Reportagem de Rayssa Motta — publicada nesta terça-feira (17/11/2024) na Terra — revela que a desembargadora aposentada Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar anular a ação penal na qual é acusada de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro. O caso está inserido no contexto da Operação Faroeste, que investiga a suposta venda de sentenças no Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA).
Além da ação penal, a magistrada também enfrentou sanções administrativas. No dia 10 de dezembro de 2024 (terça-feira), o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinou sua aposentadoria compulsória, após investigações indicarem que ela exigia uma parcela da remuneração dos servidores nomeados em seu gabinete.
Denúncia e andamento do processo
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), Sandra Inês teria aceitado uma proposta de propina de R$ 4 milhões para favorecer uma empresa agropecuária em pelo menos três decisões. Segundo a denúncia, entre 2018 e 2020, a magistrada teria recebido efetivamente R$ 2,4 milhões.
Em novembro de 2024, a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceitou a denúncia, iniciando o processo criminal. A decisão foi unânime.
A defesa da desembargadora apresentou recurso ao STF questionando a decisão do STJ. O habeas corpus foi distribuído ao gabinete do ministro Edson Fachin, que solicitou informações ao STJ e parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Alegação de quebra de imparcialidade
A defesa sustenta que houve quebra de imparcialidade no julgamento, citando a delegada federal Luciana Matutino Caires, que atuou na investigação da Operação Faroeste e posteriormente integrou o gabinete do ministro Og Fernandes, relator do caso no STJ. Luciana trabalhou com o ministro por dois anos e foi desligada da equipe em abril de 2024.
Os advogados argumentam que a nomeação da delegada compromete a lisura do julgamento, pois ela teria participado da investigação e, mais tarde, integrado o gabinete que analisou as provas colhidas. A defesa classifica a situação como “nulidade insanável”, ressaltando que as decisões de Og Fernandes “guardam conexão causal com a legitimidade e a imparcialidade do recebimento da denúncia”.
Entre as decisões questionadas estão a revogação do acordo de delação premiada de Sandra Inês e a manutenção do afastamento do cargo.
Contestação das acusações
A defesa também rebate as acusações de corrupção, alegando que a Polícia Federal (PF) e o MPF não comprovaram que a magistrada aceitou propina. Os advogados questionam a falta de provas diretas e mencionam interceptações telefônicas em que Sandra Inês nega envolvimento em negociações ilícitas. Em uma das gravações, a desembargadora declara: “Jamais usei a minha caneta pra fazer qualquer tipo de negociata”.
Os advogados sustentam que a magistrada foi responsabilizada “por arrastamento”, sem descrição detalhada de sua suposta contribuição individual para os fatos denunciados.
Delação e revogação do acordo
Sandra Inês foi presa preventivamente no decorrer da investigação após a Polícia Federal apreender R$ 250 mil em seu apartamento. Posteriormente, tornou-se a primeira desembargadora a firmar um acordo de colaboração premiada, citando 68 pessoas, entre magistrados, advogados, empresários e políticos.
Em novembro de 2024, o STJ rescindiu o acordo de delação, sob a alegação de que Sandra Inês descumpriu os termos pactuados e deixou de colaborar com as autoridades. O ministro Og Fernandes determinou que as provas entregues continuassem válidas e pudessem ser usadas contra a magistrada. Com a rescisão, a desembargadora perdeu os benefícios do acordo e o valor da multa previamente negociada.
A defesa contesta a decisão e argumenta que a magistrada seguiu os compromissos firmados.
O ciclo criminoso desvelado na 5ª Fase da Operação Faroeste
O ciclo criminoso revelado pela Operação Faroeste é detalhado em documentos apresentados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) à Corte Especial do STJ.
De acordo com as investigações, o esquema envolvia pagamentos ilícitos para influenciar decisões judiciais no TJBA, com ênfase na negociação de processos relacionados a terras no estado da Bahia.
A seguir, estão os principais eventos registrados e monitorados pela PF:
- 27/01/2020 – Reunião entre Júlio César Ferreira Cavalcanti, advogado e ex-servidor do TJBA, e Vasco Rusciolelli Azevedo para organizar os recebimentos ilícitos de propina.
- 20/02/2020 – Encontro entre Júlio César e Vanderlei Chilante para agendamento de pagamentos e atos judiciais subsequentes.
