Procurador-geral da República desafia relatório da PF, pede mais prazo ao STF e expõe falhas na investigação sobre venda de decisões no STJ

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu ao STF a prorrogação do inquérito que apura supostas vendas e vazamentos de decisões no STJ e levantou dúvidas sobre o relatório apresentado pela Polícia Federal.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, solicitou neste início do mês de novembro de 2025 ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prorrogação do prazo de investigação sobre as suspeitas de venda e vazamento de decisões judiciais em gabinetes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Em manifestação sob sigilo, obtida pela Folha de S.Paulo, o chefe do Ministério Público Federal (MPF) também levantou questionamentos sobre o relatório da Polícia Federal (PF) referente a Operação Sisamnes, que apresentou hipóteses de corrupção e tráfico de influência envolvendo servidores e intermediários da Corte.

PGR pede mais tempo e cautela nas conclusões da PF

O documento enviado ao STF indica que Gonet considera verossímeis as hipóteses criminais levantadas pela PF, mas solicita mais tempo para que os investigadores detalhem pontos ainda inconclusos. O procurador-geral pediu a manutenção de medidas cautelares — como prisões e monitoramentos eletrônicos — até que as novas diligências sejam concluídas.

Segundo ele, é necessário que a PF delimite com clareza os pontos pendentes, especifique quais provas adicionais precisam ser produzidas e indique quais análises ainda estão em curso.

“É recomendável que a Polícia Federal delimite com clareza os pontos da investigação que ainda demandam produção adicional de provas, ou que se encontrem com diligências em curso ou com análises pendentes de conclusão”, afirmou o PGR.

Contradições e lacunas no relatório policial

Gonet destacou que, embora o relatório trace um panorama amplo de supostas fraudes comuns em processos falimentares, não há referência a casos concretos desse tipo entre os que foram considerados suspeitos. A crítica se estende às menções à empresa Fource Consultoria, apontada pela PF como núcleo operacional do esquema criminoso.

Para o procurador-geral, há dúvidas quanto à consistência dos indícios que sustentam as acusações contra a empresa e seus sócios, Haroldo Augusto Filho e Valdoir Slapak. Ele afirmou que o relatório carece de contextualização técnica e documental, especialmente no que se refere à análise de mensagens de celular e movimentações financeiras.

“Não se encontram elementos que fundamentem, ao menos a princípio, a tese de que os envolvidos se comunicavam por meio de disfarces nominais ou códigos”, observou Gonet.

Contexto da investigação e papel da Fource

A Operação Sisamnes, conduzida pela PF desde 2024, investiga negociações ilícitas de decisões judiciais no STJ e em outros tribunais superiores. O inquérito ganhou força após a análise de dados extraídos do celular do advogado Roberto Zampieri, assassinado em 2023, e de comunicações envolvendo o lobista Andreson de Oliveira Gonçalves.

O relatório preliminar da PF, apresentado em outubro, aponta que a Fource foi instrumentalizada como fachada para manipular processos judiciais e burlar credores. Segundo os investigadores, decisões sob suspeita beneficiaram empresas ligadas ao grupo, especialmente em processos de recuperação judicial.

A Fource, por sua vez, reagiu às acusações afirmando que o relatório contém “conclusões subjetivas, desprovidas de provas concretas”, e que as mensagens analisadas foram “descontextualizadas e sem fundamento técnico ou jurídico”. A empresa reiterou confiança nas instituições e defendeu sua integridade e histórico profissional.

Falhas de fundamentação e ausência de provas diretas

Em sua manifestação, Gonet apontou a ausência de correlação direta entre as provas apresentadas e as conclusões do relatório da PF, especialmente quanto ao envolvimento de servidores do STJ. O PGR ressaltou que não há demonstração suficiente de dolo ou de articulação organizada, embora reconheça a necessidade de continuidade das investigações.

Ele também registrou que não foram apresentados laudos periciais completos sobre os aparelhos apreendidos, nem análises detalhadas de fluxos financeiros e bancários, o que limita a verificação de autenticidade das evidências.

“As circunstâncias descritas no relatório não se fazem acompanhar de elementos de corroboração”, pontuou o procurador-geral.

Investigações continuam sob relatoria de Zanin

A operação tramita sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, no Supremo Tribunal Federal, e completa um ano neste mês. A PF pretende ampliar o escopo da investigação para identificar outros servidores possivelmente envolvidos no vazamento e venda de decisões.

Três servidores que trabalhavam em gabinetes de ministros do STJ já foram formalmente investigados. Suas defesas negam qualquer irregularidade. As diligências complementares solicitadas por Gonet devem definir o rumo do inquérito e se haverá oferecimento de denúncia ao final da apuração.

Fragilidades metodológicas

O pedido de prorrogação do inquérito reforça a discrepância entre as conclusões preliminares da PF e o rigor técnico exigido pelo MPF. Gonet, ao mesmo tempo em que mantém a investigação viva, demonstra prudência institucional diante da gravidade das acusações. A controvérsia sobre o papel da Fource e a ausência de provas conclusivas expõem as fragilidades metodológicas das apurações policiais, especialmente em casos que tocam o alto escalão do Judiciário. A continuidade das investigações sob a relatoria de Zanin representa um teste de independência e transparência para o sistema judicial brasileiro.

