Reindustrialização em curso: Petrobras e FMM lideram retomada da construção naval e reposicionam o Brasil no mapa da engenharia pesada; Estaleiro da Bahia ganha destaque 

O Estaleiro Enseada, no Recôncavo Baiano, e o Polo Naval de Rio Grande (RS) voltam à operação em um novo ciclo de investimentos da Petrobras e do Fundo da Marinha Mercante (FMM). Com foco em conteúdo local, inovação tecnológica e sustentabilidade, o país busca recuperar protagonismo na indústria naval e offshore.

A Petrobras e o Fundo da Marinha Mercante (FMM) impulsionam um novo ciclo de reindustrialização naval no Brasil, com mais de R$ 10 bilhões em projetos ativos para construção de embarcações híbridas, barcaças e sistemas de apoio offshore. O movimento consolida o Estaleiro Enseada (BA) e o Polo Naval de Rio Grande (RS) como eixos da retomada da engenharia pesada nacional, com foco em conteúdo local, eficiência energética e geração de empregos qualificados.

O novo ciclo da indústria naval brasileira

Petrobras redefine a política de afretamento

Após uma década de retração, a Petrobras reestruturou seus contratos de afretamento de embarcações de apoio com metas obrigatórias de conteúdo local de 40%, mobilização de até quatro anos e afretamento firme por 12 anos. O modelo confere previsibilidade às empresas e reduz os riscos de descontinuidade — um dos gargalos históricos do setor.

Os primeiros contratos dessa nova fase contemplam 12 embarcações OSRV/PSV-OSRV, sendo seis delas construídas na Bahia, no Estaleiro Enseada, e outras seis em estaleiros do Rio Grande do Sul e do Norte. A Petrobras também prevê novas licitações em 2026 para ampliar a frota de apoio logístico e resposta ambiental.

Fundo da Marinha Mercante garante financiamento estratégico

O FMM, gerido pelo Ministério de Portos e Aeroportos, aprovou em 2025 R$ 4 bilhões em financiamentos prioritários para projetos navais e offshore, entre eles o programa de OSRVs híbridos da Petrobras e as barcaças mineraleiras da LHG Mining.
A Resolução CDFMM nº 228/2025, publicada em setembro, assegura prioridade de crédito para as construções realizadas em território nacional, fortalecendo a cadeia produtiva e reativando empresas de aço, válvulas, eletrônicos e pintura naval.

Enseada e LHG Mining: o eixo Bahia–Centro-Oeste da nova industrialização

80 barcaças e seis navios híbridos ampliam a carteira do Enseada

Localizado em Maragogipe (BA), o Estaleiro Enseada vive o momento mais dinâmico desde 2014. Além dos seis OSRVs híbridos para a Petrobras, o estaleiro executará, junto à Tenenge, o contrato para 80 barcaças da LHG Mining, com investimento estimado em R$ 2,6 bilhões apenas na Bahia.

Cada barcaça terá capacidade para transportar 2.900 toneladas de minério, integrando o sistema Corumbá–Porto de Santos via hidrovia Paraguai–Paraná. A iniciativa reduz custos logísticos e emissões de carbono, alinhando-se à agenda de transporte sustentável e transição energética.

Impacto social e econômico no Recôncavo Baiano

O programa já movimenta o mercado de trabalho do Recôncavo, com a abertura de 300 empregos diretos e até 900 indiretos. Além da força de trabalho, o projeto reativa pequenas e médias empresas que atuam em serviços de corte, soldagem, manutenção, galvanização e pintura industrial.
Para a região, que enfrentou anos de desmobilização, o retorno do estaleiro representa estabilidade econômica e valorização da mão de obra técnica local.

O papel do Grupo Novonor e da Tenenge na engenharia nacional

Histórico e experiência internacional

A Tenenge, empresa de engenharia do Grupo Novonor, é parceira executiva nos dois programas — LHG Mining e Petrobras. Com 80 anos de atuação, a empresa acumula experiência em plataformas, refinarias e plantas petroquímicas no Brasil e no exterior, com destaque para obras em Angola e Moçambique.

Essa aliança resgata a tradição da engenharia nacional, combinando capacidade técnica, qualificação de pessoal e integração industrial, pilares fundamentais para reduzir dependência externa e aumentar a competitividade do setor.

Sinergia industrial e logística

O Terminal de Uso Privado (TUP) do Enseada amplia a eficiência logística do estaleiro, operando tanto embarques de granéis minerais e agrícolas quanto componentes de energia renovável, como pás e torres eólicas.
Essa convergência entre indústria naval, mineração e energia limpa cria um ecossistema industrial diversificado, com potencial de atrair investimentos complementares do Novo PAC e do BNDES.

Sustentabilidade e inovação tecnológica

Propulsão híbrida e eficiência energética

Os OSRVs híbridos da Petrobras serão equipados com sistemas da Wärtsilä e Kongsberg, permitindo operação elétrica em baixa velocidade e redução de até 20% nas emissões.
Essa modernização tecnológica representa o ingresso do Brasil na era da descarbonização naval, uma das exigências para contratos internacionais de operação offshore.

Hidrovias e redução de emissões

A LHG Mining, ao optar pelo modal hidroviário, estima redução de até 70% das emissões de CO₂ em comparação ao transporte rodoviário. Essa mudança fortalece a agenda ambiental corporativa, um dos requisitos de investidores e fundos internacionais de infraestrutura.

Desafios e governança

Gestão contratual e compliance industrial

Apesar dos avanços, a reindustrialização naval brasileira enfrenta riscos conhecidos: atrasos de cronograma, inflação de insumos e dependência de poucos fornecedores nacionais.
Especialistas defendem auditorias independentes, planejamento orçamentário rigoroso e transparência contratual para assegurar sustentabilidade dos projetos a longo prazo.

Capacitação e transição geracional

O setor naval brasileiro perdeu, entre 2015 e 2020, cerca de 40 mil profissionais qualificados.
A retomada exige formação técnica contínua e programas de requalificação, com foco em soldagem automatizada, corte digital e manutenção offshore, áreas críticas para atender os novos contratos.

O simbolismo da retomada

Bahia e Rio Grande do Sul voltam ao mapa da engenharia pesada

A reativação dos polos de Maragogipe (BA) e Rio Grande (RS) simboliza o retorno da engenharia pesada nacional ao centro da política industrial.
O movimento também reposiciona o Brasil no mercado global de construção naval e offshore, com foco em autonomia tecnológica, empregos qualificados e sustentabilidade.

visão estratégica de Estado

A retomada da indústria naval brasileira combina visão estratégica de Estado e interesse econômico estruturante. O modelo Petrobras–FMM–Enseada reúne financiamento público, inovação tecnológica e geração de empregos, mas seu sucesso dependerá da governança contratual e da disciplina fiscal.

O desafio é evitar que o ciclo se repita em espasmos de investimento e desmobilização. A industrialização sustentável, com controle de custos, prazos e qualidade, é o caminho para transformar o atual ciclo em política de Estado perene — e não em um novo ciclo de euforia passageira.


Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe to get the latest posts sent to your email.

Facebook
Threads
WhatsApp
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading

Privacidade e Cookies: O Jornal Grande Bahia usa cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com o uso deles. Para saber mais, inclusive sobre como controlar os cookies, consulte: Política de Cookies.