A Polícia Federal (PF) identificou indícios de um suposto repasse de R$ 1,12 milhão à advogada Catarina Buzzi, filha do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Marco Buzzi, durante a investigação que apura um esquema de venda de sentenças judiciais em tribunais superiores. A informação consta em relatório parcial anexado ao inquérito sigiloso sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, no Supremo Tribunal Federal (STF).
De acordo com o documento, a mensagem foi localizada no celular de Andreson de Oliveira Gonçalves, lobista apontado como articulador do esquema que envolve advogados, empresários e ex-servidores ligados a gabinetes dos ministros Og Fernandes, Isabel Gallotti e Nancy Andrighi. O relatório ressalta que os magistrados citados, incluindo Marco Buzzi, não são investigados.
Conteúdo da mensagem e vínculos apurados pela PF
Entre as imagens encontradas no telefone de Andreson, os investigadores localizaram uma tela de celular fotografada que exibia uma mensagem supostamente enviada por Carlos Chaves para uma pessoa identificada como “Dra”, referindo-se a Catarina Buzzi. No texto, o remetente afirma ter transferido R$ 1.120.000,00 para contas da advogada e solicita a restituição dos valores em razão de uma “promessa de trabalho não cumprida”.
“Dra, eu transferi para a sua conta e da KATARINA [sic] Buzzi R$ 1.120.000,00. […] Peço de imediato a restituição dos meus valores. Caso isso não aconteça, irei buscar os meios legais”, diz a mensagem reproduzida no relatório.
Na mesma imagem, aparece o print de uma transferência de R$ 500 mil, descrita como “pagamento de honorários”. O registro foi feito pelo próprio lobista, segundo a PF, dias após Catarina entrar em contato com o advogado Roberto Zampieri, assassinado em Cuiabá (MT) em dezembro de 2023 — episódio que deu origem ao atual inquérito.
Personagens e conexões empresariais
O relatório da PF destaca a proximidade entre Catarina Buzzi, Roberto Zampieri e o empresário Haroldo Augusto Filho, sócio da Fource Consultoria, empresa do agronegócio com sede em Cuiabá e já investigada por suspeita de compra de decisões no STJ e no Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJMT).
Em conversas de outubro de 2022, Zampieri pergunta a Haroldo o nome “da filha do ministro”, recebendo como resposta: “Catarina”. Pouco tempo depois, a advogada teria enviado mensagem ao advogado, dizendo:
“Dr. Roberto! Tomei a liberdade de pedir seu número ao Haroldo. Foi um prazer reencontrá-lo.”
Cinco meses antes, Haroldo havia se vangloriado, em diálogo com Zampieri, de sua proximidade com a família do ministro Buzzi, dizendo ser “amigo da mãe e da filha”. A PF não confirmou se o encontro mencionado entre o empresário e o magistrado chegou a ocorrer.
Manifestação da defesa e posicionamento do STJ
Em nota oficial, o advogado João Pedro de Mello Souza, representante de Catarina Buzzi, afirmou que sua cliente “não realizou qualquer transação, promessa ou serviço e não recebeu valores dos personagens mencionados”. Segundo a defesa, as conversas não possuem relevância jurídica e a advogada não é alvo de nenhuma investigação no STF ou em qualquer instância.
Após a publicação da reportagem, a defesa enviou nova manifestação:
“É descabida e maliciosa a tentativa de envolver o nome da advogada em investigação sobre decisões de tribunais superiores. Catarina Buzzi nunca atuou em qualquer processo da Fource, de seus proprietários, de Andreson de Oliveira, de Roberto Zampieri ou de Carlos Chaves, e nem recebeu qualquer pagamento. Ela sequer conhece essas pessoas.”
O ministro Marco Buzzi, por meio da assessoria do STJ, declarou não acompanhar as relações comerciais da filha e destacou que “as pessoas e empresas citadas não integram nenhum processo sob sua responsabilidade”.
Desdobramentos e nova frente de apuração
O relatório da PF, ao mencionar o suposto repasse, ressalta que “tais elementos, por envolverem outras unidades jurisdicionais, serão tratados em procedimento próprio, de modo a garantir a efetividade das investigações”. O conteúdo reforça a existência de múltiplos núcleos de atuação na estrutura investigada — abrangendo empresários, advogados e operadores com trânsito em gabinetes de tribunais superiores.
No último dia 10 de outubro, o jornal O Estado de S. Paulo revelou que a PF havia solicitado ao ministro Cristiano Zanin o aprofundamento das apurações sobre Catarina Buzzi e que o escritório da advogada funciona em salas comerciais pertencentes à Fource.
As apurações prosseguem sob sigilo judicial no Supremo Tribunal Federal, com novos desdobramentos esperados a partir das análises de dados extraídos dos celulares apreendidos na operação.
Impacto institucional e sensibilidade do caso
O episódio amplia as tensões dentro do Judiciário brasileiro, já pressionado por sucessivos escândalos que questionam a integridade de decisões judiciais em cortes superiores. O fato de o caso envolver filha de ministro em exercício confere à investigação um potencial de desgaste institucional, ainda que não haja, até o momento, indícios de envolvimento direto do magistrado.
O caso também revela a fragilidade dos mecanismos de controle interno sobre assessores, familiares e interlocutores de magistrados, além de reacender o debate sobre a necessidade de maior transparência nas relações entre advogados e tribunais superiores.
Enquanto isso, a Polícia Federal e o STF enfrentam o desafio de conduzir a investigação sem interferências políticas ou corporativas, garantindo o equilíbrio entre o direito à honra e o interesse público na apuração de possíveis ilícitos.
*Com informações de Johanns Eller, na Coluna de Malu Gaspar, do jornal O Globo, de sexta-feira (17/10/2025).
Share this:
- Click to print (Opens in new window) Print
- Click to email a link to a friend (Opens in new window) Email
- Click to share on X (Opens in new window) X
- Click to share on LinkedIn (Opens in new window) LinkedIn
- Click to share on Facebook (Opens in new window) Facebook
- Click to share on WhatsApp (Opens in new window) WhatsApp
- Click to share on Telegram (Opens in new window) Telegram
Relacionado
Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)
Subscribe to get the latest posts sent to your email.




