processamento dos grãos, não na sua produção primária. Contudo, a crescente demanda por chocolate aliada à subinvestimento crônico resultou em um desequilíbrio sem precedentes entre oferta e consumo.

A indústria do chocolate, outrora marcada por preços estáveis, agora enfrenta uma tempestade iminente. O custo do cacau em Nova York ultrapassou US$ 5.500 por tonelada, quebrando um recorde de 46 anos. Especulações fervem na indústria, prevendo um aumento ainda mais drástico para US$ 10.000 por tonelada, embora incerto.

A crise, entretanto, tem raízes profundas na África Ocidental, lar de quatro países responsáveis por quase 75% da produção mundial de cacau. Principalmente, a Costa do Marfim, sob a liderança de Félix Houphouët-Boigny, transformou-se em um gigante produtor sob uma economia orientada para o cacau. No entanto, os preços baixos resultaram em décadas de subinvestimento, com árvores envelhecidas e produtividade em declínio.

O desafio atual é complexo: a demanda excede a produção, e os estoques diminuem. Governos como o da Costa do Marfim controlam rigidamente os mercados, estabelecendo preços oficiais que desfavorecem os agricultores. Esta temporada, os agricultores enfrentam preços 70% abaixo do atacado, refletindo a desconexão entre oferta e demanda.

As soluções são elusivas. A necessidade de preços mais altos para incentivar o replantio e cuidar das árvores atuais é evidente. Porém, isso pode impactar as margens do setor e desacelerar o crescimento da demanda por chocolate.

À medida que a indústria do chocolate se ajusta a essa nova realidade, espera-se um reequilíbrio nos próximos anos, mas não sem custos. Todos os envolvidos – produtores, consumidores e empresas – devem se preparar para um período de preços mais altos e incertezas.

Confira dados apresentados por Jabier Blas  no artigo ‘Por que a indústria de chocolate está prestes a enfrentar uma crise inevitável’

  1. Produção de Cacau

    • Queda da produção pelo terceiro ano consecutivo.
    • Consumo global em 2023-24 excedeu a produção pela terceira safra consecutiva.
    • Demanda global dobrada nos últimos 30 anos.
    • Quatro países na África Ocidental produzem quase 75% do cacau mundial (Costa do Marfim, Gana, Camarões e Nigéria).
  2. Preços do Cacau

    • Custo do cacau em Nova York ultrapassou US$ 5.500 por tonelada.
    • Preço do cacau atingiu o maior nível desde os anos 1970.
    • Especulações sobre preços dobrarem para US$ 10.000 por tonelada.
    • Preços eram de US$ 2.500 há um ano e US$ 650 em 2000.
  3. Situação na África Ocidental

    • Agricultores marfinenses recebendo 70% menos do preço de atacado atual.
    • Déficit projetado de 300.000 a 500.000 toneladas para a safra 2023-24, o maior em pelo menos 65 anos.
    • Última onda de plantio de árvores ocorreu nos anos 2000, resultando em árvores antigas e menor rendimento.
    • Mercados locais controlados rigorosamente por governos, estabelecendo preços oficiais.
  4. Estoques de Cacau

    • Estoques caindo pelo terceiro ano consecutivo.
    • Estoques de cacau, medidos pela relação estoque-consumo, poderiam cair para tão pouco quanto 25%, comparável aos mínimos recordes dos anos 1970.
    • Atrasos no transporte marítimo levando a uma indústria operando praticamente sem estoque.
  5. Impacto na Indústria do Chocolate

    • CEO da Hershey, Michele Buck, alertou sobre a necessidade de usar todas as ferramentas disponíveis para gerenciar o negócio diante dos preços recordes do cacau.
    • Possibilidade de aumento de preços e inflação na ponta final da cadeia de abastecimento.
    • Consumidores podem enfrentar preços mais altos.
    • Dificuldade em repassar todos os custos mais altos para os consumidores pode resultar em margens mais baixas.
  6. Perspectivas Futuras e Desafios

    • Necessidade de preços mais altos para incentivar o replantio de árvores velhas.
    • Crescimento da demanda por chocolate pode diminuir ou até reverter.
    • Soluções para o desequilíbrio entre oferta e demanda são elusivas.
    • Mudanças climáticas podem representar uma desvantagem adicional para o setor de cacau nos próximos anos.

