O juiz federal Diego de Souza Lima, da 2ª Vara Federal Cível e Criminal, julgou improcedente a ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o prefeito José Ronaldo de Carvalho, a ex-secretária de Saúde Denise Lima Mascarenhas e o ex-presidente da Comissão de Licitação Antônio Rosa de Assis, por supostos atos de improbidade administrativa relacionados a contratos firmados entre o Município e a Cooperativa de Trabalho COOFSAÚDE, entre 2014 e 2017. A decisão judicial foi prolatada nesta sexta-feira (17/10/2025)
Sentença reconhece ausência de dolo e dano ao erário
O processo, registrado sob o número 1001623-98.2020.4.01.3304, foi ajuizado pelo MPF em 2020 e alegava fraudes licitatórias e superfaturamento de cerca de R$ 23,9 milhões em contratos da Secretaria Municipal de Saúde de Feira de Santana.
O magistrado, contudo, ao examinar as provas e os relatórios técnicos da Controladoria-Geral da União (CGU), concluiu que não houve comprovação de prejuízo efetivo ao patrimônio público nem de dolo específico por parte dos réus, requisitos indispensáveis para a condenação após as alterações promovidas pela Lei nº 14.230/2021 na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992).
Na decisão, o juiz destacou que “a mera comparação entre valores contratuais e pagamentos realizados não permite concluir, sem margem de dúvida, pela ocorrência de sobrepreço ou superfaturamento”, enfatizando que a variação de valores decorre, em muitos casos, da complexidade dos serviços médicos prestados e das diferentes jornadas de trabalho assumidas por profissionais da área de saúde.
MPF havia pedido bloqueio de R$ 23,9 milhões e suspensão de direitos políticos
O Ministério Público Federal sustentava que as licitações — Pregão Presencial nº 001/2014, Concorrência Pública nº 006/2015 e Concorrência Pública nº 003/2016 — teriam sido direcionadas à COOFSAÚDE, o que teria causado enriquecimento ilícito de particulares e dano ao erário.
Com base nessa tese, o órgão ministerial pediu liminarmente o bloqueio de bens dos réus no valor de R$ 23.990.288,81, além da suspensão dos direitos políticos, perda da função pública e pagamento de multa civil.
Contudo, ao longo do processo, que se estendeu por mais de cinco anos, o juiz Diego de Souza Lima entendeu que as provas apresentadas não demonstraram a ocorrência de qualquer fraude, direcionamento ou má-fé, e que eventuais inconsistências nos registros de pagamento poderiam decorrer de falhas administrativas ou logísticas típicas de contratos de grande porte na área da saúde pública.
Defesas contestaram ilegalidade de provas e ausência de dolo
Nas alegações finais, as defesas sustentaram que o MPF utilizou relatórios da CGU obtidos de forma irregular e que as acusações eram baseadas em interpretações parciais e sem prova de prejuízo efetivo.
O prefeito José Ronaldo de Carvalho afirmou que o processo teve caráter político e midiático, e que os contratos com a cooperativa foram regularmente firmados, com respaldo em pareceres jurídicos e acompanhamento técnico.
A ex-secretária Denise Lima Mascarenhas argumentou que não havia dolo específico nem individualização de conduta, e que as exigências dos editais — como registro profissional e visitas técnicas — eram práticas usuais e legalmente amparadas. Já Antônio Rosa de Assis afirmou que sua atuação na Comissão de Licitação foi meramente burocrática, sem poder decisório sobre objetos ou valores contratuais.
Juiz rejeita alegações do MPF e reconhece legalidade dos contratos
Na sentença, o juiz Diego de Souza Lima rejeitou também a tese de nulidade do processo por suposta ilicitude no compartilhamento de provas entre a CGU e o MPF, afirmando que tal intercâmbio foi autorizado judicialmente e “constitui prática legítima e corriqueira em ações de combate à improbidade”.
O magistrado ressaltou que a Lei nº 14.230/2021 exige comprovação do dolo e do dano patrimonial efetivo para a configuração de improbidade, e que “irregularidades formais ou falhas administrativas não podem ser confundidas com atos dolosos de corrupção ou fraude”.
Com base nessas conclusões, julgou improcedente a ação civil pública e absolveu integralmente os réus José Ronaldo de Carvalho, Denise Lima Mascarenhas e Antônio Rosa de Assis das acusações formuladas pelo Ministério Público Federal.
Reforço à aplicação restritiva da Lei de Improbidade
A decisão da Justiça Federal em Feira de Santana segue a tendência observada em diversos tribunais após a reforma da Lei de Improbidade Administrativa, aprovada em 2021, que restringiu a punição de gestores públicos apenas a casos em que há comprovação inequívoca de dolo e de dano ao erário.
O caso também reflete uma mudança no entendimento jurídico sobre falhas administrativas, que passam a ser tratadas como irregularidades sanáveis, e não como atos de corrupção.
Do ponto de vista institucional, a sentença evidencia a revalorização do devido processo legal e a rejeição de práticas de lawfare — uso político do sistema judicial —, ao reafirmar que a punição de gestores deve se basear em provas concretas e não em presunções ou conjecturas.
A absolvição de José Ronaldo e dos ex-secretários reforça, portanto, a aplicação da nova lógica da Lei nº 14.230/2021: a responsabilização deve ser excepcional e fundada em dolo específico, preservando o princípio da segurança jurídica na administração pública.
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