A Polícia Federal (PF) deflagrou, nesta terça-feira (14/10/2025), a sexta fase da Operação Overclean, em ação conjunta com a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Receita Federal do Brasil (RFB). A nova etapa busca desarticular um esquema de corrupção sistêmica que teria desviado R$ 1,4 bilhão em contratos públicos, envolvendo empresários, agentes políticos e servidores públicos. Um dos principais alvos é o deputado federal Adalberto Rosa Barreto, conhecido como Dal Barreto (União Brasil-BA), abordado pela PF no Aeroporto de Salvador, onde teve o celular apreendido por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF). O fato foi revelado por reportagens da Veja e Metrópoles.
Sexta fase da Overclean aprofunda cerco a políticos e operadores do esquema
Ao todo, foram oito mandados de busca e apreensão, uma medida cautelar diversa da prisão e sequestro de bens e valores. As ações ocorreram em Salvador, Amargosa e Brasília, tendo como base elementos obtidos nas fases anteriores, que apontam para fraudes licitatórias continuadas e lavagem de dinheiro com uso de empresas de fachada.
O foco agora recai sobre operações de limpeza urbana, coleta de resíduos e obras públicas, setores que movimentam valores expressivos e que, segundo as investigações, teriam sido instrumentalizados para financiar campanhas e consolidar poder político no interior e na capital baiana. A investigação da PF aponta que contratos superfaturados e pagamentos indevidos alimentavam caixas paralelos destinados a campanhas eleitorais e ao enriquecimento ilícito de agentes públicos.
Deputado Dal Barreto e o avanço das investigações no Congresso
O deputado Dal Barreto (União Brasil-BA) é apontado como interlocutor político de um dos núcleos do esquema, responsável por intermediar liberações de recursos e proteger contratos suspeitos firmados com prefeituras do interior. Segundo fontes ouvidas pela PF, Barreto teria utilizado mandatos parlamentares e influência em órgãos federais para viabilizar emendas e convênios direcionados a empresas ligadas ao grupo investigado.
A apreensão do celular do parlamentar, determinada pelo STF, visa identificar mensagens, trocas de e-mails e registros financeiros que possam comprovar pagamentos ilícitos e tráfico de influência. O parlamentar ainda não se manifestou publicamente, mas assessores confirmaram que ele está colaborando com as autoridades e nega irregularidades.
“Rei do Lixo da Bahia”: o operador bilionário do esquema
No centro das investigações está o empresário José Marcos de Moura, conhecido como “Rei do Lixo da Bahia”, dono da MM Consultoria Construções e Serviços, empresa que acumulou contratos bilionários com prefeituras administradas por políticos do União Brasil e com órgãos federais, como o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs).
Moura é apontado pela PF como financiador e operador financeiro da organização criminosa. Entre 2022 e 2024, sua empresa teria movimentado R$ 1,4 bilhão, dos quais R$ 825 milhões apenas em 2024, em contratos com indícios de superfaturamento e lavagem de dinheiro. O empresário já havia sido preso em 2024, durante fase anterior da Overclean, e mencionado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) na Operação Faroeste, que apura venda de sentenças judiciais na Bahia.
De acordo com relatório da PGR, a MM Consultoria teria sido usada para lavar R$ 9,7 milhões provenientes de corrupção judicial, em associação com agentes públicos e magistrados. O documento descreve Moura como “capitalizador de divisas criminosas”, com influência sobre órgãos de controle e decisões administrativas em Salvador e em outras prefeituras do estado.
Rastro de luxo e influência: bens e conexões políticas
A investigação revelou um padrão de enriquecimento incompatível com a atividade empresarial declarada. A PF apreendeu 23 carros de luxo, três iates, três aeronaves, seis imóveis de alto padrão, 38 relógios avaliados em até R$ 800 mil, além de R$ 3,4 milhões em espécie. O total de valores bloqueados chega a R$ 162 milhões.
Além de ostentar patrimônio milionário, o “Rei do Lixo” mantinha proximidade com líderes nacionais do União Brasil, como o ex-prefeito ACM Neto, o prefeito Bruno Reis e o senador Davi Alcolumbre, provável candidato à presidência do Senado. Moura também era presença frequente em eventos políticos, servindo como elo financeiro e logístico de campanhas da legenda em diversos estados.
