Reportagem de Aguirre Talento, publicada nesta quinta-feira (17/07/2025) no jornal Estadão, informa que na terça-feira (16/07), a Polícia Federal (PF) revelou novos elementos na investigação da Operação Sisamnes, que apura a venda de decisões judiciais no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Documentos e celulares apreendidos indicam vínculos do empresário Haroldo Augusto Filho com os ministros João Otávio de Noronha e Marco Buzzi, incluindo viagens em aeronave privada e diálogos com parentes dos magistrados.
A análise do conteúdo de dispositivos eletrônicos e documentos apreendidos pela PF revelou diálogos entre Haroldo Augusto Filho e familiares dos ministros do STJ, além de referências diretas aos magistrados. Entre os episódios registrados, consta que Noronha utilizou uma aeronave privada cedida por Haroldo para ir a Cuiabá (MT), em abril de 2024, onde participou de um evento jurídico promovido pela OAB de Mato Grosso. A empresa Fource, da qual Haroldo é sócio, patrocinou o encontro.
De acordo com a PF, a aeronave foi oferecida ao ministro para deslocamento entre Brasília e Cuiabá. Noronha afirmou que a logística foi organizada pela OAB, sem conhecimento de que a aeronave pertencia ao empresário investigado. Apesar disso, o magistrado se declarou suspeito para atuar no inquérito relativo à venda de decisões no TJMT, após a revelação do episódio.
Contatos com filha de outro ministro e jantar não realizado
Outro ponto analisado pelos investigadores envolve conversas entre Haroldo e a advogada Catarina Buzzi, filha do ministro Marco Buzzi. Uma das mensagens, enviada por Catarina a Roberto Zampieri – advogado assassinado em dezembro de 2023 e pivô da operação – indica reencontro entre os três interlocutores em 07/10/2022.
Zampieri teria solicitado a Haroldo o nome da filha do ministro, demonstrando interesse em contato com ela. Em conversas com Zampieri, o empresário também sinalizou relações pessoais com a família de Buzzi, afirmando ser “amigo da mãe e da filha” do ministro, e sugerindo articulação para encontros informais.
Apesar dessas interações, a ministra e o magistrado negaram qualquer proximidade com o empresário. Catarina Buzzi declarou que nunca intercedeu em processos da relatoria de seu pai, e Marco Buzzi informou que viajou a Cuiabá em voo comercial, com passagens custeadas pela OAB local.
Suspeitas de influência oculta da Fource em processos do STJ
A investigação indica que a empresa Fource não aparece diretamente como parte em processos judiciais, mas atua nos bastidores por meio de terceiros. Um dos casos suspeitos envolve disputa fundiária em Mato Grosso, em que a empresa teria interesse. Embora a Fource não conste nos autos, um advogado associado a ela integrou formalmente a ação.
Neste processo, o ministro Marco Buzzi concedeu liminar em 2022 anulando decisões de instâncias inferiores, com base em alegações de falsificação documental. O caso aguarda julgamento na Quarta Turma, presidida por Noronha.
Participação de lobistas e novas frentes de investigação
A operação Sisamnes se expandiu após o assassinato de Roberto Zampieri, cujos diálogos recuperados pela PF indicaram uma rede de compra de decisões judiciais. O material obtido foi compartilhado com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e fundamentou novas apurações federais.
A PF também apura o papel do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, suspeito de intermediar decisões junto a gabinetes de ministros do STJ. Entre os registros analisados, está o envio de minutas de decisões antes de sua publicação oficial, inclusive uma atribuída a Noronha que nunca foi formalizada.
Essas evidências motivaram a PF a instaurar inquérito específico para investigar possível corrupção de servidores ligados a quatro ministros do STJ: Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, Og Fernandes e Moura Ribeiro. Os funcionários foram afastados e os processos administrativos seguem em curso.
Contexto da Operação Sisamnes
Deflagrada em novembro de 2024, com autorização do STF, a Operação Sisamnes investiga um suposto esquema de compra e venda de sentenças judiciais no Judiciário brasileiro. Haroldo Augusto Filho, empresário do ramo de recuperação judicial, é apontado como beneficiário de decisões favoráveis compradas no TJ de Mato Grosso. Agora, a PF busca esclarecer se ele tentou expandir sua influência até o STJ.
O nome da operação faz referência a Sisamnes, juiz persa punido com a morte por corrupção no século VI a.C., símbolo da gravidade dos desvios éticos no exercício da magistratura.
Conexão com a Operação Faroeste
Investigação paralela publicada pelo Estadão Conteúdo em 30/11/2024 identificou conexões entre a Fource Consultoria e a Bom Jesus Agropecuária, ambas citadas em sindicância do STJ relacionada à venda de sentenças. A Bom Jesus, sediada em Rondonópolis (MT), é controlada por Nelson Vígolo, delator do Caso Faroeste, e está em recuperação judicial.
Conversas interceptadas mostram que documentos foram antecipados irregularmente para favorecer interesses da Bom Jesus e de outros clientes, como José Pupin, ex-produtor conhecido como “rei do algodão”. Em diálogos, Zampieri relata pagamento de vantagens a magistrados, inclusive por meio da contratação de parentes.
