Operação Sisamnes: PF investiga vínculos de ministros do STJ com empresário suspeito de comprar decisões judiciais; Atuação da Fource apresenta conexão com o Caso Faroeste

A Polícia Federal identificou indícios de relações entre o empresário Haroldo Augusto Filho e ministros do STJ, no âmbito da Operação Sisamnes. A investigação apura se houve tentativas de compra de decisões judiciais, com base em viagens, diálogos com familiares de ministros e participação em eventos patrocinados pela empresa do investigado. O caso segue sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, no STF.
Polícia Federal investiga vínculos entre ministros do STJ e empresário suspeito de comprar decisões judiciais. Caso envolve uso de aeronave privada, diálogos com familiares e atuação informal em processos estratégicos. A apuração segue em sigilo no STF.

Reportagem de Aguirre Talento, publicada nesta quinta-feira (17/07/2025) no jornal Estadão, informa que na terça-feira (16/07), a Polícia Federal (PF) revelou novos elementos na investigação da Operação Sisamnes, que apura a venda de decisões judiciais no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Documentos e celulares apreendidos indicam vínculos do empresário Haroldo Augusto Filho com os ministros João Otávio de Noronha e Marco Buzzi, incluindo viagens em aeronave privada e diálogos com parentes dos magistrados.

A análise do conteúdo de dispositivos eletrônicos e documentos apreendidos pela PF revelou diálogos entre Haroldo Augusto Filho e familiares dos ministros do STJ, além de referências diretas aos magistrados. Entre os episódios registrados, consta que Noronha utilizou uma aeronave privada cedida por Haroldo para ir a Cuiabá (MT), em abril de 2024, onde participou de um evento jurídico promovido pela OAB de Mato Grosso. A empresa Fource, da qual Haroldo é sócio, patrocinou o encontro.

De acordo com a PF, a aeronave foi oferecida ao ministro para deslocamento entre Brasília e Cuiabá. Noronha afirmou que a logística foi organizada pela OAB, sem conhecimento de que a aeronave pertencia ao empresário investigado. Apesar disso, o magistrado se declarou suspeito para atuar no inquérito relativo à venda de decisões no TJMT, após a revelação do episódio.

Contatos com filha de outro ministro e jantar não realizado

Outro ponto analisado pelos investigadores envolve conversas entre Haroldo e a advogada Catarina Buzzi, filha do ministro Marco Buzzi. Uma das mensagens, enviada por Catarina a Roberto Zampieri – advogado assassinado em dezembro de 2023 e pivô da operação – indica reencontro entre os três interlocutores em 07/10/2022.

Zampieri teria solicitado a Haroldo o nome da filha do ministro, demonstrando interesse em contato com ela. Em conversas com Zampieri, o empresário também sinalizou relações pessoais com a família de Buzzi, afirmando ser “amigo da mãe e da filha” do ministro, e sugerindo articulação para encontros informais.

Apesar dessas interações, a ministra e o magistrado negaram qualquer proximidade com o empresário. Catarina Buzzi declarou que nunca intercedeu em processos da relatoria de seu pai, e Marco Buzzi informou que viajou a Cuiabá em voo comercial, com passagens custeadas pela OAB local.

Suspeitas de influência oculta da Fource em processos do STJ

A investigação indica que a empresa Fource não aparece diretamente como parte em processos judiciais, mas atua nos bastidores por meio de terceiros. Um dos casos suspeitos envolve disputa fundiária em Mato Grosso, em que a empresa teria interesse. Embora a Fource não conste nos autos, um advogado associado a ela integrou formalmente a ação.

Neste processo, o ministro Marco Buzzi concedeu liminar em 2022 anulando decisões de instâncias inferiores, com base em alegações de falsificação documental. O caso aguarda julgamento na Quarta Turma, presidida por Noronha.

Participação de lobistas e novas frentes de investigação

A operação Sisamnes se expandiu após o assassinato de Roberto Zampieri, cujos diálogos recuperados pela PF indicaram uma rede de compra de decisões judiciais. O material obtido foi compartilhado com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e fundamentou novas apurações federais.

A PF também apura o papel do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves, suspeito de intermediar decisões junto a gabinetes de ministros do STJ. Entre os registros analisados, está o envio de minutas de decisões antes de sua publicação oficial, inclusive uma atribuída a Noronha que nunca foi formalizada.

