Em artigo publicado no Poder360, José Paulo Kupfer analisa os desafios enfrentados pelo governo Lula em sua terceira gestão, com foco no aparente descompasso entre os resultados concretos de suas políticas e a percepção popular. Kupfer argumenta que o problema não se limita à comunicação, mas reflete uma perda mais ampla de credibilidade, evidenciada por campanhas de desinformação, como a recente polêmica em torno da suposta “taxação do Pix”.
Um dos episódios mais emblemáticos desse cenário foi a disseminação de um vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), que acumulou mais de 300 milhões de visualizações — um recorde nacional. No vídeo, o deputado acusa o governo de querer monitorar as transações financeiras de pequenos trabalhadores informais “como se fossem grandes sonegadores”. Apesar das inverdades apresentadas, a mensagem encontrou ressonância em parte do público, fortalecendo a narrativa de que o governo não é confiável.
O contexto e as inverdades veiculadas
Ferreira inicia o vídeo sugerindo que o governo pretende fiscalizar pequenas movimentações financeiras, inclusive via Pix, algo que o governo negou reiteradamente. Ele compara a suposta nova medida com a tributação de compras da China, insinuando que promessas não cumpridas pelo presidente Lula seriam a norma. Entretanto, Kupfer ressalta que a medida mencionada pelo deputado não é nova, mas apenas amplia as instituições financeiras obrigadas a informar movimentações acima de um limite especificado. Além disso, essa mudança exclui os pequenos trabalhadores informais do escopo da fiscalização.
O artigo expõe ainda a contradição do deputado, que acusa o governo de quebra de promessas enquanto omite que votou a favor da tributação de produtos importados, como as compras da China. Essa abordagem seletiva reforça uma narrativa distorcida sobre as intenções do governo.
Manipulações e desinformacão
Ferreira também apresenta outras inverdades, como a afirmação de que os Microempreendedores Individuais (MEIs) seriam tributados nas mesmas alíquotas dos contribuintes que pagam 27,5% de Imposto de Renda. Kupfer esclarece que a legislação dos MEIs segue regras específicas e oferece amplas isenções para estimular a formalização de trabalhadores informais.
Outro ponto levantado pelo deputado é a suposta quebra de sigilo bancário promovida pela Receita Federal. Na realidade, a coleta de informações financeiras para combater a sonegação não constitui quebra de sigilo, pois não inclui detalhes como destinatários ou remetentes das transações. Kupfer sublinha que o objetivo dessa medida é exclusivamente identificar inconsistências entre renda declarada e patrimônio acumulado, com foco em grandes sonegadores.
Impactos sociais e econômicos da desinformação
A desinformação disseminada por Ferreira prejudica não apenas o debate público, mas também a percepção sobre as políticas fiscais. Ao apresentar os trabalhadores informais como alvos da fiscalização, o deputado desvia o foco dos grandes sonegadores, que são os verdadeiros beneficiários da ausência de regulação sobre bancos digitais e fintechs. Kupfer argumenta que a omissão na fiscalização resulta em menos arrecadação e, consequentemente, na redução de recursos para serviços públicos essenciais, afetando principalmente as populações mais vulneráveis.
O autor também alerta para as implicações de se ignorar a sonegação em larga escala. Quando os grandes sonegadores permanecem impunes, a carga tributária é transferida para aqueles que não têm como evitá-la, como trabalhadores formais. Além disso, os programas sociais sofrem cortes, aprofundando as desigualdades.
Licoes para o governo
Kupfer conclui que o governo Lula deve aprender com esse episódio e adotar uma estratégia mais consistente de comunicação. Anúncios precipitados de medidas que não possam ser efetivamente implementadas só agravam a percepção de falta de credibilidade. Para enfrentar as campanhas de desinformação, o governo precisa reforçar a transparência e destacar os benefícios concretos de suas políticas para a população.
A matéria, publicada em 2023, é um convite à reflexão sobre a responsabilidade do poder público e das lideranças políticas em promover um debate honesto e fundamentado. A manipulação de dados e a propagação de mentiras não apenas enfraquecem o governo, mas também comprometem a democracia e a justiça fiscal no país.
*José Paulo Kupfer, de 76 anos, é jornalista profissional com 57 anos de carreira. Desde 1999, escreve artigos de análise econômica e foi colunista em veículos como Gazeta Mercantil, Estado de S. Paulo e O Globo. É o idealizador do Caderno de Economia do Estadão, lançado em 1989. Kupfer é graduado em economia pela Faculdade de Economia da USP.
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