Em 22 de agosto de 2017, a polícia de Cabo Verde, em resposta a uma denúncia anônima, realizou uma inspeção no veleiro Rich Harvest, ancorado no porto da cidade de Mindelo, na Ilha de São Vicente. Durante a fiscalização, as autoridades descobriram mais de uma tonelada de cocaína escondida sob o assoalho da embarcação, em um compartimento camuflado por cimento. A carga ilícita foi avaliada em cerca de 200 milhões de euros (aproximadamente R$ 800 milhões).
A tripulação do Rich Harvest era composta pelo capitão francês Olivier Thomas e pelos brasileiros Rodrigo Dantas, de 25 anos, estudante de engenharia e natural da Bahia; Daniel Dantas, de 43 anos, corretor de imóveis e também baiano; e Daniel Guerra, de 36 anos, gaúcho e formado em relações internacionais. A operação policial resultou na prisão imediata do capitão francês Olivier Thomas e do brasileiro Daniel Guerra. Horas depois, Rodrigo Dantas e Daniel Dantas, que já haviam sido dispensados da embarcação durante a viagem, também foram detidos.
Os brasileiros Guerra e Rodrigo Dantas foram contratados para realizar uma viagem transatlântica a bordo do veleiro, que pertencia ao inglês George Saul, conhecido pelo apelido de “Fox”. A proposta prometia uma experiência enriquecedora e a acumulação de milhas náuticas, um objetivo considerado fundamental para velejadores aspirantes a capitães. No entanto, o que se iniciou como uma jornada promissora culminou na descoberta da substância ilícita e na subsequente prisão dos brasileiros em Cabo Verde.
De oportunidade promissora ao pesadelo da prisão
Em 2017, os velejadores brasileiros Daniel Guerra e Rodrigo Dantas foram recrutados para trabalhar no iate britânico Rich Harvest. A proposta era realizar uma travessia do Brasil à Europa, acumulando experiência profissional em uma das grandes viagens oceânicas. No entanto, o que parecia ser uma oportunidade de sonho resultou em uma prisão por tráfico internacional de drogas, com uma carga de mais de uma tonelada de cocaína escondida na embarcação.
Daniel e Rodrigo encontraram a oferta de emprego em uma agência de recrutamento para velejadores. Embora a proposta não envolvesse pagamento, a oportunidade era tentadora: uma viagem transatlântica com todas as despesas pagas e a chance de acumular milhas e experiência, essenciais para os dois brasileiros que sonhavam em se tornar capitães de embarcações.
George Saul, o dono do Rich Harvest, conhecido pelo apelido de “Fox”, conquistou a confiança dos tripulantes e das famílias com seu comportamento afável e amigável. Os pais de Rodrigo, preocupados com a segurança da viagem, insistiram em conhecer Fox, e sua aprovação parecia confirmar que tudo estava em ordem.
A Viagem e a Primeira Busca
A partida do Rich Harvest ocorreu em agosto de 2017, após uma verificação da polícia no último porto no Brasil, em Natal. A busca, que incluiu o uso de cães farejadores, não encontrou nada suspeito, e a tripulação, aliviada, seguiu viagem. Daniel e Rodrigo acreditavam que a inspeção era parte dos procedimentos rotineiros de controle aduaneiro, comuns em travessias internacionais.
A primeira parte da viagem transcorreu sem grandes incidentes, até que problemas no motor forçaram o iate a parar em Cabo Verde, onde uma nova busca seria realizada – dessa vez, com um resultado inesperado.
A Descoberta da Droga e a Prisão
Quando as autoridades cabo-verdianas revistaram o Rich Harvest, uma inspeção mais detalhada revelou o que a busca anterior no Brasil não havia detectado. Sob compartimentos falsos, a polícia encontrou cerca de 1,2 tonelada de cocaína, avaliada em mais de 600 milhões de reais. A droga estava escondida em fundos secretos, inclusive no quarto de Daniel Guerra, o que aumentou ainda mais o choque do velejador ao descobrir a gravidade da situação.
Tanto Daniel quanto Rodrigo negaram qualquer envolvimento com o tráfico de drogas e alegaram que foram enganados por Fox. No entanto, ambos foram presos e, em 2018, condenados a 10 anos de prisão pelas autoridades de Cabo Verde.
