A recente divulgação dos dados do Tesouro Nacional revelou que a Dívida Pública Federal (DPF) do Brasil alcançou a marca de R$ 7,67 trilhões em junho de 2024. Esse valor representa um aumento de 2,25% em relação ao mês anterior e reflete as complexas escolhas econômicas do governo brasileiro. Em um contexto de desafios econômicos globais, a dívida pública do Brasil é um dos principais temas de debate entre economistas, políticos e a sociedade civil.
Apesar do crescimento da dívida, o Brasil ainda se encontra em uma posição muito mais favorável em comparação com outras grandes economias. Nos Estados Unidos, por exemplo, a dívida pública totaliza US$ 36,3 trilhões, ou cerca de R$ 181,5 trilhões, um montante quase 30 vezes superior ao brasileiro. No entanto, as condições econômicas e as políticas fiscais adotadas pelos dois países diferem substancialmente, levando a questionamentos sobre as opções políticas do Brasil.
Luiz Felipe Osório, professor de relações internacionais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), enfatiza que a posição dos Estados Unidos como emissor da moeda de reserva mundial, o dólar, lhes confere uma vantagem significativa.
“Desde os Acordos de Bretton Woods, em 1944, o dólar se estabeleceu como a principal moeda global, o que permite aos Estados Unidos expandir seu endividamento sem as mesmas restrições enfrentadas por outros países. O Brasil, por outro lado, não possui essa condição, ficando vulnerável às oscilações da economia internacional e aos custos de transacionar em outra moeda”, afirma Osório.
Essa vulnerabilidade do Brasil, segundo o professor, expõe o país às flutuações do mercado internacional, afetando a capacidade de controlar sua própria economia. Ele argumenta que o endividamento poderia ser uma ferramenta para alavancar o crescimento econômico, mas que, no cenário brasileiro, a austeridade fiscal se torna uma escolha política que limita o uso dessa ferramenta.
“A austeridade, de acordo com o internacionalista, é uma escolha política, não técnica. O endividamento pode ser uma ferramenta para expandir as possibilidades de crescimento nacional, mas no Brasil, as políticas adotadas têm restringido essa utilização”, conclui.
Austeridade e Restrições Econômicas
Fábio Sobral, professor de economia e economia ecológica da Universidade Federal do Ceará (UFC), compartilha uma visão crítica sobre a situação da dívida pública no Brasil. Segundo Sobral, o governo brasileiro tem sido progressivamente amarrado por mecanismos institucionais que impedem o uso dos recursos gerados pelo próprio Estado, forçando-o a buscar financiamento no mercado internacional para suas atividades correntes.
“O primeiro mecanismo é que a reserva líquida do Tesouro Nacional não pode ser usada, a não ser para quitar dívida. Isso significa que, mesmo que o governo arrecade e preencha sua reserva líquida, esses recursos são destinados exclusivamente ao pagamento da dívida, deixando a administração pública sem meios para investir em áreas essenciais como educação, saúde, cultura e meio ambiente”, explica Sobral.
Além disso, Sobral destaca um segundo obstáculo: as reservas cambiais.
“Tudo o que o Brasil exporta, menos o que ele importa, gera um saldo da balança comercial em moeda estrangeira, geralmente dólares. Esses dólares compõem as reservas cambiais do Brasil, e essas reservas cambiais também, por lei, não podem ser usadas em nenhum centavo na manutenção da atividade estatal estratégica e corrente”, acrescenta o economista.
Assim, mesmo as reservas cambiais do país, que poderiam aliviar a necessidade de endividamento, são intocáveis para fins que não sejam o pagamento de dívidas.
Esse cenário, segundo Sobral, cria uma espiral insustentável de endividamento.
“O financiamento da dívida pública passada, ou seja, o pagamento de juros e do principal, tende a crescer porque ela é, de fato, insustentável, principalmente com essa taxa de juros”, alerta.
Ele explica que os juros aumentam mais rapidamente do que a capacidade de pagamento do governo, exacerbando o problema.
“Essa é uma armadilha que o Brasil tem enfrentado: os recursos arrecadados não são usados para o desenvolvimento interno, mas sim para alimentar uma estrutura financeira que se mostra cada vez mais onerosa para o Estado e a população”, afirma Sobral.
Impactos Sociais e Econômicos
As políticas de austeridade adotadas pelo governo brasileiro têm gerado consequências diretas na vida dos cidadãos. Luiz Felipe Osório argumenta que a destinação de uma parte significativa do orçamento público para o pagamento de juros da dívida limita a capacidade do Estado de investir em setores cruciais para o desenvolvimento social.