Em nota enviada ao Jornal Grande Bahia, às 19h07 de segunda-feira (09/07/2024), a Bom Jesus Agropecuária exerceu seu direito de resposta em reação a matéria, que, segundo a empresa, conduz indevidamente o leitor à conclusão de que ela foi favorecida em decisão judicial investigada pela Operação Sisamnes. A empresa alega que, na verdade, a reportagem original do Estadão a identifica como prejudicada no caso. A nota também critica a publicação sistemática de conteúdos com informações distorcidas e inverídicas, atribuindo essas ações ao interesse de concorrentes. Por fim, reforça que a empresa foi vítima de extorsão na Operação Faroeste, destacando que foi a própria Bom Jesus quem denunciou o esquema ao CNJ, dando origem às investigações.
No âmbito das investigações da 5ª Fase da Operação Faroeste, conduzida pela Polícia Federal, destaca-se que a empresa Bom Jesus Agropecuária firmou Acordo de Leniência com as autoridades competentes. Paralelamente, o sócio da empresa, Nelson Vigolo, e o advogado Vanderlei Chilante firmaram acordos de Colaboração Premiada, comprometendo-se a fornecer informações relevantes para o avanço das apurações.
Além disso, reportagens veiculadas por veículos de imprensa de circulação nacional, como os jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo, com base em documentos e levantamentos obtidos junto à Polícia Federal, mencionaram a suposta existência de conexões entre a empresa Fource e a Bom Jesus Agropecuária. Tais vínculos teriam sido identificados no contexto das investigações sobre supostos esquemas de corrupção, tráfico de influência e comercialização de decisões judiciais no âmbito do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Principais dados
Ministros do STJ citados
1. João Otávio de Noronha
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Ex-presidente do STJ.
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Viajou em aeronave privada cedida por Haroldo Augusto Filho em abril de 2024.
-
Declarou-se suspeito para relatar inquérito relacionado à venda de sentenças no TJ-MT.
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Alegou que a OAB-MT organizou o deslocamento e desconhecia a propriedade do avião.
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Disse conhecer Haroldo por tê-lo recebido em despacho no gabinete.
2. Marco Buzzi
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Relator de processo de disputa fundiária em MT no qual há interesse da Fource.
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Teve filha, Catarina Buzzi, em diálogo com Haroldo e Zampieri.
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Participou de evento da OAB-MT em 2022, patrocinado pela Fource.
-
Alegou que viajou por voo comercial custeado pela OAB, sem agenda com o empresário.
-
Negou vínculo com Haroldo ou interferência da filha.
Empresário investigado
Haroldo Augusto Filho
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Sócio da Fource, empresa especializada em aquisição de ativos em litígio.
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Apontado como beneficiário de decisões compradas no TJ-MT.
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Não figura formalmente como parte em processos, mas atua via terceiros.
-
Cedeu aeronave a Noronha e patrocinou eventos jurídicos com presença de ministros.
-
Teve diálogos com Catarina Buzzi e a advogada Anna Carolina Noronha (filha de Noronha).
-
Intermediou conversas com Roberto Zampieri e Andreson Gonçalves.
Diálogos e interações relevantes
Com Roberto Zampieri
-
Conversas sobre organização de jantar para ministro Buzzi.
-
Discussões sobre processos em curso no STJ e possibilidade de intermediação.
-
Confirmação de relações com familiares de ministros.
Com Andreson Gonçalves (lobista)
-
Envio de minutas antecipadas de decisões do STJ.
-
Suposta influência direta nos gabinetes ministeriais.
-
Citações a processos de interesse da Fource, sob relatoria de Noronha e Buzzi.
Investigações em andamento
Inquéritos federais
-
Venda de sentenças no TJ-MT (já concluído, com indiciamento de Haroldo).
-
Tentativa de compra de decisões no STJ, com foco em servidores e possíveis vínculos com ministros.
Servidores investigados (STJ)
-
Quatro gabinetes sob apuração:
-
Isabel Gallotti
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Nancy Andrighi
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Og Fernandes
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Moura Ribeiro
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-
Servidores afastados administrativamente.
-
Processos internos ainda em andamento.
Cronologia de eventos-chave
| Data | Evento |
|---|---|
| Maio/2022 | Marco Buzzi participa de evento em Cuiabá, patrocinado pela Fource. |
| Outubro/2022 | Diálogos entre Zampieri, Haroldo e Catarina Buzzi são registrados. |
| Setembro/2022 | Buzzi concede liminar em favor de parte associada à Fource. |
| Novembro/2024 | Primeira fase da Operação Sisamnes é deflagrada. |
| Dezembro/2023 | Roberto Zampieri é assassinado; seu celular gera novas provas. |
| Abril/2024 | Noronha viaja em aeronave privada da Fource para evento jurídico. |
| Julho/2025 | PF revela novos vínculos entre Haroldo e ministros do STJ. |
Processos e decisões envolvidas
-
Processo de disputa fundiária em MT, com suposta documentação falsificada.
-
Liminar de Marco Buzzi, de setembro de 2022, anulou decisões da 1ª e 2ª instâncias.
-
O caso aguarda julgamento na Quarta Turma, presidida por Noronha.
Elementos de prova
-
Minutas de decisões obtidas antes da publicação.
-
Mensagens de WhatsApp entre investigados.
-
Foto do interior da aeronave utilizada por Noronha, interceptada pela PF.
-
Documentos da Fource indicando patrocínio de eventos com presença de ministros.

Leia +
CNJ aponta possível envolvimento da empresa Fource em esquema de venda de decisões no STJ
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