Capítulo 127 do Caso Faroeste: A parte 1 da decisão que, em tese, convalida fraude e titulariza 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

A primeira parte da decisão proferida em 7 de outubro de 2022, pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Formosa do Rio Preto, que retoma Acordo Judicial celebrado em 2012 entre o Casal Dias e o Grupo Econômico dos Okamoto.
A primeira parte da decisão proferida em 7 de outubro de 2022, pelo juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Formosa do Rio Preto, que retoma Acordo Judicial celebrado em 2012 entre o Casal Dias e o Grupo Econômico dos Okamoto.

Em 7 de outubro de 2022, o juiz de Direito Substituto da 1ª Vara dos Feitos Relativos às Relações de Consumo, Cíveis, Comerciais de Formosa do Rio Preto, Carlos Eduardo da Silva Camillo, decidiu — sobre o Processo de Reintegração de Posse nº 0000157-61.1990.8.05.0081, interposto por José Valter Dias e a esposa Ildeni Goncalves Dias contra o Grupo Econômico dos Okamoto — retomar o Acordo Judicial celebrado entre as partes no ano de 2012.

Distribuída em 29 de maio de 1990, com valor estipulado em CR$ 500 milhões, inicialmente a ação tramitou na Comarca de Santa Rita de Cássia mas, atualmente, está em julgamento na Comarca de Formosa do Rio Preto.

Cadastrado na Classe Reintegração e Manutenção de Posse, o processo judicial discute a quem pertence os 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto.

Todavia, o que seria um processo de fácil resolução, uma vez que a questão se resume a verificar o registro cartorial do imóvel e de que forma ele foi manejado desde o lançamento original, a situação se tornou complexa, haja vista que:

— Foi descoberto e julgado que a documentação que deu origem às matrículas cartoriais de nº 726 e 727 da antiga Fazenda São José, usadas pelo Grupo Econômico dos Okamoto, são resultantes de duas fraudes:

    1. falso atestado de Suzano Ribeiro de Souza (†1890) e
    2. fraudulento inventário do casal Suzano Ribeiro de Souza (†1890) e Maria da Conceição Ribeiro (†1908);

— Uma rumorosa investigação liderada, inicialmente, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) resultou no desencadeamento da Operação Faroeste, com descoberta de vasto esquema de propina que envolve a disputa pelas terras da antiga Fazenda São José e que atingiu membros do Poder Judiciário Estadual da Bahia (PJBA), transformando em réus de ações criminais desembargadores, juízes de primeiro grau, servidores e ex-servidores, além de advogados, empresários do agronegócio e de outros ramos de atividade. Com transbordo para além da disputa original das terras situadas no oeste da Bahia.

— A mando do CNJ foi elaborado o Relatório de Mapeamento de Matrículas dos Cartórios de Registros de Imóveis, pela Corregedoria Geral da Justiça e Corregedoria das Comarcas do Interior do PJBA. O documento foi protocolado sob o número 477/2020, com data de 29 de janeiro de 2020 e traz análise sobre vários registros cartoriais.

— A matrícula nº 1037 [reivindicado por José Valter Dias] é oriunda da matrícula nº 3194 (sem indicação de área e registro anterior). A matrícula 3194 origina-se no quinhão de Delfino Ribeiro de Barros, proveniente do arrolamento do pai Eustáquio Ribeiro de Barros, datado de 1º de setembro de 1915.

— O casal Dias, detentor da matrícula de nº 1037, com posse correspondente a 25% dos 360 mil hectares de terras, vendeu, após o Acordo Judicial de 2012 com os Okamoto, parte das terras.

— O Grupo Econômico dos Okamoto vendeu parte das terras da antiga Fazenda São José, gerando novas matrículas cartoriais;

— Existem grupos econômicos que ocupam, há décadas, as terras e que reivindicam Usucapião Tabular.

Em suma, sabe-se que para além da disputa das terras da antiga Fazenda São José, ocupadas por Grupos Econômicos, existe o interesse sobre as demais áreas não exploradas ou ocupadas. É justamente neste ponto que reside um problema central, qual seja:

— Existem terras que não são ocupadas e exploradas, cuja posse e propriedade podem não pertencer ao Casal Dias, pois eles apenas adquiriram de 1 dos 5 herdeiros do casal Ribeiro a Cessão de Herança.  Observa-se que um dos filhos do casal Ribeiro faleceu jovem, sem deixar herdeiros, o que reduz para 4 o número de filhos e filhas sucessoras do casal Ribeiro.