- 16/03/2020 – Deslocamento de Geraldo Vigolo, levando valores provenientes de propina, em um veículo pertencente ao Grupo Bom Jesus Agropecuária, para o escritório de Vanderlei Chilante.
- 16/03/2020 – Movimentação de Vanderlei Chilante para entregar os valores da propina a Júlio César Ferreira Cavalcanti.
- 17/03/2020 – Encontro entre Júlio César e Vasco Rusciolelli para entrega de valores em espécie, acondicionados em uma mochila.
- 17/03/2020 – Circulação de Vasco Rusciolelli e Jamille Rusciolelli para dissociar os valores recebidos por Júlio César.
- 17/03/2020 – Chegada da propina na residência de Sandra Inês Rusciolelli Azevedo, desembargadora do TJBA.
- 24/03/2020 – Prisão de Sandra Inês Rusciolelli Azevedo, Vasco Rusciolelli Azevedo, Vanderlei Chilante e indiciamento de Nelson José Vigolo.
As investigações demonstraram a atuação coordenada dos envolvidos, com um ciclo de propinas que envolvia tanto magistrados quanto advogados e empresários, gerando graves implicações para o sistema judiciário e para o setor agropecuário na Bahia.
O Contexto do Mandado de Segurança e os Envolvidos
O Mandado de Segurança nº 0023332-59.2015.8.05.0000, que se tornou um dos principais focos da Operação Faroeste, foi alvo de negociações ilícitas entre os investigados. Sandra Inês Rusciolelli Azevedo, enquanto magistrada, era responsável pela decisão de um processo relacionado a terras na Bahia, e os envolvidos buscavam influenciar a sua decisão por meio de pagamentos ilegais. O ciclo de corrupção no âmbito deste processo se estendeu por diversos meses e foi monitorado pela PF, que obteve provas substanciais para o indiciamento dos envolvidos.
A colaboração de Júlio César Ferreira Cavalcanti, advogado e ex-servidor do TJBA, foi fundamental para o avanço das investigações. Ele forneceu detalhes sobre as operações criminosas e ajudou a Polícia Federal a rastrear os fluxos de dinheiro e as trocas de favores ilícitos entre os envolvidos.
O Impacto e as Consequências da Operação Faroeste
A 5ª fase da Operação Faroeste é um marco nas investigações sobre a corrupção dentro do sistema judiciário, trazendo à tona a complexidade do esquema criminoso e os interesses econômicos envolvidos, especialmente no contexto de disputas fundiárias. A prisão de figuras de destaque, como a desembargadora Sandra Inês Rusciolelli Azevedo, e o indiciamento de outros membros do grupo, como Nelson José Vigolo, refletem a profundidade da corrupção que permeava o TJBA. Este caso reforça a necessidade de vigilância constante e de medidas eficazes para combater a corrupção no sistema judicial brasileiro.
A operação não apenas expôs uma rede de corrupção no setor judiciário, mas também trouxe à tona os vínculos entre o poder político, a justiça e o setor empresarial, que frequentemente são usados para manipular decisões e garantir vantagens econômicas ilícitas. As investigações continuam e prometem revelar mais detalhes sobre as conexões entre os envolvidos.
O desfecho inicial da 5ª fase da Operação Faroeste representou um grave retrocesso no progresso das investigações, uma vez que todos os envolvidos, conforme relatado em diversas reportagens do Jornal Grande Bahia (JGB), tiveram suas Delações Premiadas (ou Colaboração Premiada) homologadas pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Og Fernandes.
STJ torna ré Sandra Inês Rusciolelli e mantém afastamento por venda de decisões no TJBA
Em 6 de novembro de 2024, por supostamente favorecer interesses privados mediante pagamentos milionários, STJ aceitou denúncia do MPF contra a desembargadora do TJBA Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo, acusada de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa na Operação Faroeste, que apura a venda de decisões judiciais sobre terras da Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto, Bahia. Também foram denunciados Vasco Rusciolelli Azevedo, advogado e filho da magistrada; Júlio César Ferreira Cavalcanti, advogado e delator; Nelson José Vigolo, presidente do Grupo Bom Jesus Agropecuária e delator; e Vanderlei Chilante, advogado da empresa.
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