O rombo na Previdência | Por Luiz Holanda

A Operação Sem Desconto, deflagrada pela Polícia Federal e CGU, revelou um esquema de descontos ilegais em contracheques de aposentados e pensionistas do INSS, com rombo estimado em R$ 6,3 bilhões. Associações, como o Sindnapi, cobravam mensalidades sem autorização dos beneficiários. A investigação atinge servidores públicos, entidades sindicais e coloca em foco o ministro Carlos Lupi. O ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, foi afastado após denúncias e investigações.
Esquema desviou valores de aposentadorias por meio de associações fraudulentas. PF e CGU apontam rombo de R$ 6,3 bilhões e envolvimento de entidades ligadas a sindicalistas.

O rombo é muito maior, mas o que foi encontrado nos descontos indevidos nos contracheques dos aposentados e pensionistas do INSS é de estarrecer. Chega a R$ 6,3 bilhões, conforme a operação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU). Dizem que o Presidente do Instituto, Alessandro Stefanutto, foi demitido por ordem do presidente Lula da Silva, mas, segundo o ministro da Previdência, Carlos Lupi, que o indicou, ele pediu demissão. Stefanutto já havia sido afastado da função pela Justiça por seis meses, após a PF e a CGU descobrirem a fraude.

De acordo com as investigações, os suspeitos cobravam mensalidades irregulares, descontadas dos benefícios de aposentados e pensionistas sem a autorização deles. O esquema consistia em descontar dos aposentados e pensionistas do INSS valores mensais como se eles tivessem se tornado membros de associações de aposentados, sem que os mesmos tenham se associados ou autorizados os descontos. Segundo o ministro da CGU, Vinícius de Carvalho, as associações envolvidas diziam prestar serviços como assistência jurídica para aposentados e ofereciam descontos em mensalidades de academias e planos de saúde, por exemplo, mas não tinham estrutura para tanto. Ao todo, 11 entidades foram alvos das medidas judiciais. Uma delas é o Sindicato Nacional dos Aposentados (Sindnapi), que tem como vice-presidente o irmão do presidente Lula, José Ferreira da Silva, conhecido como Frei Chico. Stefanutto teria agido para liberar o desconto em folha de aposentados mesmo após uma série de denúncias na imprensa.

A fraude revelada pela Operação Sem Desconto não é nenhuma novidade. Advogados que atuam no setor e a própria Justiça já tinham conhecimento do fato. O presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, Diego Cherulli, disse que o sistema de descontos ilegais de aposentados e pensionistas é coisa antiga, e que há muitas barreiras para os segurados reaverem o dinheiro descontado dos seus benefícios. Em outras palavras, isso significa que vai ser difícil os aposentados e pensionistas terem o seu dinheiro de volta: “muitas fraudes ocorriam no mês de reajuste do benefício para o aposentado não perceber. Em muitos casos, o primeiro desconto dessas entidades ocorreu em fevereiro de 2024. É o mês em que é paga a folha de janeiro. A folha de janeiro é a que tem o reajuste anual do INSS. Então as pessoas não percebiam que junto com o reajuste vinha um desconto ilegal e pequeno”, afirmou Cherulli.

A Polícia Federal cumpriu seis mandados de prisão temporárias e 211 mandados judiciais de busca e apreensão e ordens de sequestro de bens num valor superior a R$ 1 bilhão. Foram afastados seis servidores públicos de suas funções. Também houve busca e apreensão na Diretoria de Benefícios do INSS. Os crimes dos envolvidos são de corrupção ativa, passiva, violação de sigilo funcional, falsificação de documento, organização criminosa e lavagem de capitais. Apesar desses crimes, ninguém, no final, ficará preso. Pode até haver alguma prisão, mas será temporária.

Não é sem razão, pois, que a arrecadação dos sindicatos por meio de mensalidades ilegalmente descontadas dos benefícios previdenciários cresceu de forma gigantesca nos últimos dois anos. Só em 2022 esse tipo de desconto nas aposentadorias e pensões chegou a R$ 30,7 milhões. No ano passado o número quase triplicou, alcançando R$ 88,6 milhões arrecadados por 37 entidades. O desconto sindical no INSS é uma mensalidade associativa que pode ser cobrada de aposentados e pensionistas. O desconto necessita de prévia autorização expressa do titular do benefício previdenciário. Em 2024 ganharam destaque as queixas de beneficiários que descobriram descontos em suas folhas de pagamento sem jamais terem se associado às entidades.

Lula bem que poderia perceber que isso aconteceria, pois o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, quando ocupou o cargo de Ministro do Trabalho no governo Dilma Roussef, foi obrigado a deixar o cargo após ficar mais de um mês sob denúncias de irregularidades em convênios firmados pela pasta com Organizações Não-Governamentais (ONGs). Segundo as acusações, assessores do ministro cobravam propina para resolver pendências de ONGs com o ministério. Tudo com o conhecimento de Lupi, segundo a imprensa. A situação do ministro se agravou com a divulgação dessas notícias. Sua saída da pasta do Trabalho foi recomendada pela Comissão de Ética da Presidência, após entender “que ele não tinha explicado a base das acusações, que era a série de convênios irregulares firmados com pessoas do seu partido”, afirmou Sepúlveda Pertence, que presidi a Comissão na época. O problema é que Lula tem medo de Lupi.

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.


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