Reportagem de Mateus Coutinho — publicada nesta quinta-feira (09/01/2025) no UOL — revela que a investigação conduzida pela Polícia Federal (PF) apresentou indícios de corrupção, exploração de prestígio e violação de sigilo funcional em 14 processos judiciais no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A operação, autorizada pelo ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal (STF), resultou em 26 de novembro de 2024 na prisão do lobista Andreson Gonçalves e no afastamento de cinco servidores do Tribunal.
Com a finalidade de organizar as reportagens, o Jornal Grande Bahia denominou a investigação judicial como Caso Venditio Sententiae (Venda de Sentença). Ela ganhou projeção nacional após o assassinato do advogado Roberto Zampieri, ocorrido em 2023, em Cuiabá. Ao lado do corpo da vítima, foi encontrado um celular com mais de 9 mil mensagens, revelando um esquema de comercialização de sentenças no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Entre os envolvidos, estavam servidores vinculados aos gabinetes de ministros como Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, Og Fernandes e Moura Ribeiro.
As mensagens apontaram negociações de decisões judiciais que envolviam valores entre R$ 50 mil e R$ 100 mil, pagos em dinheiro e até em barras de ouro. A operação levou ao afastamento de funcionários e à instauração de sindicâncias internas na Corte.
A investigação foi intensificada com a análise conduzida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e os dados extraídos do dispositivo de Zampieri. As sindicâncias internas do STJ também ofereceram informações fundamentais, culminando na identificação de diálogos entre Zampieri e Gonçalves, que revelavam a existência do esquema ilícito praticado com servidores do STJ.
Essa nova linha de apuração evidencia, mais uma vez, a conexão com a Operação Faroeste, após a Polícia Federal levantar suspeitas de possível corrupção envolvendo o Pedido de Busca e Apreensão Criminal (PBAC nº 10/DF) emitido pelo STJ no contexto da referida operação. A suspeita reforçou a tese de irregularidades sistêmicas nos dois Tribunais, ampliando o escopo da investigação e trazendo à tona novas ramificações do esquema.
Os processos sob investigação da PF
Entre os 14 processos investigados pela PF, destacam-se casos de significativa relevância financeira e social. Esses processos abrangem disputas de terras, questões contratuais envolvendo instituições bancárias e ações judiciais de grandes multinacionais. Todos os casos estão vinculados aos gabinetes dos ministros Isabel Gallotti, Nancy Andrighi e Og Fernandes. Embora não existam evidências diretas de envolvimento dos ministros, os processos revelam fragilidades nos mecanismos de controle interno do Tribunal.
Entre os exemplos mais notáveis, destacam-se:
Gabinete da Ministra Isabel Gallotti
- REsp 1.584.111/MT
- Descrição: Disputa de terra entre duas famílias em Mato Grosso.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- REsp 1.829.667/MT
- Descrição: Processo da DuPont do Brasil contra cliente de Zampieri.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- AREsp 538.382/SP
- Descrição: Cliente contra o banco Nossa Caixa.
- Suspeitas: Exploração de prestígio e violação de sigilo funcional.
- AREsp 1.376.384/RS
- Descrição: Cliente contra o banco Santander.
- Suspeitas: Exploração de prestígio e violação de sigilo funcional.
- AREsp 1.714.650/MT
- Descrição: Bradesco contra empresário envolvendo contrato de fazenda em Mato Grosso.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- AREsp 1.553.735/MT
- Descrição: Bradesco contra empresário envolvendo posse de fazenda em Mato Grosso.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- AREsp 1.573.661/MT
- Descrição: Empresa agropecuária de Mato Grosso contra cliente de Zampieri.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- AREsp 1.712.679/MT
- Descrição: Empresa agropecuária de Mato Grosso contra cliente de Zampieri.
- Suspeitas: Violação de sigilo funcional.
Gabinete da Ministra Nancy Andrighi
- AgInt no CC 171.855/MS
- Descrição: Processo envolvendo a J&F.
- Suspeitas: Violação de sigilo funcional.
- CC 178.847/MT
- Descrição: Processo envolvendo agropecuária de Mato Grosso.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- AREsp 1.896.587/MT
- Descrição: Disputa por compra de imóvel entre empresários de Mato Grosso.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- AREsp 2.316.630/MT
- Descrição: Disputa envolvendo empresa de Mato Grosso.
- Suspeitas: Violação de sigilo funcional.
- AREsp 2.336.672/MT
- Descrição: Disputa envolvendo empresa de Mato Grosso.
