O Relatório sobre a Lacuna de Adaptação 2025, divulgado nesta quarta-feira (29/10/2025) pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), alerta que os países em desenvolvimento precisarão de mais de US$ 310 bilhões anuais até 2035 para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas. O valor estimado é 12 vezes maior do que o volume atual de financiamento público internacional destinado à adaptação.
Segundo o relatório, as metas fixadas pelo Pacto Climático de Glasgow, que previa dobrar o financiamento público para cerca de US$ 40 bilhões anuais até 2025, dificilmente serão alcançadas. O documento foi lançado para subsidiar as negociações da COP30, que será realizada em Belém (PA), em 2026.
Lacuna crescente e impacto global
O PNUMA estima que o custo de adaptação pode chegar a US$ 365 bilhões anuais, caso sejam consideradas as necessidades extrapoladas dos Planos Nacionais de Adaptação e das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). Em 2023, o volume de recursos disponíveis foi de apenas US$ 26 bilhões, cifra inferior à do ano anterior.
O resultado é uma lacuna financeira de até US$ 339 bilhões por ano, cenário que ameaça diretamente a estabilidade econômica e ambiental de centenas de países. “Os impactos climáticos estão se acelerando, mas o financiamento não acompanha o ritmo”, afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres, enfatizando que “adaptação não é custo, é sobrevivência”.
Progresso no planejamento, mas desafios persistem
O relatório mostra avanços no campo do planejamento: 172 países já possuem algum tipo de política ou plano nacional de adaptação, embora 36 deles mantenham documentos desatualizados há mais de uma década. Essa defasagem, segundo o PNUMA, aumenta o risco de más adaptações — medidas que, em vez de proteger, acabam ampliando vulnerabilidades sociais e ambientais.
Nos Relatórios Bienais de Transparência apresentados sob o Acordo de Paris, as nações reportaram 1.600 ações de adaptação em andamento, especialmente nas áreas de agricultura, biodiversidade, água e infraestrutura. Entretanto, poucos países detalham os resultados dessas ações, o que impede medir sua eficácia e impacto real.
Financiamento internacional em queda
O financiamento internacional de adaptação caiu de US$ 28 bilhões para US$ 26 bilhões entre 2022 e 2023, sinalizando retrocesso. Mesmo com o crescimento pontual de aportes ao Fundo de Adaptação e ao Fundo Verde para o Clima, que atingiram US$ 920 milhões em 2024, o PNUMA alerta que as restrições fiscais globais ameaçam a continuidade desses fluxos.
A Nova Meta Quantificada Coletiva definida na COP29 prevê que os países desenvolvidos destinem US$ 300 bilhões anuais para o financiamento climático até 2035. Contudo, o relatório ressalta que o valor é insuficiente, pois abrange tanto mitigação quanto adaptação — e apenas uma fração seria destinada a esta última.
Roteiro de Baku a Belém e o papel do setor privado
O documento destaca o chamado “Roteiro de Baku a Belém”, iniciativa que visa arrecadar US$ 1,3 trilhão até 2035 para ações climáticas. O PNUMA recomenda que o esforço seja sustentado por doações e instrumentos financeiros não geradores de dívida, evitando sobrecarregar economias vulneráveis.
O setor privado também é apontado como peça-chave: o relatório estima um potencial de US$ 50 bilhões anuais em investimentos privados em adaptação — um salto significativo frente aos atuais US$ 5 bilhões. Para atingir esse patamar, será necessário combinar políticas de incentivo, mitigação de riscos e instrumentos financeiros híbridos que ampliem a atratividade dos projetos sustentáveis.
A urgência de um pacto pela resiliência
A diretora-executiva do PNUMA, Inger Andersen, enfatizou que “todas as pessoas do planeta já vivem sob os impactos das mudanças climáticas”. Ela defendeu a necessidade de um esforço global coordenado, capaz de aumentar o financiamento sem agravar o endividamento dos países mais pobres.
“Mesmo com orçamentos apertados, a realidade é simples: se não investirmos agora em adaptação, o custo futuro será muito maior”, declarou Andersen, chamando atenção para a relação direta entre crise climática, desigualdade e segurança global.
A COP30 e o desafio da equidade climática
O relatório do PNUMA expõe um paradoxo central da política climática internacional: enquanto os impactos se intensificam, o apoio financeiro real permanece estagnado. A COP30 em Belém será palco de um embate entre promessas e realidade — especialmente em torno da responsabilidade histórica das nações desenvolvidas.
O desafio vai além da arrecadação: trata-se de redefinir o conceito de adaptação como investimento estratégico, não como despesa emergencial. O risco é que, sem um pacto global mais equitativo, o mundo caminhe para uma “geografia da vulnerabilidade”, na qual países tropicais arcam com os custos de um colapso climático que não provocaram.
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