— O advogado Domingos Bispo apresentou petição requerendo a inclusão na Ação Judicial sobre as terras da antiga Fazenda São José, alegando possível exclusão da cadeia sucessória de 3 filhos e filhas do Casal Souza, cuja sessão de herança foi adquirida por ele.

— Em tese, o Acordo Judicial de 2012 celebrado entre o Casal Dias e o Grupo Econômico dos Okamoto pode, no máximo, abranger 25% dos 360 mil hectares de terras da antiga Fazenda São José, ou seja, cerca de 90 mil hectares.

— Ocorre, também, que a Justiça, ao retomar o Acordo Judicial celebrado entre o Casal Dias e o Grupo Econômico dos Okamoto estará, em tese, convalidando uma fraude absoluta sobre as terras remanescentes, que não são ocupadas ou produtivas e que não podem ser reivindicadas como Usucapião Tabular.

Conforme relato de fonte e documento enviado ao Jornal Grande Bahia (JGB), nesta fase processual não consta como terceiro interessado Domingos Bispo. Sabe-se, também, que o juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Formosa do Rio Preto aguarda memorial descritivo e o georreferenciamento referente ao conjunto de 23 matrículas acordadas entre as partes — Dias e Okamoto — a serem reintegradas na posse e que o magistrado citou o Ministério Público da Bahia (MPBA) para que opine sobre o processo.

Próximo Capítulo

O Capítulo 128 (CXXVIII) do Caso Faroeste vai apresentar o relatório, que está na primeira parte da decisão proclamada, em 7 de outubro de 2022, pelo juiz de Direito Substituto da 1ª Vara dos Feitos Relativos às Relações de Consumo, Cíveis, Comerciais de Formosa do Rio Preto, Carlos Eduardo da Silva Camillo, sobre o Processo de Reintegração de Posse nº 0000157-61.1990.8.05.0081, interposto por José Valter Dias e a esposa Ildeni Goncalves Dias contra o Grupo Econômico dos Okamoto, que retoma o Acordo Judicial celebrado entre as partes no ano de 2012.


Para saber +

Síntese do Caso Faroeste: Dias x Okamoto x Bispo e as terras da antiga Fazenda São José

Iniciado na década de 1980, o conflito fundiário-jurídico resultou na Ação de Reintegração de Posse de nº 0000157-61.1990.8.05.0081, cujo trâmite ocorre no Poder Judiciário Estadual da Bahia (PJBA).

A disputa pelos 360 mil hectares de terra, área equivalente ao município de Salvador, é de longa trajetória no tempo e, até o presente momento, o Poder Judiciário não decidiu quem é o verdadeiro proprietário e a quem deve ser dada a posse. É possível estabelecer, como data de início do processo, o pagamento das custas realizada, em 22 de julho de 1985, pelos autores da ação José Valter Dias e Ildeni Gonçalves Dias.

A exploração das terras ocorre a partir de um sistema de posse precária, fundada em decisões judiciais em contestação. Fato que cria obstáculos à expansão agrícola e a paz social.

Quem disputa as terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto

Atualmente, existem três polos reivindicando a propriedade da área, a saber:

    • O primeiro polo é composto por José Valter Dias e a esposa, que alegam ter adquirido a Fazenda São José pela matrícula nº 1037.
    • O segundo polo é composto pelo Grupo Okamoto e os sucessores, que adquiriram os imóveis de matrícula nº 726 e 727.
    • Por fim, quem também reivindica a propriedade da área é o advogado Domingos Bispo, alegando ser o representante dos sucessores de Suzano Ribeiro de Souza (†1890), com a matrícula nº 54, registrada em 20 de junho de 1887.

Domingos Bispo ingressa na disputa judicial com atraso de três décadas em relação a demanda de José Valter Dias e de mais de um século, se levado em consideração a data da morte e abertura do inventário do casal Souza.