O Papel de George Saul
As investigações da Polícia Federal brasileira, que acompanhava o caso, indicavam que George Saul, o Fox, era o verdadeiro responsável pela operação de tráfico. Acredita-se que as reformas feitas no iate no Brasil tinham como objetivo instalar compartimentos secretos para esconder a droga antes de os velejadores serem contratados. Apesar de a polícia brasileira ter alertado as autoridades cabo-verdianas sobre a possível presença de drogas no barco, Fox conseguiu escapar, voltando para a Europa antes da viagem.
Em 2018, Fox foi preso na Itália, mas a morosidade no processo de extradição levou à sua libertação. Ele retornou ao Reino Unido, onde continuou sua vida normalmente, sem enfrentar um julgamento pelas acusações.
Anulação das Condenações e Retorno ao Brasil
Após intensa campanha das famílias e uma reavaliação judicial, a Justiça de Cabo Verde anulou as condenações de Daniel e Rodrigo em 2019, permitindo que eles retornassem ao Brasil. Contudo, o impacto do período na prisão e as acusações prejudicaram profundamente suas vidas. Ambos abandonaram os sonhos de se tornarem capitães e enfrentaram dificuldades para reintegrar-se ao mercado de trabalho como velejadores, já que potenciais empregadores ainda desconfiavam de sua inocência.
A Vida de Fox Após o Caso
Enquanto os brasileiros lutavam para reconstruir suas vidas, Fox continuava livre no Reino Unido. Empresário e proprietário de uma imobiliária, ele seguiu com suas atividades sem ser julgado pelo caso Rich Harvest. Abordado pela imprensa, ele se recusou a comentar as acusações, afirmando apenas que não era traficante de drogas. Até o momento, o Ministério da Justiça do Brasil não solicitou formalmente sua extradição.
Investigação da BBC revela identidade de George Saul
No contexto das tentativas das famílias e autoridades brasileiras de provar a inocência dos velejadores Daniel Guerra e Rodrigo Dantas, uma investigação conduzida pela BBC, divulgada em 30 de setembro de 2024 em reportagem assinada por Colin Freeman e Cristine Kist, trouxe à luz informações cruciais sobre George Saul, também conhecido como “Fox”.
Saul, proprietário do iate Rich Harvest, foi identificado como o principal responsável por uma operação de tráfico internacional de drogas que resultou na prisão dos brasileiros, inocentes no esquema. A apuração da BBC revelou que ele mantinha ligações com atividades ilícitas e o submundo do crime, desconhecidas pelos velejadores e suas famílias.
O empresário, que atuava no setor imobiliário, teria planejado a ocultação de grandes quantidades de drogas no iate, utilizando compartimentos secretos instalados durante reformas feitas no Brasil. A complexidade do esquema passou despercebida pelos tripulantes brasileiros, que acreditavam participar apenas de uma viagem náutica.
Mesmo após a Polícia Federal brasileira ter alertado as autoridades de Cabo Verde sobre possíveis atividades ilegais envolvendo o Rich Harvest, Saul conseguiu retornar à Europa antes de ser detido. Em 2018, ele foi preso na Itália, mas foi liberado devido a falhas no processo de extradição. Atualmente, ele reside no Reino Unido, onde continua sua vida sem enfrentar as acusações relacionadas ao caso.
As descobertas da investigação da BBC fortaleceram as provas de que os brasileiros foram vítimas de uma trama elaborada por Saul. Essa reviravolta foi essencial para a revisão do caso, resultando na anulação das condenações de Daniel Guerra e Rodrigo Dantas.
Síntese do Caso Rich Harvest
- Ano do Incidente: 2017
- Local de Prisão: Cabo Verde
- Tripulantes Brasileiros: Daniel Guerra e Rodrigo Dantas
- Drogas Encontradas: 1,2 tonelada de cocaína
- Valor Estimado da Droga: R$ 600 milhões
- Condenações Anuladas: 2019
- Principal Acusado: George Saul, também conhecido como “Fox”
- Localização Atual de Fox: Reino Unido
- Ação das Autoridades: Processo de extradição para o Brasil ainda pendente
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