“O que é inadmissível é que, em uma economia com restrições externas — como a condição periférica e a não emissão da moeda internacional —, se direcione mais da metade do orçamento público para quitar os juros da dívida, deixando as necessidades sociais à míngua, considerando toda a desigualdade que constitui a formação socioeconômica brasileira”, critica Osório.
Essa política de austeridade, segundo os analistas, tem contribuído para o aumento da desigualdade e para a estagnação do crescimento econômico no Brasil.
“Naturalmente, essa política afeta o cotidiano das pessoas não apenas no preço das mercadorias e no consequente aumento no custo de vida, mas mantendo o PIB em projeções muito minúsculas de crescimento, quando não de estagnação ou decréscimo, como se verifica nos últimos anos”, detalha Osório.
Ele ressalta que o impacto na vida do cidadão comum é direto:
“O cidadão comum paga impostos, paga tributos. Esses tributos são arrecadados pelas três esferas — federal, estaduais e municipais —, mas acabam sendo destinados ao pagamento de dívida com juros altíssimos, em vez de serem usados para melhorar os serviços públicos”.
As consequências desse cenário são percebidas no dia a dia da população, com serviços públicos sobrecarregados, infraestrutura deficiente e a incapacidade do Estado de investir em áreas estratégicas para o desenvolvimento nacional.
“A opção política pela austeridade é uma forma de sabotagem do crescimento nacional, retirando do Estado qualquer poder de ingerência e deixando ao sabor e dissabor da iniciativa privada, à qual se preocupa exclusivamente com seu lucro”, conclui Osório.
O resultado na concentração de renda
Em síntese, as elites no Brasil manipulam a Dívida Pública Federal (DPF) ao influenciar políticas econômicas que priorizam o pagamento de juros elevados a credores, em vez de investimentos sociais e produtivos. Isso é feito através da promoção de políticas de austeridade, que restringem o uso de recursos públicos para áreas essenciais como saúde, educação e infraestrutura. Ao garantir retornos financeiros altos sobre títulos da dívida, as elites aumentam seus lucros, enquanto o Estado se torna dependente de novos empréstimos para financiar suas atividades correntes.
Esse processo favorece a concentração de renda e mantém elevado od nível de desigualdade social, pois os recursos públicos são desviados para pagar juros a uma pequena parcela da população, em vez de serem usados para reduzir a desigualdade. Como resultado, o desenvolvimento econômico do país é retardado, a qualidade de vida da maioria da população é comprometida, e o crescimento econômico sustentável é dificultado, ampliando ainda mais as disparidades sociais.
A análise sobre a Dívida Pública Federal do Brasil (DPF Brasil)
1. Dívida Pública Federal (DPF)
- Valor Atual: R$ 7,67 trilhões (junho de 2024)
- Crescimento Mensal: 2,25% em relação ao mês anterior
- Comparação Internacional:
- Estados Unidos: US$ 36,3 trilhões (aproximadamente R$ 181,5 trilhões)
- Dívida dos EUA é quase 30 vezes maior que a do Brasil
2. Políticas Econômicas
- Brasil:
- Austeridade fiscal como escolha política
- Restrições no uso das reservas do Tesouro Nacional e reservas cambiais
- Foco no pagamento da dívida em detrimento de investimentos sociais
- Estados Unidos:
- Flexibilidade no endividamento devido à emissão do dólar, a principal moeda global
3. Impactos Sociais e Econômicos
- No Brasil:
- Limitação de investimentos em educação, saúde, cultura e infraestrutura
- Aumento do custo de vida e estagnação do Produto Interno Bruto (PIB)
- Desigualdade socioeconômica crescente
- Recursos públicos direcionados ao pagamento de juros, afetando a qualidade dos serviços públicos
- Consequências Diretas:
- Prejuízos para o cidadão comum, com menos acesso a serviços de qualidade
- Impacto na inflação e volatilidade dos preços das mercadorias
4. Análises e Citações
- Luiz Felipe Osório (UFRRJ):
- Destaque para a vulnerabilidade brasileira frente às oscilações internacionais
- Crítica à política de austeridade e sua implicação no crescimento nacional
- Fábio Sobral (UFC):
- Críticas ao sistema que amarra o governo ao endividamento
- Argumenta que as reservas cambiais e do Tesouro são legalmente limitadas para usos internos
- Austeridade contribui para uma “espiral insustentável” de endividamento
5. Contexto Histórico e Internacional
- Acordos de Bretton Woods (1944):
- Estabelecimento do dólar como a principal moeda global, permitindo maior flexibilidade ao endividamento dos EUA
- Globalização (Década de 1990):
- Internacionalização e financeirização da economia brasileira, com maior dependência do mercado externo
*Com informações da Sputnik Brasil.
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