O STF e a imprensa | Por Luiz Holanda

Sessão plenária do Supremo Tribunal Federal ocorrida em 30 de novembro de 2023.
Sessão plenária do Supremo Tribunal Federal ocorrida em 30 de novembro de 2023.

O papel que o legislador constituinte atribuiu ao nosso Judiciário na CF/88 foi o de árbitro dos grandes conflitos políticos. Na Constituição de 1824 essa tarefa cabia ao Imperador, no exercício do Poder Moderador. A elevação do Judiciário – em especial do Supremo Tribunal Federal-, como o árbitro máximo da República deu-se paulatinamente, conforme as circunstancias. Para chegar até aqui o caminho percorrido foi longo, pois a posição de árbitro supremo implicava em perda da autoridade dos demais poderes, ai incluído, no caso brasileiro, o Exército, que sempre atuou como protagonista em todas as grandes crises políticas ocorridas no país.

Mesmo nos períodos de normalidade democrática, os homens de farda sempre tiveram importante papel, alguns, inclusive, no seu aperfeiçoamento. O marechal Dutra, por exemplo, apesar de militar, governou seguindo a onstituição. Seu governo ocorreu entre 1946 a 1951, e foi o primeiro do período conhecido como a Quarta República, momento democrático de nossa história estabelecido com o fim da Era Vargas. Os governos que o sucederam sofreram diversas crises, cujo ápice foi o golpe de 1964.

A partir daí começaram os conflitos entre o judiciário e o Executivo, (leia-se, o Exército). Na época, o ministro Ribeiro da Costa presidia o Supremo. A pressão pública sobre a corte, que vinha desde os primórdios da “Revolução”, se dava porque os militares consideravam os ministros contrarrevolucionários, face os sucessivos habeas corpus concedidos em favor dos perseguidos políticos, principalmente os atingidos pelos Atos Institucionais.

Diante da pressão e das críticas por parte dos militares, o ministro Ribeiro da Costa elevou o tom na defesa da corte, inflamando ainda mais os que clamavam por alguma forma de interferência no Judiciário. Naquela época todos tinham medo dos militares. O Sindicato dos Advogados de São Paulo, por exemplo, soltou uma nota afirmando que “nenhum dos poderes estava imune à revolução”, de forma que eles tinham de expurgar  os “comunistas e todos aqueles que contribuíram decisivamente para a tentativa de instauração, no País, de um regime comuno-caudilhista” .

No Congresso, o deputado udenista Jorge Curi, amigo de Costa e Silva, atacava os ministros do Supremo. Segundo ele, poupar o STF, enquanto muita gente era cassada, implicava “odiosa discriminação” em favor do tribunal. Até o jornal O Estado de S. Paulo, em ao menos duas oportunidades, defendeu a intervenção na corte, nomeando, inclusive, os ministros Evandro Lins e Hermes Lima, ambos posteriormente cassados.

Nem todos os militares eram contra o Supremo. O presidente Castelo Branco fez questão de valorizar publicamente a corte em diversas ocasiões. Numa delas, em conversa com os ministro Evandro Lins, Hermes Lima e o presidente Ribeiro da Costa, Castelo  “deixou entrever, no seu gesto de cumprimentar aqueles que eram visados pela campanha da imprensa, uma mensagem de que não estava pretendendo nos atingir, de que ia respeitar o Tribunal e seus juízes”.

Agora a crise retorna entre o STF, o Senado e a imprensa. A reação da corte após a aprovação da PEC que limita as decisões monocráticas de seus ministros foi forte; colocou novamente os poderes em conflito. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, rebateu as críticas de alguns ministros após a aprovação da proposta (PEC) que impede decisões de um único magistrado suspendendo a eficácia de leis e atos dos presidentes dos demais Poderes. Para agravar, o Supremo está defendendo a tese de que a imprensa pode ser punida se não verificar  as noticias que publica com antecedência. Segundo o ex-ministro Marco Aurélio, “Não se concebe que o Judiciário implemente censura prévia. O que deve haver é a responsabilização de algum desvio de conduta cometido pela imprensa, o que não ocorre quando se limita a divulgar entrevista.”

*Luiz Holanda, advogado e professor universitário.


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