O procurador-geral da República, Paulo Gonet, encaminhou manifestação ao Supremo Tribunal Federal (STF) na qual aponta indícios de envolvimento do ministro da Casa Civil, Rui Costa, em possíveis crimes cometidos durante a aquisição de respiradores pulmonares pelo Consórcio Nordeste, no ano de 2020. À época, Costa era governador da Bahia e presidente do consórcio interestadual.
A petição solicita que o inquérito seja remetido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a retomada das investigações, interrompidas desde maio de 2025, quando o caso foi transferido ao STF. A medida visa garantir o trâmite adequado conforme a jurisprudência recente sobre o foro privilegiado, que vincula a competência ao cargo ocupado no momento dos fatos investigados.
O caso dos respiradores e a atuação de Rui Costa
O contrato em questão, assinado por Rui Costa enquanto exercia o cargo de governador da Bahia, previa pagamento integral antecipado sem garantias contratuais para a aquisição de respiradores da empresa Hempcare Pharma. A empresa, que não possuía experiência técnica nem capacidade operacional compatível, jamais entregou os equipamentos.
O prejuízo estimado é de R$ 48 milhões, recurso público destinado ao combate à pandemia de covid-19 no âmbito do Consórcio Nordeste.
PGR defende competência do STJ e cita indícios contra o ex-governador
Segundo o documento da PGR, obtido com exclusividade pelo jornal O Estado de S. Paulo, a assinatura do contrato com cláusulas excepcionais, como o adiantamento integral sem garantias, constitui elemento relevante para investigação da participação direta de Rui Costa.
Gonet sustenta que os atos investigados ocorreram durante o mandato de Costa como governador e que, por isso, a apuração deve tramitar no Superior Tribunal de Justiça, instância responsável pelo julgamento de governadores. A posição da PGR se alinha à tese da própria defesa de Rui Costa, que também solicitou a manutenção do caso no STJ.
“Ainda que o investigado Rui Costa atualmente ocupe o cargo de Ministro de Estado, o novo entendimento firmado pelo plenário do STF indica que a competência permanece no STJ”, escreveu o procurador-geral.
Delação aponta suposta intermediação ligada ao entorno de Rui Costa
Em colaboração premiada firmada com a Justiça, a empresária Cristiana Taddeo, dona da Hempcare, relatou o pagamento de uma comissão de R$ 1,6 milhão ao empresário Cleber Isaac Soares, que teria atuado como intermediário do contrato e se apresentado como pessoa próxima ao então governador Rui Costa e à primeira-dama da Bahia à época, Aline Peixoto.
A empresária também afirmou não possuir a documentação mínima exigida para firmar contratos com o poder público e reconheceu que sua empresa não detinha estrutura para atender à demanda contratada.
A defesa de Cleber Isaac Soares declarou que confia na Justiça e que a inocência do empresário será comprovada ao longo do processo. Ele já prestou depoimento à CPI dos Respiradores da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte.
Nota da defesa de Rui Costa nega acusações e reitera apoio à tramitação no STJ
A assessoria do ministro Rui Costa negou a existência de qualquer elemento novo que o vincule a irregularidades e destacou que a manifestação da PGR não tem caráter acusatório.
“A nova peça da PGR não agrega nenhum elemento acusatório quanto à conduta do então governador da Bahia”, diz a nota oficial.
Segundo a nota, Rui Costa determinou a abertura de investigação policial ainda em 2020, quando constatou o não recebimento dos equipamentos. A defesa sustenta que o processo no STJ garante maior celeridade e observa jurisprudência já consolidada pelo Supremo Tribunal Federal.
Riscos políticos e judiciais à imagem do ministro da Casa Civil
A retomada da investigação no STJ, com base em manifestação da Procuradoria-Geral da República, representa risco político real para o ministro Rui Costa, considerado peça-chave do governo Lula e possível candidato ao Senado. Ainda que a petição da PGR não contenha denúncia formal, a reabertura das apurações amplia o desgaste público e institucional.
A existência de delações, pagamentos confessos e a ausência de entregas no contrato indicam um caso emblemático de gestão temerária de recursos públicos em situação de emergência, cuja responsabilização ainda encontra resistência política. A blindagem institucional, combinada com o debate sobre o foro, levanta dúvidas sobre a efetividade da responsabilização de altos agentes públicos no Brasil.
Linha do Tempo Detalha Caso da Compra dos Respiradores
A contratação emergencial da empresa Hempcare Pharma pelo Consórcio Nordeste, presidido à época pelo então governador da Bahia, Rui Costa, resultou em um prejuízo de R$ 48 milhões aos cofres públicos, após o não fornecimento de 300 respiradores durante a pandemia de Covid-19. Desde 2020, o caso passou por inquéritos, delações premiadas, auditoria do TCU e disputa de competências entre STJ, Justiça Federal e STF, e voltou à tona com nova manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) em 04/08/2025.
2020 – Contratação e início das suspeitas
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Contratação da Hempcare Pharma: O Consórcio Nordeste, sob a presidência de Rui Costa (então governador da Bahia), firma contrato com a Hempcare para fornecimento de 300 respiradores.
