Trump, depois do tarifaço | Por Luiz Holanda

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu-se com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em Kuala Lumpur, Malásia, durante a 47ª Cúpula da ASEAN, no dia 26 de outubro de 2025, para tratar de temas bilaterais e da agenda internacional.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu-se com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, em Kuala Lumpur, Malásia, durante a 47ª Cúpula da ASEAN, no dia 26 de outubro de 2025, para tratar de temas bilaterais e da agenda internacional.

A expectativa geral no início do governo era a imigração, tema central da sua campanha. Depois veio o tarifaço, dificultando ainda mais as possibilidades de cooperação entre os Estados Unidos e os demais países nas relações comerciais, criando algum tipo de colisão diplomática nos campos político e comercial, principalmente com a China. No nosso caso, o problema abrange ambos os campos, sendo que, no comercial, os Estados Unidos possuem um superavit bastante compensador.

No político, a situação é tão evidente que Nicholas Zimmerman, que foi diretor para o Brasil e o Cone Sul no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, acha que a possibilidade de o governo Trump apoiar um candidato da oposição à Presidência da República, em 2026, existe. Outro que segue o mesmo entendimento de Zimmerman é Ricardo Zuniga, que por 30 anos serviu como diplomata de carreira e foi assessor especial de Obama para a América Latina. Segundo ele:

“O presidente Donald Trump não valoriza relações bilaterais ou regionais, nem mesmo com aliados tradicionais. É obcecado por alguns temas. Na América Latina ele tem três focos: combater a imigração ilegal, inclusive com a deportação de milhares de latino-americanos para seus países de origem, dificultar que o crime organizado, sobretudo o narcotráfico, atue no mercado norte-americano a partir dos países da região e reduzir a crescente influência da China na América Latina”.

Embora os EUA não tenham déficit comercial com o Brasil, nossas possibilidades em relação ao tarifaço podem melhorar com as dificuldades de Trump no momento, que começou com a perda de importantes cidades nas eleições estaduais e municipais como Nova York, o shutdown e, agora, as novas revelações sobre documentos relacionados ao caso Jeffrey Epstein. Isso tem gerado um impacto negativo na base trumpista, causando divisões sem precedentes entre seus seguidores mais fiéis.

Segundo Carlos Gustavo Poggio, professor de Ciência Política do Berea College, esses casos têm provocado rachaduras notáveis no grupo que apoia Trump, especialmente entre os mais alinhados ao movimento Make America Great Again. A possibilidade de uma derrota na Suprema Corte relacionada à questão das tarifas é outro fato que compõe um cenário de crescentes desafios políticos para Trump. Para Thomas Piketty, diretor de pesquisas na École des Hautes Études en Sciences Sociales e professor da Paris School of Economics, autor de O capital no século XXI, Trump expõe as fraquezas do seu neocolonialismo tentando sustentar o sonho de uma prosperidade interna em declínio. Para ele:

“O nacional-capitalismo trumpista gosta de ostentar sua força, mas, na verdade, é frágil e está em apuros. A Europa tem os meios para enfrentá-lo, desde que recupere a confiança em si mesma, estabeleça novas alianças e analise calmamente as vantagens e os limites desta matriz ideológica”.

O Produto Interno Bruto (PIB) americano — que abrange todos os bens e serviços produzidos na economia — registrou uma taxa anualizada de -0,2% no primeiro trimestre do ano, de acordo com a estimativa do Departamento do Comércio, divulgada recentemente e mostrando uma tendência inicial da queda do PIB em 0,3%. As tarifas de Trump levaram empresas e consumidores americanos a antecipar compras para evitar possíveis choques de preços, decorrente das taxas, aumentando ainda mais as importações.

Os Estados Unidos enfrentam atualmente uma profunda crise política e social. O país se encontra polarizado como há muito tempo não ocorria. As eleições estaduais e municipais deste ano comprovaram isso. Os democratas obtiveram vitórias em relação aos republicanos em vários estados e municípios. O democrata Zohran Mamdani venceu a eleição para prefeito em Nova York, desafiando Trump ao afirmar, logo em seu primeiro discurso depois de eleito, que a cidade continuará sendo uma metrópole de imigrantes, construída por imigrantes e alimentada por imigrantes.

Mamdani, que se declara socialista, propôs congelar o aluguel de apartamentos regulados pela prefeitura, além de tornar ônibus e creches gratuitos. Se vai conseguir ou não é outro problema, mas o fato é que ele, segundo Timothy Shenk, professor da Universidade da Cidade de Nova York, usou a mesma estratégia de Trump em 2024: explorou a frustração do eleitor com a economia e com o custo de vida.

A vitória dos democratas nas eleições expôs a insatisfação de uma parcela dos americanos com o governo Trump. Em Nova Jersey, a democrata Mikie Sherrill venceu a eleição para o governo do estado. Na Virgínia, hoje governada por um republicano, foi também uma democrata, Abigail Spanberger, quem ganhou. As duas têm perfil mais moderado que Mamdani.

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.


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