Excesso de jornada é causa de 40% dos acidentes nas estradas brasileiras, alerta especialista Joseval Carneiro

A fadiga de motoristas profissionais é responsável por até 40% dos acidentes nas estradas brasileiras, segundo especialistas. O sono insuficiente reduz reflexos e atenção, transformando caminhões e ônibus em armas em movimento. A solução proposta inclui descanso obrigatório, fiscalização eletrônica e políticas empresariais humanizadas para evitar tragédias recorrentes.
Especialista alerta que 40% dos acidentes rodoviários decorrem de fadiga e jornadas abusivas. Proposta de sensor eletrônico pode reduzir tragédias nas estradas brasileiras.

O excesso de jornada entre motoristas de caminhão e ônibus é um dos principais fatores por trás dos acidentes rodoviários no Brasil. Estimativas indicam que 40% dos sinistros decorrem de fadiga e déficit de sono, resultado direto de longas horas ao volante e da pressão por prazos de entrega.

Na tentativa de cumprir rotas extenuantes, muitos motoristas chegam a dirigir sem descanso suficiente, colocando em risco não apenas suas próprias vidas, mas também a dos demais usuários das rodovias. A prática de utilizar estimulantes — conhecidos como “rebite” — já não surte efeito diante da exaustão extrema.

Déficit de sono compromete atenção e reflexos

De acordo com especialistas em Medicina do Tráfego, o sono é fator determinante para a manutenção da consciência e dos reflexos. Após 16 a 20 horas sem dormir, o cérebro entra em estado de colapso cognitivo, equiparável ao de uma pessoa alcoolizada.

Conforme alerta o jurista e ex-diretor do Detran/DF, Joseval Carneiro, “sem dormir de 5 a 8 horas, o motorista perde a consciência plena, e a 100 km/h, bastam frações de segundo para uma tragédia ocorrer”. A Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet) destaca que a fadiga reduz a atenção, atrasa o tempo de frenagem e compromete a visão, sobretudo em viagens noturnas.

Medidas preventivas e responsabilidade empresarial

Paradas programadas a cada duas horas de viagem podem atenuar o problema, mas não eliminam o risco do sono acumulado. Segundo Carneiro, apenas o descanso contínuo, entre sete e oito horas, é capaz de garantir segurança.

Empresas com políticas de prevenção, como a antiga Translor (SP), realizavam visitas de surpresa aos motoristas para avaliar condições físicas, emocionais e familiares. O objetivo era identificar sinais de fadiga antes que se convertessem em acidentes fatais.

Apesar de iniciativas pontuais, parte do empresariado ainda prioriza lucros sobre a segurança, pressionando motoristas a cumprir metas ilegais de jornada. Essa cultura, segundo o especialista, “revela desprezo pela vida humana e desconhecimento da responsabilidade social que o transporte de cargas e passageiros exige”.

Proposta de fiscalização eletrônica obrigatória

Para reduzir o número de acidentes, Joseval Carneiro defende uma Resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) que torne obrigatória a instalação, de fábrica, de dispositivos eletrônicos de monitoramento da visão.

Esses sensores detectariam sinais de sonolência e acionariam alertas sonoros para despertar o condutor antes de uma perda total de controle do veículo. O uso de tecnologia é visto como medida de caráter preventivo, complementando a fiscalização de jornada e o cumprimento da legislação trabalhista.

Sono ao volante, tragédia silenciosa

A tragédia silenciosa causada pelo sono ao volante reflete uma falha estrutural na política de transporte e nas relações trabalhistas do setor rodoviário. Enquanto o país mantém rodovias mal iluminadas, pedágios caros e falta de fiscalização efetiva sobre o tempo de direção, empresas continuam exigindo metas incompatíveis com a fisiologia humana.

A ausência de um sistema nacional de monitoramento de fadiga, aliado à impunidade dos empregadores que impõem jornadas abusivas, perpetua um ciclo de mortes evitáveis. A proposta de Carneiro expõe o dilema entre tecnologia e responsabilidade: o alarme eletrônico pode salvar vidas, mas sem mudança de cultura empresarial e fiscalização pública, será apenas um paliativo diante da ganância que move parte do setor.

Perfil do autor

Joseval Carneiro (joseval@plenus.neté ex-diretor do DETRAN-DF e do Conselho Estadual de Trânsito da Bahia, delegado de Polícia aposentado com especialização nos Estados Unidos, membro da Associação Bahiana de Imprensa (ABI) e vice-presidente da Academia de Cultura da Bahia.


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