Segue a síntese revisada e depurada, com os links removidos e mantendo a estrutura analítica e cronológica da cobertura do Jornal Grande Bahia sobre a Operação Sisamnes.

Linha do Tempo da Operação Sisamnes

Data Evento
26/11/2024 A Polícia Federal deflagra a Operação Sisamnes, com o objetivo de investigar a venda de decisões judiciais em gabinetes do STJ.
20/12/2024 É iniciada a segunda fase da operação, com mandados de busca e apreensão e a identificação de vínculos com a Operação Faroeste.
04/10/2025 Mandado de busca é cumprido contra o lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, apontado como intermediário no esquema.
05/10/2025 O empresário José Pupin denuncia fraudes bilionárias em recuperações judiciais relacionadas à Fource Consultoria.
09/10/2025 A PF realiza nova fase em Mato Grosso e apreende celulares de suspeitos, incluindo um ex-PM acusado de obstrução de investigação.
11/10/2025 A PF solicita ao STF autorização para ampliar o inquérito e cita filhos de ministros entre os potenciais beneficiários.
12/10/2025 Reportagens apontam supostos vínculos diretos entre a Fource Consultoria e a Bom Jesus Agropecuária, conectando a Sisamnes à Faroeste.
13/10/2025 São identificadas novas minutas de ministros do STJ encontradas em dispositivos apreendidos, reforçando as suspeitas.
14/10/2025 A PF revela fraudes bilionárias no agronegócio, destacando o uso de decisões compradas para reverter recuperações judiciais.
15/10/2025 A operação é ampliada, com a PF descrevendo a estrutura como organização criminosa complexa e hierarquizada.
19/10/2025 O JGB publica uma síntese das dez fases da Sisamnes, ressaltando seu caráter sistêmico e a profundidade da corrupção apurada.
20/10/2025 São reveladas mensagens que indicam o suposto repasse de R$ 1,12 milhão à filha de um ministro do STJ, reforçando o elo entre corrupção e favorecimento.
03/11/2025 O Ministério Público denuncia um ex-sargento da PM por tentar ocultar provas relacionadas ao esquema.

Persistência investigativa do Jornal Grande Bahia

A cobertura do Jornal Grande Bahia (JGB) sobre a Operação Sisamnes configura um dos mais consistentes trabalhos de jornalismo investigativo recente no país. As reportagens revelam com profundidade o avanço das investigações conduzidas pela Polícia Federal (PF) sobre o suposto esquema de venda e vazamento de decisões judiciais em gabinetes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), delineando um retrato amplo da corrupção sistêmica no Judiciário brasileiro.

O JGB tem tratado o caso como marco histórico na exposição da cleptocracia judicial, ao integrar a Sisamnes a um contexto mais vasto de tráfico de influência institucionalizado, onde operadores jurídicos, empresários e intermediários atuam em rede para manipular processos e decisões de alto impacto econômico e político. A abordagem do jornal vai além do noticiário factual: insere o tema em um debate sobre a degradação estrutural da Justiça e a perda de legitimidade das instituições de controle.

A série de reportagens comprova a persistência investigativa e a coerência editorial do veículo, capaz de conectar fatos dispersos em uma narrativa analítica sólida. A Operação Sisamnes é apresentada não apenas como um caso policial, mas como reflexo do colapso ético e funcional do sistema judicial brasileiro, com implicações diretas sobre a confiança pública e o equilíbrio entre os Poderes.

Entre os principais pontos abordados destacam-se:

  • Identificação de servidores, lobistas e empresários que participavam de esquemas de manipulação de decisões judiciais, com uso de mensagens cifradas, contratos simulados e pagamentos ilícitos.
  • A empresa Fource Consultoria aparece como suposto núcleo operacional do esquema, atuando sob fachada de assessoria em recuperação judicial para interferir em processos ligados ao agronegócio e beneficiar devedores estratégicos.
  • O JGB estabelece conexões entre a Sisamnes e a Operação Faroeste, sugerindo uma continuidade estrutural da corrupção entre tribunais superiores e o Judiciário estadual, especialmente nos estados da Bahia e de Mato Grosso.
  • destaque para o assassinato do advogado Roberto Zampieri, considerado peça-chave para a PF, já que os dados extraídos de seu celular permitiram reconstruir parte da rede de influência.

Do ponto de vista editorial, o JGB adota uma linguagem técnica e interpretativa, ancorada em fontes primárias e documentos oficiais, mas também em análise institucional e perspectiva histórica. O periódico consolida-se, assim, como um espaço de resistência jornalística e crítica à degeneração moral das instituições judiciais, reafirmando o compromisso com o interesse público, a transparência e o Estado de Direito.


Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe to get the latest posts sent to your email.

Facebook
Threads
WhatsApp
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading

Privacidade e Cookies: O Jornal Grande Bahia usa cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com o uso deles. Para saber mais, inclusive sobre como controlar os cookies, consulte: Política de Cookies.