Para onde foi o dinheiro? | Por Luiz Holanda

Um esquema de fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) desviou R$ 6,3 bilhões de aposentados entre 2019 e 2024 por meio de descontos indevidos em contracheques, realizados por entidades sindicais ligadas a partidos políticos. A operação da Polícia Federal e da Controladoria-Geral da União identificou falsificações de assinaturas e vínculos com figuras públicas, como familiares de deputados e do presidente Lula. Apesar da gravidade, os valores dificilmente serão recuperados.
Esquema fraudulento no INSS desviou R$ 6,3 bilhões de aposentados entre 2019 e 2024, envolvendo sindicatos com conexões com partidos como PT, PDT, PSB e MDB.

Só existe uma resposta: foi para os bolsos dos corruptos, mas jamais saberemos o nome deles, principalmente dos chefes. O que sabemos é que o que foi retirado ilegalmente dos aposentados através de um esquema bilionário de fraudes dentro do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e descoberto pela operação conjunta da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU), tem tudo para não ser devolvido. A descoberta revelou a existência de um rombo bilionário ocorrido entre 2019 e 2024, no valor de R$ 6,3 bilhões em descontos indevidos nos contracheques dos velhinhos. O esquema consistia na retirada mensal, por alguns sindicatos, de uma determinada quantia supostamente autorizada e em nome de associações de aposentados, prometendo serviços que incluíam desde assistência jurídica a descontos em academias e planos de saúde. Os atingidos jamais autorizaram os descontos nem tampouco se filiaram aos sindicatos. Suas assinaturas, segundo a imprensa, foram falsificadas, e o dinheiro descontado simplesmente desaparecia depois dos descontos. Alguns funcionários do INSS foram afastados, a começar pelo seu presidente, Alessandro Stefananutto, amigo do ministro da Previdência Social, Carlo Lupi, também demitido após a divulgação do escândalo. Mesmo assim, ninguém conseguiu explicar como um desvio dessa magnitude ocorreu diante de tantos mecanismos de controle,

Tem coisa que nem a PF nem a CGU conseguiram descobrir, apesar das investigações. As entidades sindicais investigadas são poderosas e têm conexões políticas com partidos como o PT, PDT, PSB e MDB. Uma delas, a Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), tem como presidente o irmão do deputado federal Carlos Veras, do PT e primeiro secretário da Câmara dos Deputados. Segundo o parlamentar, seu mandato “tem origem na agricultura familiar e no movimento sindical rural, trajetória que compartilha com seu irmão, Aristides Santos, dirigente da Contag”, e que “A relação com a Contag é pública, legítima e historicamente baseada em princípios de luta social, solidariedade de classe e compromisso com as pautas do campo”. A outra entidade é o Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos), que, por sua vez, tem como vice-presidente o irmão do presidente Lula da Silva, José Ferreira da Silva, o Frei Chico, que está no posto há um ano e ocupa diretorias na entidade desde 2008. O presidente do Sindnapi é Milton Cavalo, dirigente do PDT — partido do ministro demissionário Carlos Lupi. De acordo com o TCU, o número de associados ligados ao sindicato passou de 237 mil, em dezembro de 2021, para 366,2 mil em dezembro de 2023. Em fevereiro deste ano foram 207,6 mil descontos em folha para a entidade. Cavalo afirmou que “A entidade apoia integralmente as investigações sobre eventuais irregularidades nos descontos aplicados sobre os benefícios dos aposentados”. As onze entidades investigadas pela PF e pela CGU responderam por 60% do total abatido dos benefícios em fevereiro deste ano.

Esse rombo veio aumentar ainda mais o déficit do INSS, que mesmo com a reforma da Previdência de 2019 chegou R$ 363 bilhões. Trata-se do resultado negativo de R$ 267,2 bilhões no INSS, de R$ 47,3 bilhões dos servidores públicos e R$ 48,5 bilhões dos militares. Essa previsão de déficit foi considerada pela equipe econômica do governo Bolsonaro para a elaboração do orçamento encaminhado ao Congresso Nacional para aprovação.

O Brasil tem 29,5 milhões de aposentados e pensionistas, sendo 20 milhões urbanos e 9,5 milhões rurais do Regime Geral de Previdência Social (RGPS). Mas, ao todo, o INSS arca com o pagamento para 34 milhões porque tem mais 4,5 milhões assistenciais. As empresas pagam 22% sobre a folha salarial e os empregados 11%. A arrecadação mensal do INSS é de R$ 30 bilhões, que vai para um caixa único conhecido como DRU (Desvinculação das Receitas da União), artimanha para utilização da receita previdenciária. Os 6,3 bilhões de reais tirado dos velhinhos saíram daí direto para os bolsos dos corruptos, que não serão punidos nem devolverão o dinheiro, pois, atualmente, o criminoso no Brasil tem convicção de que seu direito de roubar está garantido pela impunidade, que é institucional. A ausência de punição é uma manifestação da falência múltipla e contagiosa do sistema de justiça, sustentada por mecanismos que insistem em manter um estado de degradação institucional contrário aos princípios básicos da ciência jurídica e ao interesse coletivo. E o pior é que isso é assegurado pela Justiça. Em resumo, nada acontecerá aos corruptos; todos que lesaram os velhinhos embolsarão o dinheiro garantido pela impunidade. O dinheiro foi para os bolsos de quem jamais o devolverá.

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.


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