Que a corrupção existe nos três poderes da República isso é um fato. O problema está em diminuí-la, já que extingui-la é quase impossível. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, reconhecendo esse fato, disse, recentemente, que é uma “mentira deslavada” que o tribunal queira acabar com a corrupção, pois “O caminho para se enfrentar a corrupção com efetividade é esse que vem sendo trilhado nos últimos anos: amadurecimento institucional, evolução legislativa, harmonia e independência dos Três Poderes da República e das instituições essenciais à Justiça e ao Estado brasileiro”.
O ministro sabe muito bem que os recursos públicos sempre foram o núcleo da guerra política, já que o dinheiro instrumentaliza a disputa pelo poder. Ele próprio passou por algumas situações constrangedoras devido ao dinheiro, com destaque para o pedido feito pela Policia Federal ao STF para abrir um inquérito contra a sua pessoa, cujo objetivo era investigar supostos repasses ilegais para ele. Segundo consta, o ministro teria favorecido dois prefeitos fluminenses em processos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), conforme a coluna Painel, da Folha de S. Paulo. A solicitação foi a primeira que a PF fez para uma apuração envolvendo um ministro da Corte, e foi baseada em acordo de colaboração premiada do ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, segundo a reportagem.
No caso das emendas parlamentares, tantos são os recursos que podem ser desviados que os demais poderes querem fazer com que a aplicação desse dinheiro seja mais transparente. O ministro Flávio Dino, além de suspender a aplicação desenfreada do dinheiro oriundo das emendas, determinou novas medidas para a sua execução, afirmando que era a melhor forma de garantir transparência e rastreabilidade no repasse dos valores. A polêmica envolvendo o “orçamento secreto” e, mais recentemente, os repasses de verbas públicas através das emendas PIX, não é de agora. Isso demonstra que a relevância da disputa pelo poder no âmbito das finanças públicas é tão significativa que a organização do nosso estado prevê uma partilha de atribuições em matéria orçamentária com base na aplicação imperfeita dos “freios e contrapesos”, uma das características dos Estados Democráticos de Direito. O Poder Executivo elabora as leis orçamentárias, que são submetidas ao Poder Legislativo para apreciação, deliberação e aprovação, cabendo ao Executivo o papel de principal condutor da execução orçamentária, e ao Legislativo a fiscalização. O problema é que o Legislativo se tornou, hoje, o dono do dinheiro. Sua participação na elaboração das leis orçamentárias por meio de emendas ao projeto encaminhado pelo Poder Executivo, e a posterior execução dos recursos nelas contemplados através das emendas, há tempos vêm sendo um problema de difícil solução. As emendas iniciadas a partir da “emenda do orçamento impositivo” (emenda constitucional 85, de 2015), vêm tentando impor maior rigidez no processo orçamentário, mitigando a discricionariedade e tentando reduzir as possibilidades abertas para práticas corruptas, como a utilização do dinheiro como instrumento de cooptação política, mas a admissão das emendas individuais, coletivas (ou “de bancada”), do relator do projeto de lei, acrescidas de uma interpretação “generosa” para o uso do dinheiro, mantém abertas várias portas para a corrupção. Permite também que os parlamentares se aproveitem dessas vulnerabilidades para operacionalizar gastos sem deixar claro quem se responsabiliza por eles e o que exatamente se faz com os recursos distribuído.
Mesmo com o STF tentando monitorar a aplicação desses recursos, o fato é que na disputa pelo dinheiro público o jogo é bruto. Com a criação da “Emenda PIX”, a coisa piorou. Abriu-se uma grande brecha para a corrupção, pois os recursos dela oriundos são transferidos sem a necessidade de identificação prévia ou formalização de convênios, o que torna o processo vulnerável. Em outras palavras, sem uma estrutura rigorosa de controle, a alocação desses recursos ocorre de maneira muito mais suscetível a desvios e má gestão, aumentando ainda mais os riscos de corrupção, especialmente em municípios que já enfrentam desafios fiscais e de governança. A Emenda PIX conseguiu transformar o que deveria ser um instrumento de desenvolvimento em uma potencial arma para a corrupção. A Confederação Nacional de Municípios (CNM) contabilizou a transferência de R$ 3,9 bilhões ao longo deste ano, restando ainda R$ 2,9 bilhões a serem transferidos, ou seja, um alto volume de dinheiro que circulará entre as prefeituras sem a devida transparência ou fiscalização. É muito dinheiro para dar sem fiscalizar.
*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.
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