Para a maioria dos policiais, civis e militares, a Audiência de Custódia é responsável pelo aumento da criminalidade no país. Introduzida pelo CNJ em São Paulo através de um Provimento entre a Presidência do TJ/SP e a Corregedoria Geral de Justiça do estado, determina que todas as pessoas presas em flagrante sejam apresentadas a um Juiz competente em até 24 horas após sua detenção. Seus objetivos básicos eram analisar a legalidade da prisão; garantir os direitos fundamentais do preso e, por fim, verificar a necessidade da manutenção da prisão. Isso ocorreu em2015, mas de lá para cá a impunidade, que já era institucionalizada, passou a atuar como uma súmula vinculante, e o criminoso, em vez de ir para a prisão, começou a ser liberado de forma generalizada.
Conforme exposto no Provimento que regulamentou o assunto, a implementação da audiência de custódia visa dar cumprimento ao Pacto de São José da Costa Rica, que, em seu artigo 7º, item 5, impõe que “toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais”. Numa análise perfunctória do dispositivo, percebe-se que, na verdade, nosso ordenamento jurídico em momento algum violou a referida Convenção, uma vez que toda pessoa presa é apresentada imediatamente ao Delegado de Polícia, que seria essa “outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais”.
Pelas exigências legais sobre a proteção do preso, a polícia, em sua maioria, vem cumprindo normalmente com suas obrigações. A brutalidade de alguns deles (violentos e arbitrários), não chega a macular a maioria como um todo, a não ser, como é o caso, na impunidade corporativa para esses policias criminosos e na anarquia que se instalou no país. Quando um delegado prende um criminoso e este é solto na Audiência de Custódia, o desânimo é grande, além da certeza de a impunidade prevalece. Por isso, o ditado policial de que “a gente prende e a audiência de custódia solta” se tornou uma unanimidade. Considerando que na audiência de Custódia a primeira pergunta que se faz ao criminoso é se ele sofreu algum tipo de agressão, nada mais natural do que uma reposta afirmativa, pois ninguém, em sã consciência, quer ir pra a cadeia. A polícia acha que a audiência de custódia teve, na prática, sua finalidade alterada. Hoje serve para beneficiar o bandido.
Alguns acham que ela já foi utilizada com outro nome no tempo da ditadura para evitar prisões por crimes políticos. Para aumentar ainda mais a insatisfação dos policiis, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, declarou que a polícia executa prisões de forma equivocada e, por isso, o Judiciário é obrigado a soltar os presos. “É um jargão que foi adotado pela população, que a polícia prende e o Judiciário solta. Eu vou dizer o seguinte: a polícia prende mal e o Judiciário é obrigado a soltar”. O ministro da Justiça, que foi ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) entre 2006 e 2023, disse que a instituição policial, às vezes, prende sem provas e dados concretos, e que se as prisões fossem de forma técnica, apresentando dados e indícios probatórios para o juiz, dificilmente os infratores seriam soltos. “É claro que nós temos que aperfeiçoar isso, nenhum juiz soltará um criminoso. Ele não está lá para soltar, ele está lá para fazer justiça. […] A polícia tem que prender melhor”, finalizou.
Em nota, a Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) repudiou a fala do ministro dizendo que “Só é possível falar em prisão ‘mal realizada’ quando se detecta alguma ilegalidade e certamente essa não é a realidade diuturna das audiências de custódia realizadas no Brasil”. Para agravar, acrescentou que a qualidade da prova produzida pelas Polícias Judiciárias “não pode ser medida pelo número de liberdades provisórias concedidas em audiências de custódia”. A ADPF afirma que a pasta deveria “estar atuando para valorização da polícia judiciária e dos Delegados de Polícia” e focar “no que realmente importa”.
Não houve resposta do ministro, que agora está focado na PEC da Segurança, que vem sofrendo críticas de governadores, parlamentares de oposição ligados ao bolsonarismo e numa boa parte da sociedade. Por isso, Lewandowski apresentou uma atualização da PEC, após sugestões de governadores que reclamavam da possibilidade de o texto abrir brecha para interferência da União na autonomia dos governos locais na gestão da segurança. Outros acham que essas novidades podem terminar como as Audiências de Custódia, ou seja, na liberação geral; só que, dessa vez, com a participação da União.
*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.
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