O banqueiro Daniel Vorcaro, dono do Banco Master, deixou na manhã deste sábado (29/11/2025) o Centro de Detenção Provisória 2 de Guarulhos (SP) após decisão liminar da desembargadora Solange Salgado, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que substituiu a prisão preventiva por medidas cautelares. Vorcaro estava detido desde o dia 17, quando foi preso no aeroporto de Guarulhos ao embarcar para Dubai, no contexto da Operação Compliance Zero, da Polícia Federal.
A decisão judicial, expedida na noite de sexta-feira (28), determinou o uso de tornozeleira eletrônica, entrega dos passaportes e outras restrições. A magistrada afirmou que, embora as suspeitas sejam graves, as medidas alternativas são suficientes, sobretudo após a defesa comprovar que o banqueiro havia comunicado previamente ao Banco Central a viagem aos Emirados Árabes Unidos para tratar da possível venda do Master.
A soltura ocorre em meio ao colapso institucional e regulatório do Banco Master, cuja liquidação extrajudicial foi decretada pelo Banco Central após investigações que apontaram emissão de títulos de crédito falsos, pressões sobre reguladores e operações suspeitas que somam mais de R$ 12 bilhões.
A prisão e a soltura: a ofensiva judicial e a reviravolta no TRF-1
Vorcaro foi preso no dia 17 de novembro de 2025, durante tentativa de embarque internacional. A primeira decisão de habeas corpus havia sido negada pela própria desembargadora Solange Salgado, que considerou existir risco de ocultação de provas e movimentação financeira para obstrução da investigação. A defesa insistiu e, na reconsideração, a magistrada entendeu que o controle judicial poderia ser garantido por meios menos gravosos.
A defesa, liderada por Pierpaolo Bottini, Roberto Podval, Walfrido Warde e Sergio Leonardo, afirma que o empresário ainda avalia se permanece em São Paulo. A equipe também acionou o Supremo Tribunal Federal, sustentando que a Justiça Federal de primeira instância não seria competente para conduzir o caso; o pedido está sob análise do ministro Dias Toffoli. Neste sábado (29/11), imagens registradas na saída da unidade prisional mostram o banqueiro escoltado por agentes armados, em ambiente controlado pela Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo.
A Operação Compliance Zero e o início da derrocada
Deflagrada em 18 de novembro de 2025, a operação da Polícia Federal atingiu diretamente o núcleo de decisões que sustentava a expansão agressiva do Banco Master. Segundo as investigações, o banco:
- emitiu títulos de crédito falsos;
- ofereceu rendimentos artificiais acima de 40% do mercado;
- realizou operações que somam R$ 12,2 bilhões com o Banco de Brasília (BRB);
- pressionou órgãos reguladores para evitar intervenção;
- usou uma estrutura de consultorias milionárias para acessar autoridades, empresários e agentes públicos de alto escalão.
As diligências envolveram cinco prisões preventivas, duas temporárias e 25 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Distrito Federal.
O juiz de primeira instância justificou a prisão afirmando que os investigados poderiam manipular ou ocultar provas, além de realizar novas operações financeiras para dificultar o rastreamento dos crimes.
Rede de influência política e jurídica: como Daniel Vorcaro construiu proteção, acesso e poder em Brasília
A investigação revelou que o Banco Master não cresceu apenas por alavancagem financeira. Sustentou-se, por anos, sobre uma rede de influência que conectava parlamentares, ministros, ex-ministros, consultores e estruturas sensíveis do Estado brasileiro.
Segundo relatos obtidos pela PF, Vorcaro repetia a frase: “no Brasil, não se anda sem proteção política”, usada para justificar sua estratégia de alianças.
Trânsito no Congresso: Ciro Nogueira, União Brasil e fundos públicos
Vorcaro mantinha proximidade com Ciro Nogueira (PP-PI), classificada em relatórios como “grande amizade”. Outros movimentos revelam o interesse político em torno do Master:
- Em 2024, Ciro propôs elevar de R$ 250 mil para R$ 1 milhão o teto de cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), medida que beneficiaria bancos médios.