Delações premiadas e medo em Brasília
Fontes da Polícia Federal confirmam que foram oferecidos acordos de colaboração premiada ao empresário Marcos Moura e ao vereador eleito Francisco Nascimento, o Francisquinho, primo do deputado Elmar Nascimento, líder do União Brasil na Câmara. Francisquinho ficou conhecido nacionalmente por jogar R$ 200 mil pela janela ao ser preso na primeira fase da Overclean.
Segundo investigadores, eventuais delações podem atingir lideranças de primeiro escalão do União Brasil, incluindo prefeitos, parlamentares e ex-ministros. A PF avalia que, pela complexidade do esquema e o envolvimento de múltiplos agentes públicos, a Overclean pode se tornar a maior investigação sobre corrupção desde a Operação Lava Jato.
Nos bastidores de Brasília, cresce o temor de que as delações revelem conexões entre contratos superfaturados, financiamento de campanhas e influência política em órgãos federais, especialmente em ministérios controlados por partidos do Centrão.
Prefeitura de Salvador sob pressão e suspeitas de vínculos
As prisões e apreensões da Overclean provocaram tensões na Prefeitura de Salvador, administrada por Bruno Reis (União Brasil). Servidores e secretários foram mencionados em relatórios da PF e da CGU, que identificaram pagamentos suspeitos e repasses de informações privilegiadas a empresas envolvidas no esquema.
Em uma das fases anteriores, foi preso o diretor de administração da Secretaria Municipal de Educação, Flávio Henrique Pimenta, acusado de vazar dados internos a operadores da MM Consultoria. A prisão causou forte repercussão no Paço Municipal, levando o prefeito a exonerar o servidor imediatamente.
Fontes da PF afirmam que há investigação em curso sobre contratos municipais de limpeza urbana e coleta de resíduos — setores em que o grupo empresarial do “Rei do Lixo” mantém hegemonia há mais de uma década.
Atuação internacional e cooperação com os EUA
A Overclean também despertou o interesse de agências internacionais, devido ao uso de offshores e contas bancárias no exterior. A investigação conta com o apoio da Homeland Security Investigations (HSI), órgão do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos, responsável por rastrear operações de lavagem de dinheiro transnacional.
De acordo com a PF, o grupo usava empresas registradas em paraísos fiscais para ocultar recursos desviados de contratos no Brasil. A cooperação internacional inclui troca de informações bancárias e fiscais, além da possibilidade de bloqueio de ativos em contas estrangeiras. Essa vertente pode levar a uma nova frente de responsabilização civil e penal por crimes financeiros internacionais.
O enredo político-empresarial da corrupção sistêmica
A Operação Overclean expõe um modelo de captura institucional que vai além de contratos superfaturados: revela a estrutura informal de poder que sustenta parte das relações entre empresários, políticos e gestores públicos. O caso repete padrões já observados em outras grandes investigações — como a Lava Jato e a Faroeste —, nas quais recursos públicos e influência política se fundem em um sistema de retroalimentação corrupta.
No caso baiano, a permanência de mesmos atores e empresas em diferentes escândalos sugere a existência de uma rede organizada de proteção mútua, o que evidencia falhas na governança, na fiscalização e na responsabilização institucional. O risco, segundo analistas, é que a operação seja cooptada por disputas partidárias, desviando o foco de seu impacto estrutural sobre o sistema político.
Continuidade da corrupção endêmica
A Operação Overclean ilustra com clareza a continuidade da corrupção endêmica no país, que persiste mesmo após as lições da Lava Jato. O avanço das investigações sobre o União Brasil — herdeiro de legendas tradicionais do sistema político — revela que as práticas de conluio entre poder público e privado continuam enraizadas, adaptando-se a novos contextos.
O desafio que se impõe é institucional: sem reformas efetivas de transparência, compliance público e responsabilização de gestores, as operações tendem a ser episódicas, não estruturais. A amplitude da Overclean e sua possível ramificação para o exterior indicam que o Brasil ainda enfrenta um sistema de corrupção tecnicamente sofisticado, politicamente protegido e moralmente normalizado.
