O Congresso Nacional derrubou 52 vetos impostos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Lei Geral do Licenciamento Ambiental (Lei 15.190/2025) nesta quinta-feira (27/11/2025), restabelecendo dispositivos que dispensam, simplificam e redefinem etapas do licenciamento ambiental, além de alterar a atuação de órgãos federais, estaduais e municipais. A decisão ocorre dias após a COP-30, realizada em Belém, e reacende o debate nacional sobre desenvolvimento, proteção ambiental e segurança jurídica.
A sessão, presidida por Davi Alcolumbre, foi marcada por negociações intensas. O senador ressaltou que a análise dos vetos “não é um detalhe técnico, mas essencial para o desenvolvimento do país”, defendendo o papel institucional do Parlamento na definição da legislação ambiental.
Parlamentares inicialmente derrubaram 24 itens, seguindo-se a rejeição de 28 destaques, totalizando os 52 dispositivos restituídos ao texto legal. O único bloco mantido refere-se ao Licenciamento Ambiental Especial (LAE), que está em análise por meio da MP 1.308/2025, responsável por restabelecer o modelo trifásico tradicional (licenças prévia, de instalação e de operação) e exigir Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (Rima).
Segundo Alcolumbre, transformar a votação em disputa política seria desvirtuar a função constitucional do Congresso. Ele agradeceu o papel da senadora Tereza Cristina, que atuou como ponte entre governo e oposição, ajudando a viabilizar consenso mínimo para a tramitação.
Governo defendia manutenção dos vetos
A posição oficial do governo, representado pelo líder Randolfe Rodrigues, era pela manutenção dos vetos com o argumento de que diversos trechos:
- afrontavam competências da União,
- contrariavam o Código Florestal,
- fragilizavam a Mata Atlântica,
- e violavam decisões do STF sobre terras indígenas e licenciamento por adesão.
Bancadas do Psol, Rede e parte do PT acompanharam essa posição, destacando risco de retrocessos ambientais. A senadora Eliziane Gama classificou o texto como “um retrocesso e uma vergonha para o Brasil”.
A deputada Talíria Petrone criticou a flexibilização em meio à crise climática global e defendeu que o Congresso deveria discutir “transição energética justa” e políticas de “desmatamento zero”.
Oposição celebra flexibilização e mudança no marco ambiental
Pela oposição, senadores como Rogério Marinho e Marcos Rogério defenderam que o licenciamento ambiental atual “trava o desenvolvimento do país”. Para eles, o novo texto representa equilíbrio entre desenvolvimento e preservação, garantindo maior previsibilidade aos investimentos.
Deputados do PL, como Sóstenes Cavalcante e Zé Vitor, defenderam que os vetos “prejudicavam o agronegócio” e que o texto final garante a realização dos estudos necessários, sem paralisar obras de infraestrutura, saneamento, energia e atividades agropecuárias.
Principais mudanças restabelecidas pelo Congresso
Dispensa de licenciamento ambiental
O texto passa a dispensar licenciamento em casos como:
- manutenção e melhorias de infraestrutura existente (rodovias, linhas de transmissão, gasodutos);
- atividades rurais em áreas com CAR pendente de homologação;
- obras de saneamento básico até a universalização prevista na Lei 14.026/2020.
Licenciamento simplificado
Poderá ser aplicado a empreendimentos de:
- segurança energética,
- abastecimento de água e esgoto,
- ampliação de rodovias e energia,
- atividades de pequeno e médio porte com baixo ou médio potencial poluidor,
- regularização de atividades já em operação, via Licença de Operação Corretiva (LOC).
O instrumento central é a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC), que permite ao empreendedor declarar atendimento às normas preestabelecidas.
Ampliação da autonomia dos entes federativos
Estados e municípios poderão definir:
- conceitos de porte da atividade,
- potencial poluidor,
- tipologias sujeitas a licenciamento,
- modalidades de licenciamento simplificado.
Também foram restauradas regras que reduzem o poder de veto de órgãos federais como Funai, Fundação Palmares e ICMBio, tornando seus pareceres opinativos.
Mata Atlântica e unidades de conservação
Com a derrubada dos vetos:
- desmatamento de vegetação primária ou secundária em estágio avançado na Mata Atlântica poderá ser autorizado sem anuência prévia de órgãos estaduais,
- desmatamento em estágio médio dependerá apenas de conselho municipal de meio ambiente, quando houver,
- estudos em unidades de conservação poderão ocorrer mediante comunicação prévia, sem autorização formal.
Fiscalização e responsabilização
O órgão licenciador terá a palavra final sobre multas aplicadas por outros órgãos. Além disso:
- bancos financiadores e contratantes ficam isentos de responsabilidade subsidiária,
- condicionantes ambientais não poderão ser exigidas quando relacionadas a impactos causados por terceiros.
Críticas e preocupações ambientais
Ambientalistas e parlamentares críticos afirmam que o Congresso abriu espaço para autolicenciamento, fragilizando mecanismos de controle e aumentando riscos de desastres socioambientais — comparação feita com Mariana e Brumadinho por Célia Xakriabá.
O coordenador da Frente Ambientalista, deputado Nilto Tatto, criticou a ausência de levantamento técnico sobre empreendimentos supostamente parados por excesso de burocracia: “a lista nunca apareceu”. Ele também lamentou a votação ocorrer menos de uma semana após a COP-30, o que classificou como “contradição política evidente”.
Flexibilização aprovada em momento sensível revela choque entre agendas ambientais e econômicas
A derrubada dos vetos expõe o choque entre duas visões de país: de um lado, a pressão por celeridade, competitividade e expansão de obras de infraestrutura; de outro, a defesa de rigidez técnica e proteção ambiental, sobretudo diante da emergência climática global. O fato de a votação ocorrer logo após a COP-30 evidencia a dissonância entre o discurso internacional e a prática legislativa interna.
O texto restaura margens amplas para estados e municípios decidirem critérios de licenciamento, o que pode estimular desigualdades regulatórias e consolidar ambientes permissivos, especialmente em regiões pressionadas por mineração e agronegócio. Ao mesmo tempo, amplia previsibilidade para investimentos em áreas estratégicas, reduzindo gargalos apontados há décadas pelos setores produtivos.
A consequência imediata será um novo ciclo de judicialização, uma vez que os temas tocados – Mata Atlântica, consulta a povos indígenas, condicionantes ambientais e responsabilidade subsidiária – já foram objeto de decisões recentes do STF. O ambiente jurídico continuará em tensão até que a nova lei seja interpretada pelos tribunais superiores.
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