Impacto da Inteligência Artificial na Advocacia é tema de análise crítica de Joaci Góes

Especialista discute o papel do advogado diante da automação judicial e alerta sobre distorções estruturais na formação jurídica do Brasil.

Em artigo publicado na Tribuna da Bahia na quinta-feira (05/06/2025), com o título “Advocacia nos tempos da IA”, o escritor, jurista e ex-deputado constituinte Joaci Góes apresentou uma reflexão crítica sobre os impactos da Inteligência Artificial (IA) na advocacia, as distorções na formação profissional no Brasil e o futuro do Direito em um contexto de automação crescente.

A análise de Góes foi motivada por sua participação em um seminário realizado no auditório do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), sob a coordenação do jurista Sérgio Schlang, com apoio da FCDL e da CDL. No evento, discutiu-se o papel do Direito no cenário emergente da IA, com destaque para os desafios que se impõem aos operadores jurídicos.

O Brasil e o excesso de bacharéis em Direito

Segundo dados citados por Joaci Góes, baseados em levantamento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da International Bar Association (IBA), o Brasil possui a maior proporção de advogados por habitante no mundo: um advogado para cada 164 pessoas. A lista comparativa citada no artigo inclui:

  • Brasil – 1 advogado para cada 164 pessoas

  • Estados Unidos – 1 para cada 253

  • Argentina – 1 para cada 365

  • Reino Unido – 1 para cada 471

  • Portugal – 1 para cada 625

  • Índia – 1 para cada 700

Além disso, o país forma mais de 120 mil novos advogados por ano, o que, segundo o autor, acentua um “espírito de litigância” que atravanca o sistema judiciário. Góes observa que há “um conflito judicial para cada dois brasileiros”, o que aponta para um uso excessivo do Judiciário como instância de resolução de problemas cotidianos.

O contraponto japonês e o espírito associativista

O artigo apresenta o modelo jurídico japonês como contraponto ao brasileiro. Com 123 milhões de habitantes, o Japão possui apenas 17.500 advogados. Conforme destacou o empresário Akio Morita em conferência em Harvard, o Japão abre somente 400 novas vagas por ano para litígio judicial, número que reflete uma política institucional de incentivo à mediação e ao acordo, baseada em um espírito associativista enraizado na cultura local. Para Joaci Góes, essa mentalidade contribuiu diretamente para o chamado “milagre japonês” do pós-guerra.

Crítica à formação cultural brasileira e ao ativismo judicial

Góes também critica o que considera uma tradição cultural brasileira que valoriza a esperteza em detrimento do mérito. Como exemplos simbólicos, ele menciona personagens como Pedro Malasartes e Macunaíma. Em sua visão, a popularização da advocacia se associa a uma mentalidade voltada para a vantagem pessoal, o que, segundo ele, reforça o protagonismo excessivo do Judiciário em temas que deveriam ser resolvidos por outras vias institucionais.

Nesse ponto, o autor é incisivo ao afirmar que o ativismo judicial tem contribuído para a impunidade de corruptos, citando como exemplo o desmonte da Operação Lava Jato e a anulação de sentenças que somavam mais de dois mil anos de prisão. Em sua crítica direta, Góes menciona que “a começar pelo atual Presidente da República”, muitos beneficiaram-se de decisões judiciais que, segundo ele, fragilizam o combate à corrupção no Brasil.

A Inteligência Artificial e a reestruturação do Judiciário

Na avaliação de Joaci Góes, a Inteligência Artificial tende a reduzir drasticamente o número de juízes e desembargadores necessários para manter a máquina judiciária em funcionamento. Ele projeta, por exemplo, que um estado como a Bahia poderia operar com apenas dez juízes e seis desembargadores, mantendo níveis superiores de produtividade. Para sustentar seu argumento, cita uma experiência própria em Telaviv, Israel, onde um processo judicial complexo teve trânsito em julgado em apenas 28 dias, já em 1995.

Advocacia preventiva como alternativa de futuro

Apesar do cenário desafiador, Góes aponta uma oportunidade de valorização da advocacia preventiva, baseada em serviços jurídicos de alta qualidade voltados à redução de litígios e à segurança jurídica preventiva nas relações institucionais e comerciais. Ele conclui que, salvo por vocação inarredável, o melhor caminho seria reduzir a formação massiva de bacharéis em Direito, contribuindo para um ambiente jurídico mais funcional e menos litigante.


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