Relação dos 10 países que mais produzem cacau no mundo

  1. Costa do Marfim

    • Produção: 2.200.000 toneladas/ano
    • Participação na produção global: 38%
    • Localização: Litoral ocidental do continente africano
  2. Gana

    • Produção: 800.000 toneladas/ano
    • Participação nas exportações: 1/3 das exportações do país
    • Localização: Vizinho da Costa do Marfim, na África Ocidental
  3. Indonésia:

    • Produção: 739.483 toneladas/ano
    • Localização: Sudeste asiático
  4. Nigéria

    • Produção: 340.163 toneladas/ano
    • Importância: Principal produto de exportação agrícola do país
    • Localização: África Ocidental, próxima a Gana e Costa do Marfim
  5. Equador

    • Produção: 327.903 toneladas/ano
    • Participação na produção global: 4%
    • Característica: Responsável por 70% do cacau fino aromático
  6. Camarões

    • Produção: 290.000 toneladas/ano
    • Impacto: Suporte a mais de 600.000 produtores de cacau
    • Localização: África, faz fronteira com Nigéria
  7. Brasil

    • Produção: 269.732 toneladas/ano
    • Desafios: Queda na produção devido a razões econômicas e à vassoura-de-bruxa
    • Característica: Berço do cacau, lar da maior parte da floresta amazônica
  8. Serra Leoa

    • Produção: 193.156 toneladas/ano
    • Tendência: Crescimento da importância na produção de cacau
    • Localização: África
  9. Peru

    • Produção: 160.289 toneladas/ano
    • Destaque: Segundo maior produtor de cacau orgânico do mundo
    • Característica: Possui trechos de floresta amazônica
  10. República Dominicana

    • Produção: 77.681 toneladas/ano
    • Destaque: Produção de cacau orgânico e de grãos finos
    • Localização: Caribe

Entre os principais produtores de cacau no mundo o destaque a predominância dos países africanos, especialmente Costa do Marfim e Gana, seguidos por nações asiáticas e sul-americanas, como Indonésia, Equador e Brasil.

Bahia e Pará lideram produção nacional

Nesta segunda-feira (19/02/2024), a arroba do cacau, equivalente a um saco das amêndoas com 15 quilos, está precificada em R$ 415,00 na Bahia, com custo de R$ 27,70 por quilo. A estado é o segundo maior produtor de cacau do Brasil.

No universo do cacau, os cerca de 90 mil produtores agrícolas do Brasil assumem papel de destaque global, colocando o país como sexto maior produtor mundial. Essa posição é impulsionada principalmente pelos estados do Pará e Bahia, que juntos respondem por impressionantes 95% da produção nacional.

Em 2020, o Pará liderou com 128,9 mil toneladas, seguido pela Bahia com 113 mil toneladas. A grandiosidade se reflete em uma extensa área de cultivo de 700 mil hectares, com a região Norte se destacando ao contribuir com mais da metade da produção nacional.

A Bahia, única representante do Nordeste, reforça o protagonismo do Brasil no mercado global de cacau.

Principais estados produtores e participação percentual na produção nacional de cacau no Brasil

De acordo com os dados de 2023, os principais estados produtores de no Brasil, a produção e o percentual na produção nacional são:

Estado Produção (toneladas) Percentual (%)
Pará 149.000 53,2
Bahia 111.400 39,8
Rondônia 3.000 1,1
Espírito Santo 2.000 0,7
Amazonas 1.500 0,5
Mato Grosso 1.000 0,4
Outros 2.100 0,8
Total 280.000 toneladas (dados de 2023) 100

*Jabier Blas é colunista da Bloomberg Opinion e cobre energia e commodities. Ele É coautor de “The World for Sale: Money, Power and the Traders Who Barter the Earth’s Resources”.


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