Capítulo XCIII do Caso Faroeste: Como o Poder Judiciário Estadual da Bahia ignora a existência de ação de ‘Querela Nullitatis’ e evita reconhecer a falsidade das matrículas cartoriais de nº 726 e 727 da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Documentos usados por David Czertok e Albertoni de Lemos Bloisi resultaram nos fraudulentos registros cartoriais de nº 726 e 727 usados pelo Grupo Econômico dos Okamoto e sucessores, como forma de manutenção da posse sobre as terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto.
Documentos usados por David Czertok e Albertoni de Lemos Bloisi resultaram nos fraudulentos registros cartoriais de nº 726 e 727 usados pelo Grupo Econômico dos Okamoto e sucessores, como forma de manutenção da posse sobre as terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto.

A discussão sobre quem é o verdadeiro proprietário das terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto, na região oeste da Bahia e qual é a matrícula correta que garante a propriedade da área é uma discussão que se alonga no Poder Judiciário Estadual da Bahia por cerca de três décadas e está documentada, em parte, na Ação de Reintegração de Posse de nº 0000157-61.1990.8.05.0081, que tem como litigante o empresário de Barreiras José Valter Dias e litigados o Grupo Econômico dos Okamoto e sucessores e cuja investigação resultou no Caso Faroeste.

Em 12 de dezembro de 2017, o advogado Domingos Bispo (OAB Bahia nº 36.948), na condição cessionário, terceiro interessado e representante de parte dos herdeiros do casal Suzano Ribeiro de Souza e Maria da Conceição Ribeiro, ingressou no Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) com ‘Agravo de Instrumento’ de nº 0028046-91.2017.8.05.0000 contra José Valter Dias, Grupo Econômico dos Okamoto e outros.

Em 6 de junho de 2022, ao julgar ‘Agravo de Instrumento’ apresentado pelo advogado Domingos Bispo, a Primeira Câmara Cível do TJBA, sob a relatoria da desembargadora Silvia Carneiro Santos Zarif, com votos da desembargadora Maria de Lourdes Pinho Medauar e do juiz convocado Gustavo Silva Pequeno, concedeu decisão liminar favorável ao pleito apresentado pelo advogado concedendo-lhe direito sobre as terras da antiga Fazenda São José, mas não a posse sobre a propriedade rural, cuja extensão é avaliada em cerca de 360 mil hectares.

Em síntese, atualmente, três ‘núcleos’ discutem a titularidade das terras da Fazenda São José. O primeiro é José Valter Dias, que afirma ter adquirido as terras do inventário de Delfino Ribeiro, conforme registrado na matrícula cartorial de nº 1037. O segundo núcleo é composto pelo Grupo Econômico dos Okamoto e sucessores, dentre as quais se insere a empresa Bom Jesus Agropecuária Ltda, que alega ter a propriedade assegurada com baseada nas matrículas cartoriais de nº 726 e 727. Por fim, tem-se o núcleo composto por Domingos Bispo, que alega ter adquirido o direito sobre as terras com a aquisição dos verdadeiros sucessores do casal Suzano Ribeiro de Souza e Maria da Conceição Ribeiro, ambos, mortos, a cerca de um século, sendo que, à época, eram os detentores da matrícula cartorial de nº 54.

Conforme análise do jurista que acompanha o Caso Faroeste para o Jornal Grande Bahia (JGB), dos três núcleos que disputam as terras, apenas um deles se tem certeza de que não pode ser o verdadeiro dono, pois porta um título fraudado com base em uma certidão de óbito falsa. O Grupo Econômico dos Okamoto e sucessores compraram um título de propriedade fundamentado em uma fraude, além de terem adquirido terras que eram objeto de litígio judicial.

As matrículas cartoriais de nº 726 e 727 têm origem em uma fraude processual que envolve David Czertok e Albertoni de Lemos Bloisi. A partir de uma falsa certidão de óbito emitida em 15 de outubro de 1977, à requerimento de “pessoa interessada”, o Cartório de Registro Civil da Comarca de Corrente, no Piauí, expediu Certidão de Óbito, na qual consta o falecimento de Suzano Ribeiro de Souza com a data de em 14 de março de 1894, ou seja, mais de 4 anos depois do registro original da certidão de óbito. No documento fraudado é registrado que “o extinto, não deixando testamento, deixando bens a arrolar, deixando uma filha de nome Joana Francisca Ribeiro”.