- Suspeitas: Violação de sigilo funcional.
Gabinete do ministro Og Fernandes
-
- PBAC 10/DF
- Descrição: Processo da Operação Faroeste, relacionado ao esquema de corrupção no Tribunal de Justiça da Bahia.
- Suspeitas: Corrupção e violação de sigilo funcional.
- PBAC 10/DF
Essas suspeitas envolvem possíveis crimes de corrupção ativa e passiva, exploração de prestígio e violação de sigilo funcional. A investigação está em andamento, e não se descarta o possível envolvimento de outros agentes.
O papel de Andreson Gonçalves
Andreson Gonçalves, empresário e lobista, é apontado como peça central do esquema. Ele teria recebido até R$ 250 mil para atuar como intermediário em processos judiciais e compartilhado minutas de decisões antes de serem oficialmente publicadas. Em um dos casos, uma decisão que beneficiava o advogado Zampieri foi enviada por Gonçalves dois dias antes da sentença oficial da ministra Isabel Gallotti.
A PF encontrou, em um notebook apreendido na residência de Gonçalves, documentos confidenciais do STJ, reforçando as suspeitas de violação de sigilo funcional. Sua esposa, Mirian Gonçalves, advogada, também está sob investigação e teve dispositivos eletrônicos apreendidos.
A conexão com multinacionais e instituições financeiras
O escopo da investigação alcançou empresas de grande porte, como DuPont, Bradesco e a holding J&F. Entre os episódios destacados estão:
- DuPont: A empresa recorreu ao STJ após condenação em Mato Grosso, mas o recurso foi rejeitado, conforme previsão de Gonçalves.
- J&F: Envolvimento em uma disputa de R$ 600 milhões com a Eldorado Celulose, na qual Gonçalves teria antecipado a decisão da ministra Nancy Andrighi cinco dias antes do julgamento.
A conexão com a Operação Faroeste
A Operação Faroeste, conduzida pela Polícia Federal (PF) desde 2019, desvendou um sofisticado esquema de venda de sentenças no TJBA, envolvendo desembargadores, juízes, advogados e empresários. A investigação identificou que decisões judiciais eram manipuladas para legitimar a posse de terras no oeste da Bahia, uma das regiões mais disputadas do país devido à sua importância agrícola.
No contexto das apurações, o PBAC 10/DF destacou-se como peça-chave para aprofundar o rastreamento das ramificações do esquema. A suspeita de corrupção no STJ emergiu a partir de elementos que indicavam a possibilidade de que informações confidenciais sobre a Operação Faroeste tivessem sido vazadas, comprometendo o andamento das investigações. O gabinete do ministro Og Fernandes, relator de processos relacionados à operação no STJ, tornou-se foco de apuração diante das alegações de acesso indevido a informações sensíveis.
Esses indícios reforçam a tese de que o esquema não se limitava às instâncias locais da Bahia, mas alcançava tribunais superiores, evidenciando uma teia de corrupção sistêmica. Além disso, levantam questionamentos sobre o papel de agentes públicos na preservação da integridade das investigações e na garantia da imparcialidade do sistema judicial.
Corrupção e Grilagem no Oeste da Bahia: Investigação revela esquema milionário envolvendo o TJBA
A investigação da PF, MPF e Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aponta a existência de esquema criminoso envolvendo membros do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), advogados e servidores judiciais. Segundo o MPF, o esquema envolve diversos empresários, que atuaram por meio de advogados, com o objetivo de obter vantagens ilícitas com a compra de decisões judiciais. Essas sentenças favoreceram a grilagem de terras no oeste da Bahia, alcançando uma área superior a 800 mil hectares, 360 mil hectares da antiga Fazenda São José e cerca de 600 mil hectares da Fazenda Estrondo. Os investigados utilizaram empresas e intermediários para dissimular os ganhos provenientes do esquema.
Decisões judiciais questionáveis emitidas pelo TJBA favoreceram o esquema. Entre elas, destaca-se a compra de liminares supostamente intermediada por membros do Tribunal. Uma delas teria custado R$ 1,8 milhão, de acordo com declarações registradas em escritura pública. Pessoas que revelaram detalhes do esquema foram assassinadas em circunstâncias suspeitas, ampliando a tese de que ações criminosas ocorreram objetivando eliminar testemunhas-chave.