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Pagamento antecipado integral: Foram pagos R$ 48 milhões sem garantias contratuais, mesmo diante da inexperiência técnica da empresa.
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Falha na entrega: Os respiradores nunca foram entregues.
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Inquérito inicial: A Polícia Civil da Bahia abre investigação preliminar.
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Delação premiada: Cristiana Taddeo, sócia da Hempcare, confessa o pagamento de R$ 1,6 milhão em comissão a Cleber Isaac Soares, ligado ao governo baiano, e firma delação premiada.
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Operações da PF: São deflagradas duas operações com apreensão de celulares e documentos de intermediários, entre eles Cleber Isaac e Fernando Galante, suspeitos de receber até R$ 12 milhões em comissões.
2023 – Início formal do inquérito
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STJ abre investigação criminal: O inquérito é oficialmente instaurado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda durante o mandato de Rui Costa como ministro da Casa Civil.
2024 – Auditoria e aprofundamento
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Relatório do TCU: O Tribunal de Contas da União detecta sobrepreço de até 318% nos equipamentos e conclui que “não era possível ter havido boa-fé” no processo.
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Operação reforça vínculos: Relatórios da PF destacam que Cleber Isaac seria amigo pessoal de Rui Costa e atuou como facilitador da contratação da Hempcare.
Final de 2024 / início de 2025 – Competência judicial
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Fim do foro privilegiado: Com o término do mandato de Rui Costa, o caso é remetido à Justiça Federal da Bahia.
Maio de 2025 – STF reassume o caso
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Nova interpretação do STF: Com base em mudança de entendimento sobre o foro, o processo retorna ao Supremo Tribunal Federal, ficando sob relatoria do ministro Flávio Dino.
Junho – Julho de 2025 – Manifestação da PGR
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Paulo Gonet se manifesta: O procurador-geral da República formaliza pedido para que o processo retorne ao STJ, argumentando haver indícios de crimes envolvendo Rui Costa, especialmente pela assinatura de um contrato com pagamento antecipado e ausência de garantias contratuais.
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Crimes citados: A PGR aponta possível prática de dispensa irregular de licitação, improbidade administrativa e prejuízo ao erário.
04 de agosto de 2025 – Novo desdobramento
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Divulgação pública: A imprensa, liderada pela Gazeta do Povo, destaca a nova manifestação da PGR e a solicitação formal de retomada do caso pelo STJ.
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Valor mantido: O montante central do caso continua sendo os R$ 48 milhões pagos de forma antecipada.
Sem rigor técnico
A linha do tempo revela um padrão recorrente de gestão emergencial sem rigor técnico, que comprometeu a lisura do processo e resultou em prejuízo vultoso. O caso ilustra graves falhas administrativas, como o pagamento antecipado sem garantias contratuais e a escolha de uma empresa sem qualificação.
A sucessão de movimentações entre STJ, Justiça Federal e STF reflete as complexidades da jurisprudência brasileira sobre foro privilegiado, o que pode atrasar a responsabilização efetiva. A cooperação premiada da empresária envolvida, os laudos do TCU e as operações da PF agregam robustez às investigações, embora, até o momento, Rui Costa não tenha sido formalmente denunciado.
No plano político, a permanência de Rui Costa em posição estratégica na Esplanada dos Ministérios, mesmo diante da gravidade dos indícios, mantém vivo o risco reputacional e jurídico, além de reabrir o debate sobre accountability e uso de consórcios públicos como instrumento de manobras financeiras durante emergências.
Tabela-resumo
| Período | Acontecimento principal |
|---|---|
| 2020 | Contrato com a Hempcare; pagamento antecipado de R$ 48 mi; respiradores não entregues; delação e operações da PF |
| 2023 | Inquérito formal é aberto no STJ durante mandato de Rui Costa |
| 2024 | Auditoria do TCU aponta sobrepreço de até 318% e ausência de boa-fé |
| Final 2024 / início 2025 | Com fim do mandato, o caso vai à Justiça Federal da Bahia |
| Maio de 2025 | Inquérito retorna ao STF após nova interpretação sobre foro privilegiado |
| Junho / julho de 2025 | PGR pede retorno do caso ao STJ com base em indícios de crimes e má gestão |
| 04/08/2025 | Gazeta do Povo noticia novo pedido da PGR para que o STJ reassuma o inquérito; mantido valor de R$ 48 milhões no centro das apurações |
Principais dados do caso
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Empresa contratada: Hempcare Pharma
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Valor do contrato: R$ 48 milhões (pagamento antecipado)
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Quantidade de respiradores não entregues: 300
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Comissão confessada: R$ 1,6 milhão
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Comissão investigada: até R$ 12 milhões
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Sobrepreço apurado pelo TCU: até 318%
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Autoridades citadas: Rui Costa (ex-governador), Cleber Isaac Soares (intermediário), Cristiana Taddeo (delação premiada)
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Fases do inquérito: Polícia Civil → STJ → Justiça Federal → STF → possível retorno ao STJ
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Ministro relator atual no STF: Flávio Dino
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PGR atual: Paulo Gonet
*Com informações do Estadão.
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