A defensora pública Patrícia Bettin Chaves afirmou na quinta-feira (28/08/2025), em depoimento à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do INSS, que fraudes em benefícios previdenciários já ocorriam desde 2018 e 2019, afetando principalmente idosos de baixa renda e moradores de áreas remotas.
Segundo Bettin, entidades como associações e sindicatos forjaram autorizações de aposentados e pensionistas, registrando-os como associados sem consentimento. O INSS então realizava descontos automáticos de valores entre R$ 30 e R$ 90 diretamente nos benefícios.
Esquema bilionário e impacto social
A Polícia Federal estima que as fraudes tenham movimentado R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024. As vítimas, em média, demoravam de dois meses a um ano para identificar os descontos.
Entre os serviços supostamente oferecidos pelas entidades estavam planos odontológicos, academias e assistência jurídica, mas os beneficiários desconheciam totalmente tais contratos. A defensora alertou para o uso de assinaturas falsificadas, gravações telefônicas forjadas e até inteligência artificial para validar autorizações.
Contexto político e responsabilidades
Durante a sessão, parlamentares divergiram sobre a responsabilidade pela escalada de irregularidades.
- Senador Rogério Marinho (PL-RN): afirmou que houve aumento de fraudes no atual governo.
- Deputado Paulo Pimenta (PT-RS): atribuiu o problema a acordos firmados ainda na gestão de Jair Bolsonaro, que permitiram descontos automáticos por meio de cooperação técnica entre INSS e entidades.
Patrícia Bettin, porém, destacou que a fraude é um problema suprapartidário e estrutural, intensificado pela falta de biometria, transparência e controle.
Revalidação e medidas legais
O debate também alcançou a revalidação anual dos descontos, inicialmente prevista na MP 871/2019 e posteriormente flexibilizada pelo Congresso. Outra medida, a MP 1.107/2022, extinguiu a obrigatoriedade da revalidação, segundo deputados.
O Tribunal de Contas da União (TCU) recomendou em 2024 a retomada da revalidação de todos os descontos. O INSS, contudo, recorreu, alegando dificuldades técnicas para cumprir a determinação. A partir de março de 2024, apenas novos descontos passaram a exigir biometria ou reconhecimento facial.
Omissões institucionais e papel do Executivo
Patrícia Bettin declarou acreditar que o então ministro da Previdência, Carlos Lupi, tinha conhecimento das fraudes, já que representantes do INSS participavam do grupo interinstitucional que investigava o caso. Segundo ela, o órgão deixou de adotar recomendações importantes e ignorou parte dos comunicados recebidos.
Ainda assim, algumas medidas foram implementadas, como o aperfeiçoamento dos canais de atendimento e a possibilidade de exclusão de descontos indevidos pela Central 135.
Créditos consignados e novas investigações
Outro ponto de preocupação é o crédito consignado, modalidade que permite empréstimos com desconto automático em folha. A defensora afirmou que, em muitos casos, os beneficiários acumulavam diversos contratos de empréstimos e descontos associativos, tornando-se alvo de endividamento em série.
A CPMI decidiu ampliar as investigações para fraudes no consignado, que podem envolver instituições financeiras e intermediários.
Ressarcimento às vítimas
Para devolver os valores, as vítimas podem acionar o INSS pelo telefone 135 ou nos Correios. Caso não reconheçam os documentos apresentados pelas entidades, recebem o reembolso.
Um acordo conduzido no Supremo Tribunal Federal (STF) agiliza a devolução, mas impede o beneficiário de pleitear indenização por dano moral. Quem recusar o acordo pode ingressar com ação judicial, mas enfrenta maior demora.
Em julho de 2025, o governo editou a MP 1.306/2025, abrindo crédito extraordinário de R$ 3,3 bilhões para ressarcir aposentados lesados. Parlamentares, como a senadora Leila Barros (PDT-DF), defendem ressarcimento imediato, criticando resistências em liberar recursos emergenciais.
Sessão secreta da CPMI
Parte da reunião ocorreu de forma reservada, com o depoimento do delegado Bruno Oliveira Pereira Bergamaschi, responsável pela Operação Sem Desconto, que apura o esquema. A sessão foi conduzida pelo presidente da CPMI, senador Carlos Viana (Podemos-MG).
Esquema sistêmico de fraudes
A denúncia apresentada à CPMI revela um esquema sistêmico de fraudes no INSS que ultrapassa governos e se aproveita da vulnerabilidade de milhões de aposentados. O conflito político entre oposição e situação, ao tentar atribuir responsabilidades, obscurece o aspecto central: a falha de governança institucional. A ausência de mecanismos de controle, como biometria obrigatória e revalidação anual, criou brechas exploradas por entidades fraudulentas. A resposta do Estado, fragmentada e tardia, mostra como o aparelhamento burocrático e a resistência à modernização tecnológica alimentaram um dos maiores escândalos previdenciários do país.
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