Ocorre que, de fato e de direito:

— Em 20 de junho de 1887, Suzano Ribeiro de Souza adquiriu as terras da Fazenda São José de Anna Felícia de Souza Miranda. Este fato consta no Registro Cartorial de nº 54, lavrado no antigo livro de Transcrição dos Imóveis, no qual está lançada a compra e venda da Fazenda São José, pelo Tabelionato de Notas da Comarca de Santa Rita de Cássia. Na época, a Comarca abrangia, também, o município de Formosa do Rio Preto.

— Em janeiro de 1890, morre Suzano Ribeiro de Souza e em 18 de fevereiro de 1890 é iniciado o processo de inventário dos bens.

— Em 1908, faleceu Maria da Conceição Ribeiro, viúva de Suzano Ribeiro de Souza e um novo inventário foi aberto.

— O casal deixou como herdeiros Antônia Ribeiro de Souza (à época, casada com Luiz Ribeiro de Souza); Raimundo Ribeiro de Souza, 18 anos; Joana Ribeiro de Souza, 17 anos; Maria Ribeiro de Souza, 8 anos; e Domingos Suzano Ribeiro, 6 anos.

Retomando a atuação de David Czertok e Albertoni de Lemos Bloisi na produção das fraudulentas matrículas cartoriais de nº 726 e 727, foi registrado que com falecimento de Suzano Ribeiro de Souza, as terras da antiga Fazenda São José teriam sido passadas apenas para Maria da Conceição Ribeiro e para a filha do casal, Joana Ribeiro de Souza. Ainda, com o falecimento de Maria em 1908, todos os bens teriam sido repassados para a única filha, Joana.

Ato contínuo, munidos da certidão de óbito fabricada 87 anos depois da morte de Suzano Ribeiro de Souza, David Czertok e Albertoni de Lemos Bloisi deram entrada em um novo inventário dos bens do casal Ribeiro, cuja única filha herdeira seria Joana Ribeiro de Souza, na condição de c.

Neste sentido, eles teriam adquirido as terras através de Cessão e Transferência de Direitos Hereditários dos supostos herdeiros de Joana e com este documento deram entrada no processo de inventário de Suzano e de Maria da Conceição em Santa Rita de Cássia. Extrai-se, então, que mais de 87 anos depois da morte real de Suzano Ribeiro de Souza, foi dado início ao processo de inventário, tendo sido David Czertok o inventariante, ou seja, o responsável por arrolar e administrar os bens oriundos do espólio de Suzano Ribeiro de Souza.

A falsidade do atestado de óbito foi declarada por meio de decisão judicial transitada em julgada no Poder Judiciário Estadual do Piauí (PJPI). Não há mais como se questionar a decisão proferida e o atestado de óbito utilizado por David Czertok e Albertoni de Lemos Bloisi é falso, bem como é fraudulento todos os documentos e títulos produzidos a partir desta falsidade.

O CJN reconhece a falsidade

Segundo jurista que acompanha o Caso Faroeste para o Jornal Grande Bahia (JGB), o próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ) reconheceu a falsidade documental que deu origem às matrículas nº 726 e 727, mas definiu que a nulidade no processo de inventário aberto pelos grileiros apenas pode ser reconhecida por meio de decisão judicial.

Atualmente, existem duas ações judiciais que, atendendo ao comando do Conselho Nacional de Justiça, permitem o reconhecimento da nulidade do inventário fraudado. Tais ações são do tipo ‘Querela Nullitatis (nulidade do litígio)’. O instrumento jurídico é cabível contra decisões judiciais transitadas e julgadas que são maculadas por vícios insanáveis.

Apesar de existirem ações que permitiriam reconhecer, de forma indiscutível, que os sucessores do Grupo Econômico dos Okamoto ostentam um título de propriedade nulo de pleno direito, o Poder Judiciário Estadual da Bahia tem se mantido inerte e evitado analisar as ações que buscam o reconhecimento da fraude processual.

Sendo a fraude documental das matrículas cartoriais de nº 726 e 727 claras e evidentes, é de se questionar quais razões levam o PJBA a evitar reconhecer a nulidade das matrículas e a conferir a posse das áreas àqueles que possuem títulos grilados.

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