Na segunda-feira (26/05/2025), arqueólogos anunciaram a identificação das primeiras ossadas humanas no local onde funcionou o Cemitério do Campo da Pólvora, no Centro de Salvador. A descoberta foi divulgada pela arqueóloga Jeanne Dias, durante coletiva de imprensa realizada na sede do Ministério Público da Bahia, no bairro de Nazaré. Trata-se do maior cemitério de escravizados da América Latina já localizado, marco importante para a reconstrução da história de populações marginalizadas no Brasil.
A pesquisa confirmou que o antigo cemitério de escravizados, ativo até 1844, localiza-se no atual estacionamento do Complexo da Pupileira, área vinculada à Santa Casa de Misericórdia. Durante dez dias de escavação, foram localizados vestígios ósseos, como dentes e ossos largos, a cerca de 2,5 metros de profundidade. Segundo os arqueólogos, as condições do terreno – ácido e úmido – deixaram o material extremamente frágil, motivo pelo qual não foram divulgadas imagens das ossadas.
Populações sepultadas e invisibilização histórica
A arqueóloga Jeanne Dias, coordenadora do projeto, destacou que o local era destinado a sepultamentos de pessoas consideradas à margem da sociedade, incluindo escravizados, pobres, suicidas, prostitutas, excomungados e insurgentes, como os mártires da Revolta dos Malês.
“É uma contribuição relevante para compreendermos o sofrimento, o apagamento e as histórias dessas comunidades trazidas da África de forma forçada”, afirmou.
Execução do projeto arqueológico
O projeto de levantamento arqueológico foi financiado pela empresa Arqueólogos (Cotias e Dias LTDA), com base em pesquisa documental da arquiteta e doutoranda Silvana Olivieri. A escavação contou com uma equipe de cinco arqueólogos, entre eles Railson Cotias, que destacou o rigor técnico e o cuidado simbólico na condução dos trabalhos. A equipe seguiu metodologias específicas para contextos funerários, realizando escavações controladas e análise dos materiais em laboratório.
Apoio institucional e próximas etapas
A pesquisa teve o suporte do advogado e professor da UFBA, Samuel Vida, responsável pela elaboração do Dossiê Cemitério do Campo da Pólvora, enviado aos órgãos de proteção do patrimônio para obtenção de autorização. Também estiveram presentes na coletiva a arquiteta Silvana Olivieri, as promotoras de Justiça Lívia Vaz e Cristina Seixas, e representante do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
A próxima fase envolve análise das informações de campo, cruzamento com outras camadas históricas e posterior devolutiva pública. O objetivo é fomentar o debate sobre o destino do sítio arqueológico, com base em critérios técnicos, históricos e sociais.
Importância para a memória social
A identificação do Cemitério do Campo da Pólvora representa um marco para a valorização da memória de populações historicamente invisibilizadas no Brasil. Ao trazer à tona registros físicos de práticas de exclusão e violência institucionalizadas, o projeto reforça a necessidade de reconhecimento, reparação simbólica e preservação patrimonial. A iniciativa também lança luz sobre o papel da arqueologia histórica na reconstrução de narrativas excluídas do imaginário oficial.
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