A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (16/09/2025), em primeiro turno, o texto-base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 3/21, conhecida como PEC das Prerrogativas, que limita a atuação do Supremo Tribunal Federal (STF) em processos contra parlamentares. O placar registrou 353 votos a favor, 134 contra e 1 abstenção.
O que diz a PEC
A proposta determina que medidas cautelares pessoais ou patrimoniais contra deputados e senadores só poderão ser aplicadas pelo STF com autorização prévia do Congresso Nacional.
A regra vale mesmo se o parlamentar deixar o cargo, desde que os fatos investigados tenham ocorrido durante o exercício do mandato. O relator, deputado Claudio Cajado (PP-BA), afirmou que o objetivo é “resguardar garantias constitucionais” e retomar o espírito original da Constituição de 1988.
Além disso, o texto prevê foro privilegiado para presidentes de partidos políticos com representação no Congresso Nacional, ampliando o alcance da proteção judicial.
Destaques em votação
Antes de concluir a votação em primeiro turno, os deputados ainda precisam analisar os destaques apresentados pelas bancadas:
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A Federação Psol-Rede apresentou destaque para retirar a exigência de autorização do Congresso em casos de prisão em flagrante, que hoje depende de votação secreta.
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O Partido Novo defende a exclusão do foro privilegiado para presidentes de partidos, criticando a ampliação das prerrogativas parlamentares.
O que muda com a PEC
O texto aprovado estabelece que processos criminais contra deputados e senadores só poderão avançar com aval do Congresso, em votação secreta realizada em até 90 dias após a ordem do STF.
De forma inédita, a proposta também abre espaço para que ações cíveis, como as de improbidade administrativa, dependam de deliberação da Suprema Corte. Essa mudança representa um alargamento do foro privilegiado, nunca antes visto no ordenamento brasileiro.
Contexto histórico e político
A medida resgata um modelo de blindagem parlamentar maior do que o previsto em 1988 e que havia sido reduzido em 2001, após mobilização social contra a impunidade.
Duas décadas depois, o centrão patrocinou a PEC como reação às mais de 80 investigações em andamento no STF, envolvendo suspeitas de desvio de recursos das emendas parlamentares, que movimentam cerca de R$ 50 bilhões por ano.
Deputados governistas e de oposição defenderam que a medida fortalece a independência do Legislativo diante do Judiciário, acusado de extrapolar suas funções. Já os críticos enxergam um risco de retrocesso institucional, com a criação de barreiras para a responsabilização judicial de parlamentares.
Apoio e articulação política
A PEC obteve apoio majoritário de partidos do centrão e da direita, como o PL. Apenas PT, PSOL, PCdoB, Rede e Novo votaram contra em bloco ou de forma predominante.
O governo Lula liberou a bancada, após acordo com líderes da Câmara para barrar a proposta de anistia ampla aos condenados pelos atos golpistas de 8 de Janeiro.
Entre os 63 deputados do PT, 12 votaram a favor e 51 contra, incluindo o líder do governo, Odair Cunha (PT-MG). O arranjo político prevê a rejeição da anistia em plenário nesta quarta-feira (17), em troca de uma solução intermediária: a redução de penas aplicadas a Jair Bolsonaro e a outros sete condenados pelo STF na semana anterior.
Debate no plenário
O relator Cláudio Cajado (PP-BA) defendeu que a PEC garante condições para que parlamentares exerçam seus mandatos “sem temer perseguições políticas”.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), reforçou que não se trata de pauta de governo ou oposição, mas de autonomia dos mandatos. “Trata-se de resgatar o texto constitucional de 1988”, afirmou.
Apesar disso, a votação foi marcada por embates. O deputado Zé Trovão (PL-SC) admitiu que a expectativa do PL é de que a aprovação da PEC abra caminho para a aprovação da anistia ampla, em contradição ao acordo costurado por Motta. Já Carlos Jordy (PL-RJ) negou que se trate de blindagem e acusou o STF de perseguir deputados por suas falas.
Na oposição, Chico Alencar (PSOL-RJ) classificou a proposta como “PEC da bandidagem”:
“Virou PEC da blindagem, da autoproteção, da couraça, do corporativismo, da impunidade, da armadura e da vergonha”, disse.
Possíveis efeitos jurídicos
Especialistas afirmam que, se a PEC for promulgada, processos em andamento contra parlamentares poderão ser suspensos de imediato, já que emendas constitucionais têm efeito imediato e não preveem regra de transição.
Há, contudo, precedentes que podem gerar controvérsias. Em 2022, o STF decidiu que alterações na Lei de Improbidade aprovadas pelo Congresso tinham efeito retroativo apenas para casos em andamento, mas não para processos já julgados.
Caberá ao próprio STF definir se a PEC terá aplicação retroativa ou mesmo avaliar a constitucionalidade da emenda, o que pode abrir novo conflito entre Legislativo e Judiciário.
Declarações da presidência da Câmara
Hugo Motta destacou que a inclusão da PEC na pauta foi decisão coletiva do Colégio de Líderes. Para ele, a proposta responde a “atropelos e abusos” praticados contra parlamentares em diferentes momentos.
“A decisão, com apoio da maioria do Colégio de Líderes, é para que este Plenário possa deliberar sobre as garantias constitucionais de que nossos mandatos precisam”, disse.
“Vamos decidir se vamos votar pelo fortalecimento das prerrogativas parlamentares ou não. Esta será uma decisão soberana individual de cada deputado.”
Imunidades
A aprovação da PEC das Prerrogativas em 1º turno representa um dos movimentos mais expressivos do Legislativo em direção ao reforço de suas próprias imunidades desde a redemocratização. Embora defendida como medida de proteção institucional, a proposta surge no contexto de investigações contra parlamentares e pode ser lida como um esforço de autoproteção corporativa. Ao ampliar o foro privilegiado inclusive para ações cíveis, o Congresso envia um recado de enfrentamento ao STF, em meio a uma relação já marcada por choques recentes. O desfecho no Senado e a reação do Supremo definirão se a medida resultará em uma crise institucional mais aguda ou em um reequilíbrio delicado entre os Poderes.
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