Principais dados da Operação Overclean (atualizados em 14/10/2025)
1) Fase e coordenação da operação
- Fase: sexta fase da Operação Overclean.
- Data da ação: terça-feira, 14/10/2025.
- Órgãos envolvidos: Polícia Federal (PF), Controladoria-Geral da União (CGU), Receita Federal do Brasil (RFB); apoio internacional da HSI (EUA).
- Autoridade judicial: ordens expedidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
2) Alvos e investigados
- Deputado federal: Adalberto Rosa Barreto (Dal Barreto, União Brasil-BA) — alvo de buscas; celular apreendido no Aeroporto de Salvador.
- Empresário apontado como operador: José Marcos de Moura, o “Rei do Lixo da Bahia” — dono da MM Consultoria Construções e Serviços.
- Outros citados em etapas anteriores: Francisco Nascimento (Francisquinho), vereador eleito (União-BA).
- Relações políticas mencionadas: lideranças do União Brasil (ex.: ACM Neto, Bruno Reis, Davi Alcolumbre, Elmar Nascimento), em diferentes contextos de reportagens.
3) Medidas cumpridas nesta fase
- Mandados: 8 de busca e apreensão.
- Outras medidas: 1 medida cautelar diversa da prisão; sequestro de bens e valores.
4) Abrangência geográfica
- Cidades: Salvador (BA), Amargosa (BA) e Brasília (DF).
- Local de abordagem do deputado: Aeroporto de Salvador.
5) Fatos e condutas sob apuração
- Crimes investigados: organização criminosa, corrupção ativa e passiva, peculato, fraude em licitações e contratos, lavagem de dinheiro.
- Modus operandi indicado: fraudes licitatórias, superfaturamento, empresas de fachada, caixa paralelo para campanhas e pagamentos ilícitos; uso de offshores e contas no exterior.
6) Valores e contratos
- Movimentação sob apuração: cerca de R$ 1,4 bilhão (em diferentes fases e períodos).
- Contratos em 2024: R$ 825 milhões (CGU).
- Superfaturamento identificado: ao menos R$ 8 milhões no Dnocs (CGU).
- Valores já sequestrados (fases anteriores): R$ 162,3 milhões.
7) Bens e apreensões (fases anteriores relacionadas)
- Dinheiro em espécie: R$ 3,4 milhões.
- Veículos de luxo: 23.
- Embarcações: 3 iates.
- Aeronaves: 3.
- Imóveis de alto padrão: 6.
- Relógios de luxo: 38 (itens avaliados até ~R$ 800 mil).
8) Elementos probatórios e diligências
- Apreensão do celular de Dal Barreto para análise de mensagens, e-mails e registros financeiros.
- Buscas em residências e estabelecimentos ligados a investigados (ex.: posto de combustível da família do deputado; endereço em Amargosa).
- Rastreamento financeiro com cooperação internacional (HSI).
9) Conexões com outras investigações
- Operação Faroeste: “Rei do Lixo” mencionado em relatório da PGR sobre venda de sentenças; indícios de R$ 9,7 milhões em movimentações suspeitas via MM Consultoria.
- Eixo municipal: contratos de limpeza urbana e coleta de resíduos sob escrutínio; episódio de prisão de servidor da Educação de Salvador por vazar informações (fase anterior).
10) Delações e cenário político
- Propostas de colaboração premiada: a José Marcos de Moura e a Francisquinho (fases anteriores); recusas iniciais.
- Risco político: eventuais colaborações podem atingir lideranças do União Brasil e gestões municipais; “efeito Lava Jato” ventilado por investigadores.
11) Riscos, impactos e próximos passos esperados
- Governança pública: risco de captura institucional em contratos de alto ticket (limpeza urbana/obras).
- Compliance e transparência: provável expansão de auditorias, novos bloqueios e cooperação jurídica internacional.
-
Âmbito judicial: desdobramentos no STF e possíveis novas fases direcionadas a rastreio patrimonial e emendas/convênios.
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