A interferência do CNJ foi necessária para revisar atos administrativos relacionados ao registro de terras na região. Apesar das ordens do CNJ, a resistência de membros do TJBA em cumprir decisões gera preocupação. Documentos em posse da PF e do MPF indicam uma divisão de tarefas entre os investigados para perpetuar o esquema, que inclui corrupção ativa, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O caso reflete uma articulação criminosa complexa e evidencia os desafios no combate à corrupção no judiciário brasileiro. O desdobramento dessas investigações é crucial não apenas para responsabilizar os envolvidos, mas também para fortalecer os mecanismos de controle interno no Judiciário e promover maior transparência.
A conexão entre a Operação Faroeste e o STJ ressalta a necessidade de uma resposta institucional firme para combater a corrupção e preservar a confiança da sociedade na Justiça brasileira.
Implicações e Medidas Adotadas
A operação levou à prisão de Gonçalves e ao afastamento de servidores do STJ, cujas funções incluíam o apoio direto na tramitação dos processos. Até o momento, não há informações sobre quem financiou o esquema, embora mensagens apreendidas indiquem repasses significativos.
Respostas dos Envolvidos
Os gabinetes dos ministros mencionados negaram irregularidades. Nancy Andrighi afirmou já ter prestado esclarecimentos e garantiu que os processos de responsabilização dos servidores estão em andamento. O Bradesco declarou que não comenta casos judiciais, enquanto a DuPont não respondeu às solicitações.
Impacto no Sistema Judicial
Especialistas ouvidos destacam a gravidade das denúncias, que comprometem a confiança no sistema judicial brasileiro. Para o jurista Paulo Moreira, “os casos revelam uma possível fragilidade nos mecanismos de controle do Judiciário e reforçam a necessidade de maior transparência e fiscalização nas instâncias superiores”.
Entenda o “Caso Venditio Sententiae” e a análise sobre corrupção no Judiciário Brasileiro
O caso “Venditio Sententiae“, investigado pelo Jornal Grande Bahia e órgãos judiciais, expõe um esquema sistêmico de corrupção que atravessa o Judiciário brasileiro. O escândalo envolve a venda de sentenças no STJ, STF, Tribunais Estaduais e outros órgãos, revelando a influência de lobistas, advogados e servidores públicos em decisões judiciais em troca de propinas.
Principais pontos:
- Conceito e Contexto: A tese de Carlos Augusto, jornalista e cientista social, utiliza a expressão latina “Venditio Ludicii Judicialis in Curia Superiore” para descrever a subversão de leis e instituições judiciais, comprometendo a imparcialidade do Judiciário em benefício de interesses privados. Essa análise foi inicialmente baseada no Caso Faroeste, envolvendo grilagem de terras na Bahia e corrupção no TJBA.
- Desenvolvimento do Caso: O assassinato do advogado Roberto Zampieri em 2023, portador de provas que conectavam lobistas e servidores do STJ ao esquema, impulsionou as investigações. Provas obtidas de seu celular incluíam mais de 9 mil mensagens que evidenciavam negociações de sentenças e pagamentos em propinas, até em barras de ouro.
- Operações Policiais: A Operação Sisamnes, deflagrada em 2024, resultou na prisão de envolvidos, afastamento de servidores e desembargadores, e ampliação das investigações para instâncias superiores, como o STF.
- Impacto e Repercussões: A revelação abalou a confiança no sistema judicial, implicando magistrados, servidores e lobistas em um esquema transnacional. As investigações indicam ramificações em outros órgãos, como o CNJ e Ministério Público.
- Propostas de Reforma: O caso sinaliza a necessidade urgente de reformas estruturais no Judiciário, incluindo maior transparência, supervisão rigorosa de servidores e mecanismos para prevenir corrupção.
O caso “Venditio Sententiae” destaca a fragilidade das instituições judiciais brasileiras diante da corrupção, enfatizando a necessidade de ações concretas para restaurar a confiança pública no sistema de justiça.
Baixe
Pedido de Busca e Apreensão Criminal emitido pelo STJ no âmbito da Operação Faroeste: PBAC nº 10/DF
Share this:
- Click to print (Opens in new window) Print
- Click to email a link to a friend (Opens in new window) Email
- Click to share on X (Opens in new window) X
- Click to share on LinkedIn (Opens in new window) LinkedIn
- Click to share on Facebook (Opens in new window) Facebook
- Click to share on WhatsApp (Opens in new window) WhatsApp
- Click to share on Telegram (Opens in new window) Telegram
Relacionado
Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)
Subscribe to get the latest posts sent to your email.