- Deputados do PP e União Brasil pressionaram o Banco Central para liberar a compra do Master pelo BRB.
- O deputado Cláudio Cajado (PP-BA) articulou um projeto para permitir ao Congresso destituir diretores do Banco Central — investida interpretada como tentativa de coação institucional.
- O Rioprevidência, fundo de previdência do Rio de Janeiro controlado politicamente pelo União Brasil, aportou R$ 2,6 bilhões no Master.
Todos negam interferência.
Consultorias milionárias e acesso ao núcleo do Poder Executivo
Para expandir influência no governo federal, Vorcaro contratou:
- Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda, com quem passou a ter trânsito em reuniões com autoridades;
- Michel Temer e Henrique Meirelles, figuras com interlocução privilegiada no meio político e financeiro.
Os gastos do Master com consultorias saltaram para R$ 580 milhões em 2024, valor 75% superior ao de 2023.
Entre os escritórios contratados está o Barci de Moraes, de Viviane Barci de Moraes, esposa do ministro Alexandre de Moraes. A banca não atua no STF e não há indício de irregularidades.
A presença de Lewandowski e a mansão de Brasília
Após deixar o STF, Ricardo Lewandowski integrou o conselho consultivo do Master, antes de assumir o Ministério da Justiça.
Buscando consolidar sua posição no círculo de poder, Vorcaro comprou uma mansão de R$ 36 milhões no Lago Paranoá, transformada em ponto de encontro com autoridades e consultores estratégicos.
Liquidação extrajudicial, colapso regulatório e bloqueio de bens
A emissão de títulos falsos, a deterioração financeira e as operações suspeitas com o BRB levaram o Banco Central a decretar, no mesmo dia da prisão, a liquidação extrajudicial do Master. A decisão bloqueou bens dos controladores e afastou administradores.
A crise desencadeou debates sobre captura regulatória, fragilidade de supervisão bancária e interferência política em instituições de controle.
Desinformação e o caso Viviane Barci de Moraes
Após a operação, circularam nas redes sociais boatos associando a advogada Viviane Barci de Moraes ao suposto esquema. A checagem do Projeto Comprova constatou:
- não há indícios de participação de Viviane em irregularidades;
- o escritório Barci de Moraes atuou em poucos processos isolados;
- Alexandre de Moraes não mandou remover conteúdos relacionados ao caso;
- conteúdos citando a advogada seguem amplamente acessíveis.
O STF confirmou não ter registros de pedidos de censura.
As medidas cautelares impostas a Vorcaro
A decisão do TRF-1 determinou que o banqueiro deve cumprir:
- tornozeleira eletrônica;
- entrega e retenção dos passaportes;
- proibição de contato com investigados ou funcionários ligados ao Master;
- proibição de deixar o município de residência sem autorização judicial.
Outros quatro executivos também foram beneficiados.
Poder, influência e vulnerabilidades históricas
O caso Daniel Vorcaro sintetiza o entrelaçamento, antigo no Brasil, entre interesses privados, agentes políticos e estruturas do Estado. A operação da PF revela como bancos médios, amparados por redes políticas e jurídicas, conseguem operar à margem da supervisão, aumentando riscos sistêmicos e criando zonas de opacidade institucional.
A contratação de ex-ministros e consultores com forte capital político não constitui crime, mas reforça a percepção pública de promiscuidade entre negócios privados e decisões de Estado. O episódio expõe a urgência de:
- fortalecer a supervisão bancária,
- ampliar a transparência sobre fundos públicos,
- aprimorar mecanismos que blindem instituições reguladoras contra pressões políticas e partidárias.
A libertação de Vorcaro, embora respaldada juridicamente, mantém em aberto o debate nacional sobre responsabilização, blindagem institucional e os limites aceitáveis de influência política no sistema financeiro.
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