Rede de influência política e crise no Banco Master: como Daniel Vorcaro construiu proteção, poder e colapsou sob investigação federal

A Operação Compliance Zero revelou um amplo esquema de influência política, consultorias milionárias e operações irregulares que sustentaram o crescimento do Banco Master. As investigações da PF apontam fraudes bilionárias, pressão sobre órgãos reguladores e articulações envolvendo parlamentares, partidos e consultores de alto perfil. Daniel Vorcaro deixou a prisão com tornozeleira eletrônica, enquanto o Banco Central decretou a liquidação da instituição e bloqueou bens dos controladores.
Crise no Banco Master: rede política de Daniel Vorcaro, contratos milionários e investigação da PF expõem bastidores de poder em Brasília.

O banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, deixou na manhã deste sábado (29/11/2025) o Centro de Detenção Provisória 2 de Guarulhos (SP) após decisão liminar da desembargadora Solange Salgado, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que substituiu a prisão preventiva por medidas cautelares. Vorcaro estava detido desde o dia 17, quando foi preso no aeroporto de Guarulhos ao embarcar para Dubai, no contexto da Operação Compliance Zero, da Polícia Federal.

A decisão judicial, expedida na noite de sexta-feira (28), determinou o uso de tornozeleira eletrônica, entrega dos passaportes e outras restrições. A magistrada afirmou que, embora as suspeitas sejam graves, as medidas alternativas são suficientes, sobretudo após a defesa comprovar que o banqueiro havia comunicado previamente ao Banco Central a viagem aos Emirados Árabes Unidos para tratar da possível venda do Master.

A soltura ocorre em meio ao colapso institucional e regulatório do Banco Master, cuja liquidação extrajudicial foi decretada pelo Banco Central após investigações que apontaram emissão de títulos de crédito falsos, pressões sobre reguladores e operações suspeitas que somam mais de R$ 12 bilhões.

A prisão e a soltura: a ofensiva judicial e a reviravolta no TRF-1

Vorcaro foi preso no dia 17 de novembro de 2025, durante tentativa de embarque internacional. A primeira decisão de habeas corpus havia sido negada pela própria desembargadora Solange Salgado, que considerou existir risco de ocultação de provas e movimentação financeira para obstrução da investigação. A defesa insistiu e, na reconsideração, a magistrada entendeu que o controle judicial poderia ser garantido por meios menos gravosos.

A defesa, liderada por Pierpaolo Bottini, Roberto Podval, Walfrido Warde e Sergio Leonardo, afirma que o empresário ainda avalia se permanece em São Paulo. A equipe também acionou o Supremo Tribunal Federal, sustentando que a Justiça Federal de primeira instância não seria competente para conduzir o caso; o pedido está sob análise do ministro Dias Toffoli. Neste sábado (29/11), imagens registradas na saída da unidade prisional mostram o banqueiro escoltado por agentes armados, em ambiente controlado pela Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo.

A Operação Compliance Zero e o início da derrocada

Deflagrada em 18 de novembro de 2025, a operação da Polícia Federal atingiu diretamente o núcleo de decisões que sustentava a expansão agressiva do Banco Master. Segundo as investigações, o banco:

  • emitiu títulos de crédito falsos;
  • ofereceu rendimentos artificiais acima de 40% do mercado;
  • realizou operações que somam R$ 12,2 bilhões com o Banco de Brasília (BRB);
  • pressionou órgãos reguladores para evitar intervenção;
  • usou uma estrutura de consultorias milionárias para acessar autoridades, empresários e agentes públicos de alto escalão.

As diligências envolveram cinco prisões preventivas, duas temporárias e 25 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Distrito Federal.

O juiz de primeira instância justificou a prisão afirmando que os investigados poderiam manipular ou ocultar provas, além de realizar novas operações financeiras para dificultar o rastreamento dos crimes.

Rede de influência política e jurídica: como Daniel Vorcaro construiu proteção, acesso e poder em Brasília

A investigação revelou que o Banco Master não cresceu apenas por alavancagem financeira. Sustentou-se, por anos, sobre uma rede de influência que conectava parlamentares, ministros, ex-ministros, consultores e estruturas sensíveis do Estado brasileiro.