Essas evidências motivaram a PF a instaurar inquérito específico para investigar possível corrupção de servidores ligados a quatro ministros do STJ: Isabel Gallotti, Nancy Andrighi, Og Fernandes e Moura Ribeiro. Os funcionários foram afastados e os processos administrativos seguem em curso.

Contexto da Operação Sisamnes

Deflagrada em novembro de 2024, com autorização do STF, a Operação Sisamnes investiga um suposto esquema de compra e venda de sentenças judiciais no Judiciário brasileiro. Haroldo Augusto Filho, empresário do ramo de recuperação judicial, é apontado como beneficiário de decisões favoráveis compradas no TJ de Mato Grosso. Agora, a PF busca esclarecer se ele tentou expandir sua influência até o STJ.

O nome da operação faz referência a Sisamnes, juiz persa punido com a morte por corrupção no século VI a.C., símbolo da gravidade dos desvios éticos no exercício da magistratura.

Conexão com a Operação Faroeste

Investigação paralela publicada pelo Estadão Conteúdo em 30/11/2024 identificou conexões entre a Fource Consultoria e a Bom Jesus Agropecuária, ambas citadas em sindicância do STJ relacionada à venda de sentenças. A Bom Jesus, sediada em Rondonópolis (MT), é controlada por Nelson Vígolo, delator do Caso Faroeste, e está em recuperação judicial.

Conversas interceptadas mostram que documentos foram antecipados irregularmente para favorecer interesses da Bom Jesus e de outros clientes, como José Pupin, ex-produtor conhecido como “rei do algodão”. Em diálogos, Zampieri relata pagamento de vantagens a magistrados, inclusive por meio da contratação de parentes.

Em nota enviada ao Jornal Grande Bahia, às 19h07 de segunda-feira (09/07/2024), a Bom Jesus Agropecuária exerceu seu direito de resposta em reação a matéria, que, segundo a empresa, conduz indevidamente o leitor à conclusão de que ela foi favorecida em decisão judicial investigada pela Operação Sisamnes. A empresa alega que, na verdade, a reportagem original do Estadão a identifica como prejudicada no caso. A nota também critica a publicação sistemática de conteúdos com informações distorcidas e inverídicas, atribuindo essas ações ao interesse de concorrentes. Por fim, reforça que a empresa foi vítima de extorsão na Operação Faroeste, destacando que foi a própria Bom Jesus quem denunciou o esquema ao CNJ, dando origem às investigações.

No âmbito das investigações da 5ª Fase da Operação Faroeste, conduzida pela Polícia Federal, destaca-se que a empresa Bom Jesus Agropecuária firmou Acordo de Leniência com as autoridades competentes. Paralelamente, o sócio da empresa, Nelson Vigolo, e o advogado Vanderlei Chilante firmaram acordos de Colaboração Premiada, comprometendo-se a fornecer informações relevantes para o avanço das apurações.

Além disso, reportagens veiculadas por veículos de imprensa de circulação nacional, como os jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo, com base em documentos e levantamentos obtidos junto à Polícia Federal, mencionaram a suposta existência de conexões entre a empresa Fource e a Bom Jesus Agropecuária. Tais vínculos teriam sido identificados no contexto das investigações sobre supostos esquemas de corrupção, tráfico de influência e comercialização de decisões judiciais no âmbito do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Principais dados

Ministros do STJ citados

1. João Otávio de Noronha

  • Ex-presidente do STJ.

  • Viajou em aeronave privada cedida por Haroldo Augusto Filho em abril de 2024.

  • Declarou-se suspeito para relatar inquérito relacionado à venda de sentenças no TJ-MT.

  • Alegou que a OAB-MT organizou o deslocamento e desconhecia a propriedade do avião.

  • Disse conhecer Haroldo por tê-lo recebido em despacho no gabinete.

2. Marco Buzzi

  • Relator de processo de disputa fundiária em MT no qual há interesse da Fource.

  • Teve filha, Catarina Buzzi, em diálogo com Haroldo e Zampieri.

  • Participou de evento da OAB-MT em 2022, patrocinado pela Fource.

  • Alegou que viajou por voo comercial custeado pela OAB, sem agenda com o empresário.

  • Negou vínculo com Haroldo ou interferência da filha.

Empresário investigado

Haroldo Augusto Filho

  • Sócio da Fource, empresa especializada em aquisição de ativos em litígio.