Os primeiros registros cartoriais das terras da antiga Fazenda São José

Datada do final do Século 19 (XIX), a compra das terras da Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto, município situado no oeste da Bahia, ocorreu em 20 de junho de 1887 e foi formalizada por Suzano Ribeiro de Souza, que adquiriu de Anna Felícia de Souza Miranda. Este fato consta no Registro Cartorial de nº 54, lavrado no antigo livro de Transcrição dos Imóveis, no qual está lançada a compra e venda da Fazenda São José, pelo Tabelionato de Notas da Comarca de Santa Rita de Cássia. Na época, a Comarca abrangia, também, o município de Formosa do Rio Preto.

  • Em janeiro de 1890, morre Suzano Ribeiro de Souza e em 18 de fevereiro de 1890 é iniciado o processo de inventário dos bens.
  • Em 1908, faleceu Maria da Conceição Ribeiro, viúva de Suzano Ribeiro de Souza, e um novo inventário foi aberto.
  • O casal deixou como herdeiros: Antônia Ribeiro de Souza (à época, casada com Luiz Ribeiro de Souza); Raimundo Ribeiro de Souza, 18 anos; Joana Ribeiro de Souza, 17 anos; Maria Ribeiro de Souza, 8 anos; e Domingos Suzano Ribeiro, 6 anos.

O que diz o Relatório das Matrículas 

A mando do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foi elaborado o Relatório de Mapeamento de Matrículas dos Cartórios de Registros de Imóveis, pela Corregedoria Geral da Justiça e Corregedoria das Comarcas do Interior do PJBA. O documento foi protocolado sob o número 477/2020, com data de 29 de janeiro de 2020, traz análise sobre vários registros cartoriais.

De posse do relatório, que foi enviado por fonte, o Jornal Grande Bahia, o veículo de imprensa destaca a inspeção feita nos registros 1037, 726 e 727 que se encontram em sobreposição.

A terras reivindicadas pelo casal José Valter Dias e Ildeni Gonçalves Dias

— A matrícula nº 1037 [reivindicado por José Valter Dias] é oriunda da matrícula nº 3194 (sem indicação de área e registro anterior). A matrícula 3194 origina-se indicando o quinhão de Delfino Ribeiro de Barros, proveniente do arrolamento de seu pai Eustáquio Ribeiro de Barros, datado de 1º de setembro de 1915.

Em síntese, tendo em vista que são 5 os herdeiros do Casal Souza e que o direito de herança foi adquirido pelo casal Dias de apenas 1, — e que 1 dos herdeiros do Casal Souza morreu ainda jovem sem deixar herdeiros, —  pode-se inferir que o Casal Dias tem direto a 25% das terras, ou seja, a 90 mil hectares das terras da antiga Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto.

A partes remanescentes das terras estão sendo pleiteadas pelo advogado Domingos Bispo, que apresentou documento de cessão de herança dos demais herdeiros do casal Suzano Ribeiro de Souza (†1890) e Maria da Conceição Ribeiro (†1908).

As terras reivindicadas pelo Grupo Econômico dos Okamoto

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Poder Judiciário Estadual da Bahia (PJBA) tem conhecimento de que as terras pleiteadas pelo Grupo dos Okamoto têm como base as matrículas cartoriais de nº 726 e 727. Ocorre que ambas são oriundas de duas fraudes:

    • O falso atestado de óbito Suzano Ribeiro de Souza;

— O registro de óbito fraudulento teria sido lavrado em 1977, quando havia, inclusive, tramitado o inventário de Suzano há 87 anos, nos idos de 1890, no qual restou partilhada a Fazenda São José, entre a esposa Maria Conceição Ribeiro e dos 5 filhos do casal. Partilha homologada em 2 de setembro 1890. — Diz Corregedoria Geral da Justiça do PJBA

    • A promoção de fraudulento inventário que excluiu os herdeiros do casal Suzano Ribeiro de Souza e Maria da Conceição Ribeiro, proprietário originários da terra, com registro cartorial datado de 20 de junho de 1887.

A fraude que originou as matrículas cartoriais de nº 726 e 727, usadas pelos Okamotos, foi julgada pelo Judiciário, que reconheceu como absolutas. Acrescenta-se o fato de que foram abertos os inventários do casal, em 18 de fevereiro de 1890, de Suzano Ribeiro de Souza e em 1908, da viúva Maria da Conceição Ribeiro. Eles deixaram como herdeiros: Raimundo Ribeiro de Souza, 18 anos; Joana Ribeiro de Souza, 17 anos; Maria Ribeiro de Souza, 8 anos; e Domingos Suzano Ribeiro, 6 anos. 


Leia +

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