Reportagem de Aguirre Talento, publicada neste domingo (17/07/2025) no Estadão, revela que a Polícia Federal (PF) identificou indícios de vínculos entre ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o empresário Haroldo Augusto Filho, alvo da Operação Sisamnes, que apura a venda de decisões judiciais. As descobertas surgiram a partir da análise de celulares e documentos apreendidos nas primeiras fases da operação.
No material coletado, investigadores localizaram diálogos com familiares de magistrados e menções diretas a ministros, além de registros de viagens realizadas em aeronaves cedidas pelo empresário. Embora não sejam formalmente investigados, os ministros citados aparecem em situações que levantam dúvidas sobre sua relação com o empresário.
Caso Noronha: uso de aeronave e participação em evento da OAB
Uma das revelações envolve o ministro João Otávio de Noronha, ex-presidente do STJ, que utilizou uma aeronave privada cedida por Haroldo Augusto Filho para viajar de Brasília a Cuiabá, em abril de 2024. O deslocamento foi para um evento da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MT), patrocinado pela empresa Fource, da qual Haroldo é sócio.
Noronha afirmou que o transporte foi providenciado pela OAB e negou relação de amizade com o empresário. Ainda assim, declarou-se suspeito em um inquérito sobre venda de sentenças no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, justamente por ter realizado a viagem no avião do investigado.
Caso Buzzi: diálogos com a filha e eventos jurídicos
Outro episódio envolve o ministro Marco Buzzi, cuja filha, a advogada Catarina Buzzi, manteve diálogos com Haroldo e com o advogado Roberto Zampieri, assassinado em dezembro de 2023. Em conversas interceptadas, Haroldo citou amizade com familiares do ministro e mencionou a possibilidade de encontros privados.
Em 2022, Buzzi participou de um evento jurídico em Cuiabá, também patrocinado pela Fource. Apesar disso, o ministro negou qualquer aproximação pessoal e afirmou ter viajado por voo comercial custeado pela OAB-MT.
Fource e os processos em disputa fundiária
A PF apura ainda se a empresa Fource atua nos bastidores de processos fundiários em Mato Grosso. Embora não figure formalmente como parte, advogados ligados à consultoria ingressaram em ações de disputa de terras. Em um dos casos, o ministro Marco Buzzi concedeu liminar em 2022 favorável à parte representada indiretamente pela empresa, anulando decisões das instâncias inferiores.
O processo aguarda julgamento na Quarta Turma do STJ, presidida atualmente por Noronha — justamente os dois ministros cujas conexões com Haroldo foram identificadas.
Zampieri, o lobista e a venda de decisões
A investigação também envolve o advogado Roberto Zampieri, assassinado em 2023, e o lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, suspeitos de intermediar a compra de decisões no STJ. Mensagens recuperadas dos celulares de ambos sugerem tráfico de influência em gabinetes de ministros e acesso antecipado a minutas de julgamentos.
Com base nesses indícios, a PF abriu inquérito para apurar possível corrupção de assessores ligados a quatro ministros: Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, Og Fernandes e Moura Ribeiro. Os servidores foram afastados, e processos administrativos seguem em tramitação.
Cooptação de magistrados
As revelações da Operação Sisamnes expõem a fragilidade institucional do sistema judicial brasileiro diante de tentativas de cooptação de magistrados por empresários e lobistas. Ainda que não haja provas diretas de corrupção envolvendo ministros do STJ, os indícios de proximidade — como uso de aeronaves privadas e diálogos com familiares — geram dúvidas sobre a lisura das relações entre magistrados e agentes privados. O caso revela um padrão recorrente de vulnerabilidade do Judiciário a práticas de tráfico de influência, reforçando a necessidade de maior transparência, controle externo efetivo e limites claros para a participação de ministros em eventos patrocinados por empresas de interesse em disputas judiciais.
Tabela de Padrões Societários e Envolvimento
| Elemento | Detalhamento |
|---|---|
| Sociedade empresarial | Valdoir Slapak e Haroldo Filho são sócios da Fource e atuaram na recuperação judicial da Bom Jesus Agropecuária. |
| Atuação em múltiplos estados | As empresas operaram na Bahia, Mato Grosso e Tocantins, com disputas fundiárias e alta exposição política. |
| Ligação com operadores de influência | Relações com advogados (Zampieri, Chilante) e lobistas (Andreson Gonçalves) que atuavam para influenciar decisões judiciais. |
| Fluxos financeiros suspeitos | Pagamentos expressivos a intermediários e familiares de magistrados, fornecimento de benefícios (joias, veículos, eventos). |
| Busca por decisões judiciais estratégicas | Participação direta em liminares favoráveis (ex.: liminar do ministro Buzzi, anulando instâncias anteriores em 2022). |
Linha do Tempo – Operação Sisamnes e vínculos no STJ
2022
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Maio — Ministro Marco Buzzi participa de evento da OAB em Cuiabá, patrocinado pela Fource.
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Setembro — Buzzi concede liminar favorável em processo fundiário de Mato Grosso ligado à Fource, anulando decisões das instâncias inferiores.
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Outubro — Diálogos mostram Catarina Buzzi, filha do ministro, em contato com Haroldo Augusto Filho e o advogado Roberto Zampieri.
2023
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Dezembro — O advogado Roberto Zampieri é assassinado em Cuiabá.
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Celular de Zampieri revela conversas sobre venda de decisões e citações a gabinetes de ministros do STJ.
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A PF identifica indícios de tráfico de influência por parte do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves.
2024
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Abril — Ministro João Otávio de Noronha viaja em aeronave cedida por Haroldo Augusto Filho para evento da OAB em Mato Grosso, patrocinado pela Fource.
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Abril (10 a 12) — Evento sobre falências e recuperação judicial em Cuiabá, com presença de Noronha e outros ministros do STJ.
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PF detecta diálogos entre Haroldo e Anna Carolina Noronha, filha do ministro.
2025
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Agosto — A Polícia Federal confirma indícios de proximidade entre Haroldo e ministros do STJ, incluindo uso de aeronaves, eventos patrocinados e diálogos com familiares.
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Ministros negam irregularidades, mas Noronha declara-se suspeito em inquérito sobre venda de sentenças no TJMT.
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O inquérito segue sob relatoria do ministro Cristiano Zanin no STF.
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