Segundo relatos obtidos pela PF, Vorcaro repetia a frase: “no Brasil, não se anda sem proteção política”, usada para justificar sua estratégia de alianças.

Trânsito no Congresso: Ciro Nogueira, União Brasil e fundos públicos

Vorcaro mantinha proximidade com Ciro Nogueira (PP-PI), classificada em relatórios como “grande amizade”. Outros movimentos revelam o interesse político em torno do Master:

  • Em 2024, Ciro propôs elevar de R$ 250 mil para R$ 1 milhão o teto de cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), medida que beneficiaria bancos médios.
  • Deputados do PP e União Brasil pressionaram o Banco Central para liberar a compra do Master pelo BRB.
  • O deputado Cláudio Cajado (PP-BA) articulou um projeto para permitir ao Congresso destituir diretores do Banco Central — investida interpretada como tentativa de coação institucional.
  • O Rioprevidência, fundo de previdência do Rio de Janeiro controlado politicamente pelo União Brasil, aportou R$ 2,6 bilhões no Master.

Todos negam interferência.

Consultorias milionárias e acesso ao núcleo do Poder Executivo

Para expandir influência no governo federal, Vorcaro contratou:

  • Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda, com quem passou a ter trânsito em reuniões com autoridades;
  • Michel Temer e Henrique Meirelles, figuras com interlocução privilegiada no meio político e financeiro.

Os gastos do Master com consultorias saltaram para R$ 580 milhões em 2024, valor 75% superior ao de 2023.

Entre os escritórios contratados está o Barci de Moraes, de Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes. A banca não atua no STF e não há indício de irregularidades.

A presença de Lewandowski e a mansão de Brasília

Após deixar o STF, Ricardo Lewandowski integrou o conselho consultivo do Master, antes de assumir o Ministério da Justiça.

Buscando consolidar sua posição no círculo de poder, Vorcaro comprou uma mansão de R$ 36 milhões no Lago Paranoá, transformada em ponto de encontro com autoridades e consultores estratégicos.

Liquidação extrajudicial, colapso regulatório e bloqueio de bens

A emissão de títulos falsos, a deterioração financeira e as operações suspeitas com o BRB levaram o Banco Central a decretar, no mesmo dia da prisão, a liquidação extrajudicial do Master. A decisão bloqueou bens dos controladores e afastou administradores.

A crise desencadeou debates sobre captura regulatória, fragilidade de supervisão bancária e interferência política em instituições de controle.

Desinformação e o caso Viviane Barci de Moraes

Após a operação, circularam nas redes sociais boatos associando a advogada Viviane Barci de Moraes ao suposto esquema. A checagem do Projeto Comprova constatou:

  • não há indícios de participação de Viviane em irregularidades;
  • o escritório Barci de Moraes atuou em poucos processos isolados;
  • Alexandre de Moraes não mandou remover conteúdos relacionados ao caso;
  • conteúdos citando a advogada seguem amplamente acessíveis.

O STF confirmou não ter registros de pedidos de censura.

As medidas cautelares impostas a Vorcaro

A decisão do TRF-1 determinou que o banqueiro deve cumprir:

  • tornozeleira eletrônica;
  • entrega e retenção dos passaportes;
  • proibição de contato com investigados ou funcionários ligados ao Master;
  • proibição de deixar o município de residência sem autorização judicial.

Outros quatro executivos também foram beneficiados.

Poder, influência e vulnerabilidades históricas

O caso Daniel Vorcaro sintetiza o entrelaçamento, antigo no Brasil, entre interesses privados, agentes políticos e estruturas do Estado. A operação da PF revela como bancos médios, amparados por redes políticas e jurídicas, conseguem operar à margem da supervisão, aumentando riscos sistêmicos e criando zonas de opacidade institucional.

A contratação de ex-ministros e consultores com forte capital político não constitui crime, mas reforça a percepção pública de promiscuidade entre negócios privados e decisões de Estado. O episódio expõe a urgência de:

  • fortalecer a supervisão bancária,
  • ampliar a transparência sobre fundos públicos,
  • aprimorar mecanismos que blindem instituições reguladoras contra pressões políticas e partidárias.

A libertação de Vorcaro, embora respaldada juridicamente, mantém em aberto o debate nacional sobre responsabilização, blindagem institucional e os limites aceitáveis de influência política no sistema financeiro.


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