  • Apontado como beneficiário de decisões compradas no TJ-MT.

  • Não figura formalmente como parte em processos, mas atua via terceiros.

  • Cedeu aeronave a Noronha e patrocinou eventos jurídicos com presença de ministros.

  • Teve diálogos com Catarina Buzzi e a advogada Anna Carolina Noronha (filha de Noronha).

  • Intermediou conversas com Roberto Zampieri e Andreson Gonçalves.

Diálogos e interações relevantes

Com Roberto Zampieri

  • Conversas sobre organização de jantar para ministro Buzzi.

  • Discussões sobre processos em curso no STJ e possibilidade de intermediação.

  • Confirmação de relações com familiares de ministros.

Com Andreson Gonçalves (lobista)

  • Envio de minutas antecipadas de decisões do STJ.

  • Suposta influência direta nos gabinetes ministeriais.

  • Citações a processos de interesse da Fource, sob relatoria de Noronha e Buzzi.

Investigações em andamento

Inquéritos federais

  • Venda de sentenças no TJ-MT (já concluído, com indiciamento de Haroldo).

  • Tentativa de compra de decisões no STJ, com foco em servidores e possíveis vínculos com ministros.

Servidores investigados (STJ)

  • Quatro gabinetes sob apuração:

    • Isabel Gallotti

    • Nancy Andrighi

    • Og Fernandes

    • Moura Ribeiro

  • Servidores afastados administrativamente.

  • Processos internos ainda em andamento.

Cronologia de eventos-chave

Data Evento
Maio/2022 Marco Buzzi participa de evento em Cuiabá, patrocinado pela Fource.
Outubro/2022 Diálogos entre Zampieri, Haroldo e Catarina Buzzi são registrados.
Setembro/2022 Buzzi concede liminar em favor de parte associada à Fource.
Novembro/2024 Primeira fase da Operação Sisamnes é deflagrada.
Dezembro/2023 Roberto Zampieri é assassinado; seu celular gera novas provas.
Abril/2024 Noronha viaja em aeronave privada da Fource para evento jurídico.
Julho/2025 PF revela novos vínculos entre Haroldo e ministros do STJ.

Processos e decisões envolvidas

  • Processo de disputa fundiária em MT, com suposta documentação falsificada.

  • Liminar de Marco Buzzi, de setembro de 2022, anulou decisões da 1ª e 2ª instâncias.

  • O caso aguarda julgamento na Quarta Turma, presidida por Noronha.

Elementos de prova

  • Minutas de decisões obtidas antes da publicação.

  • Mensagens de WhatsApp entre investigados.

  • Foto do interior da aeronave utilizada por Noronha, interceptada pela PF.

  • Documentos da Fource indicando patrocínio de eventos com presença de ministros.

A Polícia Federal identificou indícios de relações entre o empresário Haroldo Augusto Filho e ministros do STJ, no âmbito da Operação Sisamnes. A investigação apura se houve tentativas de compra de decisões judiciais, com base em viagens, diálogos com familiares de ministros e participação em eventos patrocinados pela empresa do investigado. O caso segue sob relatoria do ministro Cristiano Zanin, no STF.
PF intercepta imagem do interior de aeronave usada por ministro do STJ, cedida por empresário investigado na Operação Sisamnes.

Leia +

As conexões entre as Operações Faroeste e Sisamnes: A citação da Bom Jesus Agropecuária e da Fource em sindicância do STJ sobre venda de sentenças

CNJ aponta possível envolvimento da empresa Fource em esquema de venda de decisões no STJ

A sociedade entre os empresários da Bom Jesus Agropecuária e Fource e a investigação sobre a venda de decisões judiciais no STJ e nos TJs de MT e MS

Exclusiva: Documentos sigilosos revelam início das incursões da Bom Jesus Agropecuária no TJBA, aponta relatório da PF

Reclamação no CNMP aponta omissão de promotor de Justiça em processo da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto; Caso envolve Operação Faroeste


Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe to get the latest posts sent to your email.

Facebook
Threads
WhatsApp
Twitter
LinkedIn

Deixe um comentário

Discover more from Jornal Grande Bahia (JGB)

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading

Privacidade e Cookies: O Jornal Grande Bahia usa cookies. Ao continuar a usar este site, você concorda com o uso deles. Para saber mais, inclusive sobre como controlar os cookies, consulte: Política de Cookies.